Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Setembro de 2017 - Vol.22 - Nº 9 Artigo do mês
SÍNDROME DE BURNOUT
Marcelo Echenique Alves Porto Alegre,
Julho de 2017 FUNDAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MÁRIO MARTINS CURSO DE
ESPECIALIZAÇÃO EM PSIQUIATRIA Revisão da Literatura Trabalho de Conclusão apresentado como exigência parcial para
a Conclusão do Curso de Especialização em Psiquiatria da Fundação Universitária
Mario Martins Orientadora: Cléa Duarte Anselmi RESUMO:
Introdução:
A
Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional é uma condição
médica que ocorre em decorrência da exposição a
prolongados níveis de estresse no trabalho. Esta patologia foi descrita pela
primeira vez pelo psicanalista alemão Herbert J. Freudenberg, e o seu conceito
atual é baseado na perspectiva social-psicológica estudada pela psicóloga
norte-americana Christina Maslach, criadora do Maslach Burnout Inventory (MBI), a mais utilizada ferramenta diagnóstica
de Síndrome de Burnout. Seus sintomas são comuns a outros transtornos
psiquiátricos, como depressão e estresse, fazendo com que, em muitas vezes, seu
diagnóstico não seja adequadamente realizado. Objetivo: realizar uma revisão bibliográfica, considerando
possíveis fatores de risco para o seu desenvolvimento e consequências em nível
individual, nas relações interpessoais e no ambiente de trabalho, além de
discutir os sintomas que podem confundir o quadro com outros transtornos
psiquiátricos. Palavras-chave: Síndrome de Burnout,
Síndrome de Esgotamento Profissional, exaustão emocional, estafa emocional. ABSTRACT: Introduction: Burnout Syndrome or Occupational Exhaustion Syndrome
is a medical condition that occurs as a result of exposure to prolonged levels
of stress at work. This pathology was first described by the German
psychoanalyst Herbert J. Freudenberg, and his current concept is based on the
social-psychological perspective studied by the American psychologist Christina
Maslach, creator of the Maslach Burnout Inventory (MBI), the most used
diagnostic tool of SB. Its symptoms are common to other psychiatric disorders,
such as depression and stress, causing that, in many cases; its diagnosis is
not properly performed. Objective:
to carry out a bibliographic review, considering possible risk factors for its
development and consequences at the individual level, in interpersonal
relations and in the work environment, besides discussing the symptoms that may
confuse the picture with other psychiatric disorders. Keywords:
Burnout Syndrome, Professional Exhaustion Syndrome, emotional exhaustion,
emotional scam. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 5 2. OBJETIVO 8 3. METODOLOGIA 9 4. DISCUSSÃO 10 4.1.
Revisão histórica 10 4.2.
Sinais, sintomas e fatores de risco 12 4.3.
Aspectos epidemiológicos 17 4.4.
Diagnósticos diferenciais 19 4.4.1. Estresse 19 4.4.2. Depressão 20 5. CONCLUSÃO 22 6. REFERÊNCIAS 23 7. ANEXO 26 1.
