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Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

Julho de 2016 - Vol.21 - Nº 7

Psiquiatria na Prática Médica

LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO E SUA ASSOCIAÇÃO COM DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS: REVISÃO DA LITERATURA

Érica Buday de Oliveira Marnet *
Prof Dra. Marcia Gonçalves**


Introdução:

            O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença crônica, de caráter inflamatório, que atinge diversos sistemas, de causa desconhecida e de natureza autoimune, caracterizada pela presença de diversos auto anticorpos. É uma doença que incide mais frequentemente em mulheres jovens numa proporção de nove a dez mulheres para um homem. Presume-se que o desenvolvimento da doença esteja ligado a predisposição genética e fatores ambientais. Sendo multissistêmica, o LES pode acometer tanto o Sistema Nervoso Central (SNC) quanto o Periférico, causando um espectro de manifestações neuropsiquiátricas (MNP). Devido a variabilidade dessas manifestações em 1999, o subcomitê do Colégio Americano de Reumatologia (ACR) classificou 19 síndromes neuropsiquiátricas relacionadas à doença lúpica, a saber: Estado confusional agudo, Distúrbios cognitivos, Psicose, Desordens de humor, Desordens de ansiedade, Cefaléia, Doença cerebrovascular (DCV), Mielopatia, Desordens do movimento, Síndromes desmielinizantes, Convulsões, Meningite asséptica, Neuropatia craniana, Polineuropatia, Plexopatia, Mononeuropatia simples ou múltipla, Polirradiculoneuropatia inflamatória aguda (Guillain-Barré), Desordens autonômicas e Miastenia grave. 1

O diagnóstico e o tratamento das MNP são um grande desafio para os profissionais envolvidos na assistência destes pacientes. Elas são reconhecidas há mais de 100 anos, podem preceder o surgimento da doença ou ocorrer em qualquer tempo durante o seu curso. A normatização pelo ACR com seus critérios diagnósticos e as recomendações de exames laboratoriais e radiológicos, ajudou na classificação dos pacientes e a padronização dos estudos visto que o reconhecimento precoce das MNP passa pela dificuldade de estabelecer as causas primárias ao LES e as secundárias a complicações da doença ou seu tratamento. 2

A etiologia do LES neuropsiquiátrico é multifatorial e inclui microangiopatia, produção de auto-anticorpos e liberação intratecal de citocinas pró-inflamatórias.2 E existem alguns estudos associando essas manifestações clínicas a anticorpos, como o anti Pribossomal, anti-SSA, anti-DNA, anticardiolipina e antifosfolípides, entretanto há trabalhos que mostram resultados divergentes.3 Especula-se ainda que a ativação do Sistema Imunológico possa resultar em alterações em neurotransmissores e, consequentemente, em comportamentos.4

Estudos têm descoberto níveis mais elevados de distúrbios psiquiátricos em pacientes com LES, particularmente depressão ou angústia. A prevalência de sintomatologia depressiva no LES varia muito entre os estudos, de 17 para 71%.5 A depressão, muitas vezes, não é diagnosticada pelos médicos pelo fato deles acharem que os sintomas depressivos são uma resposta natural à doença física, capaz de ameaçar a vida de alguém, ou, numa posição oposta, é dado o diagnóstico de depressão a pacientes com tristeza ou com sintomas físicos causados pela doença de base.3 Além disso, as características da personalidade podem propiciar o desencadeamento da doença ou até mesmo o agravamento do quadro clínico, dando oportunidade para condutas que dificultam a recuperação.6

Para a investigação não-invasiva do lúpus eritematoso neuropsiquiátrico A RNM continua sendo o padrão-ouro, mas há limitações tanto com a sensibilidade quanto com a especificidade. Em relação ao tratamento, drogas sintomáticas, imunossupressivas e a anticoagulantes são utilizadas de maneira individualizada de acordo com a necessidade de cada paciente. A pulsoterapia com ciclofosfamida intravenosa tem sido recomendada em quadros agudos graves não-trombóticos. Um estudo refere a ciclofosfamida como mais eficiente que a metilprednisolona no tratamento destas síndromes, contudo por se tratar de revisão sistemática da literatura, faltam ensaios clínicos controlados, randomizados, com maior casuística e duração para orientar a prática clínica.2

Visto que há grande variabilidade de manifestações e desordens, o objetivo desse trabalho é verificar padrões descritos na literatura das MNP por meio de revisão bibliográfica.