INTRODUÇÃO: No começo do século XX,
o conceito de saúde se baseava na esfera individual, na perfeição morfológica, na
harmonia funcional entre órgãos e sistemas, no bom desempenho das funções
vitais, no bom vigor físico associado ao equilíbrio mental¹. Atualmente, este
conceito passou a abranger outro plano, saindo da esfera do indivíduo e
passando a ser analisada, também, a relação deste com o seu trabalho e a
comunidade. A Organização Mundial
de Saúde (OMS/WHO) define o conceito de saúde como “um completo estado de
bem-estar físico, mental e social e não somente a ausência de doenças e
enfermidades”1,2. Desta forma, percebemos que este conceito engloba
uma visão muito mais ampla a respeito do estado de saúde plena, tendo
significado coletivo e não somente individual. A saúde mental ganhou
destaque na avaliação do bem estar, aumentando sua importância no momento em
que a sociedade vive3. Agitação, inquietude, pressa, ansiedade,
angústias, incertezas, preocupações econômicas, sociais, profissionais,
individuais e familiares, provocam um desgaste constante das energias mentais,
que levam ao cansaço e sofrimento psicossomático. A manutenção da higiene
mental é necessária para todos. Manter um equilíbrio mental pleno requer uma boa
adaptação às exigências do meio e um ajustamento do indivíduo dentro da
comunidade em que ele está inserido. Com o passar dos anos, os
indivíduos estão sendo cada vez mais englobados pela sua rotina3. Existe
muita exigência externa, proveniente de familiares, do ambiente de trabalho, da
comunidade em que vive ou até mesmo da pessoa frente à sua realidade. Ocorre
excessiva demanda de atenção, produção e participação, que, em muitas vezes, as
pessoas não se encontram em capacidade de corresponder. O indivíduo é cobrado para
produzir e render mais no trabalho, através do aumento da carga horária e horas
extras, exigindo maior concentração e desempenho mental, consequentemente
abdicando do tempo de lazer e de relacionamento com familiares e vida social. Também
lhe é exigido atenção e participação na rotina familiar, ao mesmo tempo em que
se torna necessário trabalhar mais para garantir à sua família condições
financeiras que julgam necessárias. Existe ainda uma cobrança interna, dele
mesmo, de que consiga corresponder às expectativas que as pessoas têm sobre
ele, tanto pela habilidade profissional, quanto pela posição no grupo familiar
ou na comunidade. O desequilíbrio das
respostas psíquicas a esta inserção aos ambientes familiar, social,
profissional e comunitária, levam ao desgaste das funções mentais4. Podem
surgir sintomas causados pelo esgotamento emocional oriundo do fato de não
conseguir atender às expectativas e pelo sentimento de incapacidade de manter
um bom equilíbrio psíquico perante a realidade. Dentre as principais causas
deste desequilíbrio psíquico, buscamos compreender melhor os problemas
relacionados ao trabalho, ou seja, o desgaste emocional causado por
dificuldades encontradas no ambiente de trabalho. A Síndrome de Burnout
(SB) ou Síndrome do Esgotamento Profissional (SEP) é uma moléstia que vêm
acometendo cada vez mais indivíduos em seu ambiente de trabalho3. O
termo “burnout” origina-se do verbo
inglês “to burn out”, que significa
queimar-se por completo5. Ocorre um esgotamento em decorrência da
tensão emocional à qual os indivíduos são expostos no seu local de trabalho6.
A SB compreende uma experiência subjetiva que provoca sentimentos e atitudes
negativas no relacionamento do trabalhador com a sua atividade, ocasionando um
desgaste físico e mental que se associa a insatisfação e perda do comprometimento
nas relações pessoais e profissionais, trazendo consequências indesejáveis para
o indivíduo e a organização onde trabalha7. Consequentemente, isto poderá
gerar baixo rendimento e/ou produtividade, aumento do número de faltas e
abandono do emprego8. A SB envolve três
componentes independentes, mas que podem parecer associados: exaustão
emocional, distanciamento das relações pessoais e diminuição do sentimento de
realização pessoal3. A exaustão emocional surge
da falta de energia associada ao sentimento de esgotamento emocional3.
Aos poucos, o entusiasmo diminui e o trabalho torna-se cansativo e desgastante,
desenvolvendo desmotivação e insatisfação. A pessoa pode apresentar falta de
concentração, alterações de memória, impaciência, irritabilidade, labilidade
emocional, sentimento de solidão, baixa autoestima e desânimo. Ela percebe que
não pode oferecer mais energia para desempenhar suas atividades, perdendo
gradativamente a vontade de trabalhar. A despersonalização é caracterizada
pelo distanciamento das relações pessoais, ocasionada por diferentes fatores3.
Haverá indiferença em relação às atividades cotidianas do trabalho, pois o indivíduo
apresentará desânimo e desmotivação para desempenhar suas atividades,
provocando falta de empenho e comprometimento. Ocorre dissimulação afetiva,
comportamento cínico e predomínio de relações interpessoais frias e distantes. Aos
poucos, isto refletirá na maneira de se relacionar com seus colegas, chefes, clientes
ou pacientes, que passarão a serem tratados como se fossem objetos, sem um
envolvimento pessoal. Finalmente, ocorre um
sentimento de baixa realização profissional e uma falta de envolvimento com o
trabalho, ocasionado pela sensação de incapacidade, baixa
autoestima, desmotivação e infelicidade no local de trabalho, afetando também a
habilidade e a destreza³. O indivíduo se avalia de forma negativa, pois se
sente infeliz consigo mesmo e insatisfeito com o seu desenvolvimento pessoal. A
desmotivação torna o trabalho um causador de sofrimento e que pode começar a
ser evitado, ocasionando um aumento no número de faltas. A atividade
profissional passa a ter uma influência negativa na saúde mental. O trabalho e
o desempenho profissional passam a ter uma menor importância em sua vida, ocasionando
em diminuição do rendimento e menor dedicação às suas funções. 2.
OBJETIVO: O objetivo deste
trabalho foi realizar uma revisão bibliográfica sobre alguns aspectos da SB,
procurando apresentar e identificar possíveis fatores de risco para o seu
desenvolvimento e as consequências que podem acarretar no nível de
funcionamento e produtividade individual, bem como no desenvolvimento das
relações entre pessoas do convívio social e no ambiente de trabalho. Discutindo
as características desta doença, torna-se mais fácil a realização de seu
diagnóstico, possibilitando a identificação dos fatores de risco e evitando o seu
desenvolvimento. Sendo assim, buscamos revisar melhor os sintomas que podem
ocorrer também em outros transtornos psiquiátricos, como depressão e estresse, e
realizar o diagnóstico diferencial. 3. METODOLOGIA: Realizou-se uma revisão
bibliográfica em base de dados da Uptodate, Pubmed, Scielo, BVS (Biblioteca
Virtual de Saúde) e LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências
da Saúde). Foram revisados 30 artigos, sendo selecionados e utilizados 24
artigos. Também foram utilizados como fontes de pesquisa o Compêndio de
Psiquiatria de Kaplan & Sadock, o CID-10 e o DSM-5. 4.
DISCUSSÃO: 4.1.
Revisão histórica: Os primeiros estudos
sobre a SB começaram com o psicanalista alemão Herbert J. Freudenberger4-6.
Nascido em 1926, na Alemanha, de família judia, fugiu para os Estados Unidos
após a ascensão do nazismo e o início da perseguição aos judeus. Na década de 70,
passou a atuar em clínicas de atendimento gratuitas, onde tratava
principalmente abusadores de substâncias4. Nestas clínicas, dedicava
grande parte de seu tempo e realizava atendimentos sem receber pagamentos. Seu
conceito clínico para a SB foi inicialmente desenvolvido a partir do trabalho
nestas clínicas e também em comunidades terapêuticas. Ele passou a perceber um
processo gradual de esgotamento emocional, desgaste no humor e diminuição da motivação
nos trabalhadores voluntários com os quais trabalhava, associando este quadro
ao estado de exaustão e apatia apresentado por médicos, psicólogos e
enfermeiros, que se sacrificavam pelos pacientes em atendimento. Eram profissionais
que obtinham pouco reconhecimento por seus esforços, acabando por sacrificar
sua própria saúde neste processo. Em 1974, a SB foi
denominada pela primeira vez por Freudenberger3. O nome origina-se
do verbo inglês “to burn out”, que
significa queimar-se por completo, consumir-se5. A SB foi definida
como um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente
relacionada à vida profissional7. Esta expressão foi criada para descrever uma síndrome composta
por exaustão, desilusão e isolamento em trabalhadores da saúde mental, onde os
sentimentos de fracasso e exaustão são causados por um excessivo desgaste de
energia e de recursos. Freudenberger complementou seus estudos entre 1975 e
1977, acrescentando na sua definição comportamentos de fadiga, depressão,
irritabilidade, aborrecimento, sobrecarga de trabalho, rigidez e
inflexibilidade4. As primeiras pesquisas foram realizadas a partir
das experiências pessoais de alguns autores e estudos de caso, desenvolvidos
por profissionais da área da saúde, que necessitavam manter contato direto com
outras pessoas. Somente a partir de
1976 os estudos sobre SB passaram a
ter um caráter científico, uma vez que foram construídos modelos
teóricos e instrumentos capazes de registrar e compreender este sentimento
crônico de desânimo, apatia e despersonalização. A psicóloga social norte-americana
Christina Maslach4-9 foi a primeira a perceber que as pessoas portadoras
da SB apresentavam atitudes negativas e de distanciamento pessoal. Desta forma,
Maslach foi pioneira e popularizou o conceito legitimando-o como uma importante
questão social. Ela caracterizou a síndrome como uma resposta à tensão emocional
causada pela exposição a fatores estressores ocorridos no ambiente de trabalho.