 

Método:

            Trata-se de uma revisão de bibliografia, através de pesquisa nas bases de dados Pubmed e Scielo, em que foram buscados estudos publicados nos últimos 15 anos, utilizando-se os descritores “depressive disorder”, “systemic lupus erythematosus”, “depression”, “anxiety”, “psychiatric disorders”, “lúpus eritematoso sistêmico”, “depressão”, “alteração da personalidade” no período de Julho de 2016. Devido ao pequeno número de artigos em português publicados no Scielo, foram incluídos todos os principais artigos encontrados, num total de quatro. Quanto a pesquisa do Pubmed, foram selecionados os 40 artigos mais recentes, em ordem de relevância segundo o banco de dados, excluídos os artigos relacionados aos sintomas ou desordens neurológicas, ao tratamento, perfil diagnóstico ou etiológico das MNP, e estudos de casos, dando importância àqueles referentes a desordens psiquiátricas em adultos, restando um total de seis artigos.

 

Revisão da Literatura:

Vieira et. al 2 com um estudo descritivo e transversal de 18 pacientes com MNP moderadas e graves identificados entre 110 pacientes com diagnóstico de LES, de acordo com os critérios da ACR, teve uma prevalência de MNP moderadas ou graves de 16,4% sendo que a recorrência dos sintomas foi de 67%. Sendo as MNP principais: convulsões, cefaleia, psicose, DCV, síncope e Depressão Maior em ordem de frequência. A prevalência de MNP na literatura que varia de 14% a 75% e postula que esta ampla variação depende da amostra populacional estudada, refletindo a dificuldade de caracterização das MNP leves e moderadas, muito freqüentes nesta doença. E relata que estas manifestações vêm sendo alvo de estudos multidisciplinares para padronização de formulários com avaliações comportamentais que dão fidedignidade aos resultados publicados, principalmente nas alterações cognitivas, distúrbios de humor e quadros de cefaléia. A primeira MNP ocorreu em 72% dos pacientes, antes ou com até um ano de doença. Os resultados são semelhantes a literatura, em que as MNP precederam ao diagnóstico ou ocorreram no primeiro ano da doença em 63% dos casos, havendo evidências da sua associação com doença em atividade. Como limitação do estudo, revelam que a avaliação da presença de MNP é um grande desafio diante dos efeitos psiquiátricos adversos que podem ocorrer nos pacientes que utilizam corticosteróides em seu tratamento. A medicação provoca sintomas semelhantes aos encontrados na atividade do lúpus, como estados de euforia, labilidade emocional, pânico, alteração de comportamento e humor, psicose e delirium.

Ayache et. al 4 em 2005 realizou estudo prospectivo e através de testes, como a Escala Fatorial de Ajustamento Emocional/Neuroticismo (EFN) e avaliação psiquiátrica avaliaram que mesmo com o uso de antidepressivos não houve normatização dos escores gerais, como esperado com o uso desta medicação, mas sim uma diminuição para níveis considerados abaixo do normal. Contudo, durante o estudo não foi confirmada uma correlação da EFN com a nosologia psiquiátrica atual. A prevalência de transtornos psiquiátricos em na amostra foi bastante alta (75%), e a prevalência de depressão em na primeira avaliação foi de 65%. Encontraram também uma paciente com o diagnóstico de Transtorno de Personalidade Dependente, e outra com o diagnóstico de Transtorno Bipolar e Transtorno de Personalidade Borderline. Não encontraram neste estudo uma relação entre alterações da personalidade e atividade do LES. Quanto ao padrão da pesquisa, as pacientes foram encontradas com os mais variados tipos de organização psíquica, o que contraria a proposta de que as pacientes lúpicas teriam um modelo próprio, homogêneo e específico de funcionamento psicológico. Observaram também, através da análise dos prontuários, que a maioria das pacientes que tiveram melhor evolução no transcorrer da pesquisa foram as que tiveram melhor aderência tanto ao tratamento reumatológico quanto ao psiquiátrico.