Freudenberger6 elaborou o conceito reconhecendo apenas duas dimensões
– exaustão emocional e despersonalização. Maslach acrescentou uma terceira
dimensão, que abrangia a realização profissional. Ela ampliou o conceito
inserindo nele um aspecto social, global, avaliando o individuo e sua relação
com o ambiente de trabalho. Estas três dimensões são independentes, mas, ao
mesmo tempo, estão relacionadas. O conceito atual da SB, então, é baseado nesta
perspectiva social-psicológica de Maslach3. Em 1978, após estudar
centenas de trabalhadores e observar como eles vivenciavam seu trabalho, Maslach
criou o Maslach Burnout Inventory (MBI)4-9, que é a medida de
pesquisa mais utilizada no campo da SB. A partir das dimensões citadas
anteriormente, é realizada a avaliação dos índices de SB de acordo com os escores de cada uma delas, sendo que altos
escores em exaustão emocional e despersonalização e baixos escores em
realização profissional (esta subescala é inversa) indicam alto nível da SB (em
anexo). Maslach destaca, ainda,
cinco pontos conceituais na SB: o predomínio de sintomas relacionados à
exaustão mental e emocional, fadiga e depressão; a ênfase não em sintomas
físicos, mas sim nos sintomas comportamentais e mentais; os sintomas são
exclusivamente relacionados ao trabalho; pessoas “normais” que não sofriam de
distúrbios psicopatológicos antes do aparecimento da síndrome vão apresentar a
manifestação dos sintomas; atitudes e comportamentos negativos vão levar a
diminuição da efetividade e desempenho no trabalho. 4.2.
Sinais, sintomas e fatores de risco: O trabalho compreende
um papel central na vida das pessoas, sendo importante na formação da
identidade e na inserção à vida social³. Pode-se considerar que o bem estar
adquirido pelo equilíbrio entre as expectativas relacionadas ao trabalho e à
concretização das mesmas seja um dos fatores que oferecem uma melhor qualidade
de vida. Uma relação satisfatória com a atividade profissional é fundamental
para manter uma boa motivação, relações de autoestima, apoio e reconhecimento
social. Porém, o trabalho nem
sempre oferece uma realização profissional plena, podendo causar problemas como
insatisfação e exaustão. A insatisfação pessoal com a situação profissional
poderá diminuir a qualidade dos serviços prestados, o nível de produção e a
lucratividade. O desequilíbrio na saúde mental do indivíduo pode provocar
diminuição do comprometimento, rendimento e produtividade, levando-o à exaustão.
Isto acarreta em aumento do número de faltas ao trabalho e ocorrência de
licenças por auxílio-doença. Consequentemente, por parte das empresas, será
necessária a reposição destes funcionários absenteístas, realização de
transferências, contratações de novos funcionários e realização de novo
treinamento dos mesmos, entre outros tipos de despesas. A SB é um processo que
se inicia através de excessivos e prolongados períodos de estresse e/ou tensão
no trabalho. Sua progressão ocorre de forma gradual, seus sinais e sintomas são
leves no início e pioram com o passar do tempo. A exaustão emocional
abrange sentimentos de desesperança e de derrota, fracasso, indecisão,
insegurança, solidão, depressão, perspectiva negativa sobre si mesmo, raiva,
impaciência, irritabilidade, tensão, sensação de baixa energia, fraqueza, cansaço
excessivo, preocupação, imunidade reduzida e suscetibilidade para outras
doenças, cefaleias, náuseas, dor e tensão muscular, dor lombar ou cervical, alterações
do apetite e distúrbios do sono3. O distanciamento afetivo provoca diminuição da empatia, desapego, sensação
de alienação em relação aos outros, sendo a presença deste muitas vezes
desagradável e não desejada3. Já a baixa realização profissional ou
baixa satisfação com o trabalho pode ser descrita como uma sensação de que
muito pouco tem sido alcançado e o que é realizado não tem valor, provocando
diminuição da motivação e do sentimento de realização3. Também poderá provocar mudanças
comportamentais, como isolamento social, diminuição de responsabilidades pela
falta de motivação, procrastinação, uso de comida, álcool ou drogas para
alívio, conflitos com colegas de trabalho, haverá uma projeção das suas
frustrações nos outros, também aumentará as faltas ao trabalho e atrasos ou
saídas mais cedo do trabalho. Para efetuar o
diagnóstico da SB, são avaliadas as características individuais associadas às
do ambiente e às do trabalho, proporcionando o aparecimento de fatores
multidimensionais da síndrome: exaustão emocional, distanciamento afetivo
(despersonalização) e baixa realização profissional. Para avaliar os fatores
de risco para o desenvolvimento da SB, se leva em consideração quatro
dimensões: a organização, o indivíduo, o trabalho e a sociedade 3,4.
Os fatores
organizacionais dizem respeito à organização do ambiente de trabalho perante o
indivíduo, como trabalhador ou como integrante de uma equipe, e às metodologias
de trabalho e/ou produção3. O excesso de normas e burocracia impedem
a autonomia individual, o processo de participação criativa e a tomada de decisões,
gerando atrasos na realização das tarefas e requisitando muito tempo e energia
por parte do indivíduo na sua manutenção. A falta de autonomia e a
impossibilidade de tomar decisões sem ter de consultar ou obter autorização de
alguém, impossibilita a liberdade de tomada de ações e independências
profissionais. O sentimento de que a pessoa tem pouco ou nenhum controle sobre
o seu trabalho, ou uma falta de reconhecimento pelo seu desempenho. Normas
institucionais muito rígidas impedem que o trabalhador atinja autonomia e
sinta-se no controle de suas tarefas. Mudanças organizacionais e alterações
frequentes de regras e normas provocam insegurança no indivíduo, predispondo o
mesmo a possibilidade de cometer erros. A falta de confiança, respeito e
consideração entre os membros de uma equipe provocam um clima social
prejudicial. A comunicação ineficiente entre os membros da equipe e cargos
superiores também podem possibilitar distorções na passagem de informações.
Também pode provocar muito desestímulo no indivíduo o não reconhecimento da
qualidade de seu trabalho, a percepção de impossibilidade de ascensão
profissional e de melhorar sua remuneração. As expectativas de trabalho pouco
claras ou extremamente exigentes, atuando em um ambiente caótico ou de alta
pressão. Ainda um trabalho que considera monótono ou incontestável³. As características
próprias do indivíduo e alguns traços de personalidade também podem influenciar
no desenvolvimento da SB3. Indivíduos altamente competitivos, com
necessidade de controlar as situações, com baixa tolerância para frustração e
para erros. Pessoas altamente dedicadas, que se envolvem excessivamente, mais
empáticos e sensíveis, com facilidade de identificação com os demais. Indivíduos
perfeccionistas, exigentes, que não se satisfazem com os resultados obtidos,
que realizam cobrança por alto desempenho, que nunca estão satisfeitos com a
tarefa que estão executando, pensando que podem fazer melhor de outro jeito. Indivíduos
pessimistas que destacam os aspectos negativos e insucesso, que sofrem por
antecipação, com visões pessimistas de si mesmo e do mundo, de que não está
desempenhando sua atividade com a dedicação necessária e de que não está sendo
valorizado da maneira como acha que deveria estar sendo. Indivíduos com grande
expectativa e idealismo em relação ao trabalho, que podem deixar de serem
realistas e se decepcionarem. Indivíduos controladores são inseguros e tem
preocupações excessivas, centrando a realização das atividades em si mesmo,
relutam em aceitar ajuda, com muita dificuldade em delegar tarefas e trabalhar
em grupo. Indivíduos passivos que se mantêm na defensiva e com tendência a
evitação diante às dificuldades. Indivíduos com nível educacional mais elevado,
com maiores riscos em solteiros, viúvos e divorciados. As mulheres apresentam
maiores índices na relação com exaustão emocional, enquanto os homens em
despersonalização e distanciamento afetivo3. Os fatores relacionados
ao trabalho também se associam ao desenvolvimento da SB³. Trabalhadores
sobrecarregados, com excesso de demanda e que excede sua capacidade produtiva,
seja por incapacidade técnica, de tempo ou de infraestrutura organizacional. A
pressão no trabalho acarretará no agravamento da exaustão emocional. Uma baixa
participação nas decisões e baixo controle das atividades ocasionam uma
insatisfação pessoal frente ao trabalho. Discordância entre as expectativas
individuais de desenvolvimento profissional e a realidade do seu trabalho. O sentimento
de injustiça nas relações com colegas, ocasionados por desigualdades no
comprometimento individual, na cobrança organizacional, desigualdade salarial
em membros de mesmo cargo, promoções profissionais sem merecimento. Limitações
no suporte organizacional e dificuldade no relacionamento com colegas podem
provocar uma sensação de impotência, solidão, desamparo, desrespeito. Um
relacionamento com envolvimento sentimental entre o trabalhador e as pessoas a
quem deverá atender, lidando com pessoas em situações de desamparo e
sofrimento. Conflitos gerados pelas expectativas a respeito das suas funções e
o real papel que deverá desempenhar, conflitos sobre a discrepância entre o
desempenho e a tarefa que lhe foi cobrada. Também podemos citar as normas, regras,
direitos, metodologia e objetivos informados com pouca clareza pela organização3. Podemos citar também fatores
sociais associados à SB, como a carência de um suporte social e familiar, que
interfere no desempenho profissional por apresentar dificuldade na capacidade
de contar com colegas, amigos e familiares3. O estilo de vida, como pessoas
que trabalham demais e assumem responsabilidades excessivas, sem dedicar tempo
suficiente para socializar ou relaxar, que não dormem o suficiente. A dificuldade
de relacionar-se com outras pessoas, com falta de relações estreitas e
solidárias, sem poder contar com ajuda de outras pessoas. A necessidade de
manter uma posição social de prestígio, mesmo quando um baixo rendimento
salarial que envolve sua profissão, fará com que o indivíduo procure vários
empregos, sobrecarregando-se e diminuindo a disponibilidade de tempo para
atividades recreativas e prazerosas, também diminuindo o tempo para melhorar
sua capacitação profissional e, assim, gerando insatisfação e insegurança nas
atividades desempenhadas. Também alguns valores e regras culturais podem
propiciar o desenvolvimento da SB, de acordo com região em que reside e/ou
aspectos religiosos que pratica3. As principais áreas
atingidas pela SB são os profissionais da área da saúde10-12 (médicos,
enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, estudantes de medicina), da segurança
pública (policiais, militares, agentes penitenciários, seguranças) e da
educação13-14 (professores, educadores, diretores, pedagogos,
assistentes sociais). Também podemos citar outros profissionais, como
bancários, advogados, juízes, promotores e diretores de grandes empresas15.
São profissionais que enfrentam eventos estressores constantemente no seu
ambiente de trabalho, além de um intenso e contínuo envolvimento emocional16.
Geralmente são trabalhadores submetidos a longas jornadas de trabalho, com
excesso de responsabilidades, número insuficiente de pessoal, falta de
reconhecimento profissional, alta exposição a riscos físicos e químicos, assim
como contato constante com sofrimento, dor e, em muitas vezes, a morte4.
Nestas relações de trabalho, existe um envolvimento muito próximo com pessoas
em sofrimento, criando um maior vínculo afetivo entre os profissionais e os
pacientes e seus familiares. Os trabalhadores da
área de saúde mental convivem com diversos fatores associados ao risco de
desenvolvimento da SB 17,18. Eles possuem expectativas excessivas em
relação ao trabalho que desempenham e com relação à melhora do paciente,
existindo uma discrepância entre a expectativa idealizada e os resultados da
prática profissional. É idealizado um trabalho que ajudará as pessoas, mas, na
realidade, poucas mudanças são vivenciadas em pacientes crônicos e/ou quadros
mais graves. Existe uma falta de gratificação, tanto no aspecto financeiro
devido às baixas remunerações, quanto no aspecto profissional, visto que, na
maioria dos casos, são quadros clínicos crônicos e prognóstico de melhora muito
reservado. Existe ainda um baixo investimento público e/ou privado na
infraestrutura dos hospitais, clínicas e ambulatórios, bem como em medidas de
suporte à saúde do trabalhador. Eles acabam atuando em condições inadequadas de
atendimento e com grande demanda de pacientes necessitados de ajuda. Assim, os profissionais
da área de saúde mental estão entre os mais vulneráveis frente ao esgotamento
emocional e seus efeitos. Estes profissionais necessitam um maior controle
mental e emocional do que outras profissões. 4.3.
Aspectos epidemiológicos: Por ser um processo
consequente a uma exposição prolongada de estresse, considera-se a SB como um
problema universal e não como um privilégio de grupos profissionais,
determinada cultura, região ou país, de alguma sociedade ou grupo social. Na Europa, o estresse
aparece como um dos fatores mais importantes em relação à diminuição da
qualidade da saúde na década de 19903,19. Nos Estados Unidos,
problemas relacionados ao estresse causam um gasto anual calculado em mais de
US$ 150 bilhões para as empresas 3,20. As implicações financeiras
específicas da SB são avaliadas diante de insatisfação, absenteísmo,
rotatividade e aposentadoria precoce causado pela síndrome21. No
Canadá, um estudo demonstrou que os enfermeiros possuem uma das mais altas
taxas de licenças médicas entre as classes trabalhadoras, devido,
principalmente, a SB e às lesões musculoesqueléticas 3,22. Na
Alemanha, uma avaliação estimou que 4,2% dos trabalhadores eram acometidos por
SB 3,23. A SB foi considerada,
em estudo realizado por equipe ligada à OMS, como uma das principais doenças
entre europeus e norte-americanos, ao lado de diabetes e das doenças
cardiovasculares 3,24. Após avaliarem estes resultados, a OMS
convocou um grupo internacional de conhecedores do assunto para elaborar medidas
para a sua prevenção21. A maioria das pesquisas
avalia os trabalhadores da área da saúde em geral, obtendo dados muito
semelhantes. Pouco se sabe sobe a prevalência de SB na população em geral3.
Um estudo evidenciou que atinge mais de 40% dos médicos, em um elevado grau de
comprometimento do bem-estar social e do desempenho profissional do mesmo25.
Nas equipes de saúde europeias, é cada vez maior o número de médicos acometidos
pela SB, tanto pelo grau de comprometimento da saúde destes trabalhadores e da
qualidade do cuidado dos pacientes, quanto pelo prejuízo financeiro que causa21. No Brasil, os bancos de
dados utilizados não apresentam muitos estudos demonstrando a prevalência da SB3.
Em estudo realizado por Borges et al em
3 hospitais universitários no Rio Grande do Norte, constatou que 93% dos
participantes de um hospital apresentavam sintomas de SB em níveis moderados e
elevados26. Em estudo realizado por Codo com educadores de ensino
fundamental e médio, abrangendo 1.440 escolas e 30.000 professores, revelou que
26% dos estudados apresentavam exaustão emocional em todos os estados do
Brasil. Estes valores variaram de 17% em Minas Gerais e Ceará, a 39% no Rio
Grande do Sul27. Em pesquisa realizada por Trigo et al revelou que mais de 40% dos médicos podem estar
afetados pela SB em nível suficiente para comprometer o seu bem estar pessoal e
desempenho profissional3. 4.4.
Diagnósticos diferenciais: 4.4.1.
Estresse: O termo estresse é
caracterizado por um desgaste anormal e/ou redução da capacidade de trabalho1.
Ele é um grau de desgaste causado por determinada situação da vida, uma reação
normal do organismo, uma reação de defesa diante uma ameaça externa ou interna,
um estado de tensão provocado por situações arrebatadoras, que poderá gerar reações
psicossomáticas ou transtornos psicológicos. Ocorre uma tensão física ou
psicológica fora do normal, que causa um estado de ansiedade no organismo. A
reação física normal que ocorre quando o indivíduo se sente ameaçado ou
sobrecarregado, e os sinais e sintomas de estresse variam de pessoa para
pessoa. Pode ser desencadeado por qualquer estímulo, que poderá provocar uma
desestabilização no equilíbrio dinâmico do organismo1. A SB é a resposta a um
estado prolongado de estresse, que ocorre devido à continuidade de exposição a
fatores estressores no ambiente de trabalho 4,28. Ela é um
estado de exaustão emocional e física ocasionada por estresse excessivo e
prolongado. Ela é progressiva, iniciando como um estado de estresse que pode
progredir para SB se não for efetivamente administrado. O estresse e a SB não
são sinônimos. A tabela abaixo mostra algumas das principais diferenças entre eles28.
4.4.2.
Depressão: De acordo com o Kaplan
e Sadock¹, pacientes com humor deprimido exibem perda de energia e interesse, sentimentos
de culpa, dificuldade de concentração, perda de apetite e pensamentos de morte
ou suicídio. Outros sinais e sintomas incluem modificações do nível de
atividade, das capacidades cognitivas, da fala e de funções vegetativas, como
sono e atividade sexual. Essas alterações podem levar a comprometimento do
desempenho interpessoal, social e ocupacional. Segundo a 5ª edição do Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), cada episódio
depressivo deve durar no mínimo duas semanas e o indivíduo deve apresentar
humor deprimido ou perda de interesse ou prazer, associado a pelo menos quatro
sintomas, de uma lista que inclui mudanças no apetite e no peso, alterações no
sono e no nível de atividade, falta de energia, sentimentos de inutilidade ou
de culpa, diminuição da capacidade de pensamento, concentração e tomada de
decisões, além de pensamentos recorrentes de morte e suicídio29. A depressão é um estado
clínico, ocasionada por combinação de situações da vida e substâncias químicas
do cérebro. Não existe uma explicação para a tristeza e o desânimo, pois podem
vir de qualquer área da vida. Torna-se difícil encontrar energia e esperança ou
a capacidade de colocar-se no lugar do outro, sentir compaixão pelos outros e
por você. Geralmente, as pessoas deprimidas não tem força para desempenhar suas
atividades e, assim, podem passar a se sentir culpadas 1,29. Os sintomas depressivos
poderão refletir na capacidade produtiva do indivíduo. Podem se manifestar na
forma de tristeza excessiva, desânimo, exaustão, dificuldade de concentração,
baixa produtividade no trabalho, baixa tolerância a situações profissionais,
baixo índice de tolerabilidade de situações da rotina profissional, bem como
absenteísmo e afastamento do ambiente de trabalho. Estes sintomas depressivos
podem, inclusive, acentuar-se quando o indivíduo encontra condições inadequadas
no ambiente de trabalho, como sobrecarga profissional, cobrança excessiva e
relacionamento conflituoso com colegas no local de trabalho. A SB ocorre quando o
alto grau de estresse é ocasionado pelo ambiente de trabalho. O sujeito se
sente exausto, mas não conseguem descansar. O pensamento voltado ao trabalho
não é deixado de lado, mesmo que se sinta irritado com suas atribuições e com
os colegas. A SB é ficar cansado e ir além dos limites fisicamente e
mentalmente possíveis. A similaridade entre
estas duas doenças pode confundir os terapeutas que estão lidando com o
paciente. Ambas as patologias desencadeiam sintomas depressivos, mas na SB, a
raiz do problema é uma só: o trabalho. Em muitos casos, pacientes são
diagnosticados com depressão quando, na verdade, sofrem de SB, pois a origem do
quadro está relacionada à pressão e outros problemas ligados ao trabalho. 5. CONCLUSÃO: Ainda existem poucos estudos
demonstrando a prevalência da doença na população, apesar do grande número de
trabalhadores acometidos por ela. A atividade profissional é um evento que pode
consumir grande parcela do tempo de cada indivíduo e refletir no seu convívio
em sociedade. Um maior debate a cerca do tema permitiria a realização de
diagnósticos precocemente e a identificação de fatores desencadeantes do
quadro, possibilitando a aplicação de mudanças na cadeia de trabalho a fim de
evitar o desenvolvimento da doença. Prevenir a SB significa oferecer ao
profissional uma melhor qualidade de trabalho e, consequentemente, melhorias no
padrão de vida do indivíduo. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 1. Sadock BJ, Sadock VA. Compêndio de
Psiquiatria: Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica. 9ª Ed. Porto Alegre, Ed Artmed, 2007. 2. World
Health Organization. - Guidelines for the primary prevention of mental,
neurological and psychosocial disorders: Staff Burnout. In: Geneva Division of
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F. Job stress models for predicting Burnout Syndrome: a review. Ann
Ist Sup Sanità. 2016; 52(3):443-456. 7. ANEXO: Questionário para
identificação preliminar da SB, inspirado no MBI, onde deverá ser marcado na
coluna correspondente (1) nunca, (2) anualmente, (3) mensalmente, (4)
semanalmente ou (5) diariamente.
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