Já em 2009, Ayache et. al 6, conduziu outro estudo de revisão bibliográfica, cuja conclusão foi de que o conhecimento das características de personalidade é fundamental para a compreensão da forma pela qual um indivíduo pode lidar com o estresse psicológico desencadeado pelas manifestações de uma doença e seu tratamento. Ademais, os fatores psicológicos têm importância como codeterminantes, desencadeantes, exacerbadores ou patoplásticos da doença lúpica e alterações de personalidade podem ser decorrentes do estresse psicológico imposto pela patologia, da atividade da doença no SNC e/ou do uso de medicações como os imunossupressores e corticoides. Entretanto, foi inconclusivo quanto à presença de um padrão de personalidade nas pacientes lúpicas. As informações quanto às alterações de personalidade desencadeadas pela doença ou uso de medicação, são ainda controversas: alguns autores encontraram esta correlação, outros não.

Bachen et. al 5 em seu estudo de coorte com 326 mulheres caucasianas, utilizou questionário de acordo com critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV) e o Questionário de Atividade Sistêmica Lúpica (QASL), encontrando resultados que indicam que manifestações psiquiátricas são frequentes em pacientes com LES e documentam que mais de uma forma de desordem psiquiátrica muitas vezes ocorre no mesmo paciente. A prevalência de MNP foi de 65% sendo distribuídos em: Transtorno Depressivo Maior (TDM) (47%), fobia específica (24%), fobia social (16 %), transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) (9%), perturbação de pânico (8%), transtorno bipolar de tipo I (desordem anteriormente maníaco-depressiva, 6%), desordem de ansiedade generalizada (GAD) (4%), transtorno distímico (3%), e agorafobia sem transtorno do pânico (1%). A prevalência de TDM foi duas vezes mais comum do que as estimativas da população em geral e que em comparação com as estimativas de prevalência para mulheres caucasianas nos Estados Unidos, pacientes com LES tiveram 6 vezes maior prevalência no transtorno bipolar I, 11 vezes no TOC e 1,5 vezes na fobia específica, e transtorno do pânico também foi mais comum, com taxas de até 2,5 vezes maior. Contrariamente, GAD e transtorno distímico foram menos comuns na amostra LES, em comparação com as estimativas nacionais. Ademais 59% dos pacientes que preencheram os critérios para TDM também tinham um transtorno de ansiedade, sugerindo que alguns dos efeitos observados de depressão nos resultados podem ser devido a dificuldades subjacentes com ansiedade. Os autores sugerem que é possível que a atividade da doença está mais estreitamente ligada a resultados de saúde mental, porque ela reflete a sintomatologia que interfere com as atividades do dia-a-dia e qualidade de vida. Além disso, aproximadamente um terço das pessoas com transtorno do pânico não relatou seus sintomas para o médico e bem mais da metade dos pacientes (66%) nunca disse sobre seus sintomas obsessivo-compulsivos ou preocupações de ansiedade social (60%), reforçando que os prestadores de serviços médicos são geralmente a primeira linha de intervenção para problemas psiquiátricos, proporcionando tratamento direto ou encaminhamentos para especialistas em saúde mental. Concluindo que como os pacientes com transtornos de ansiedade muitas vezes sentem vergonha de divulgar abertamente seus sintomas, outros métodos de avaliação, tais como questionários de autorelato podem ser úteis na identificação de pacientes com estas condições.

            Mesquita et. al 7 em seu estudo transversal com pacientes em tratamento com pulsoterapia de ciclofosfamida a fim de avaliar distúrbios do sono e sintomas depressivos, utilizando a escala de depressão de Beck (EDB) e o questionário de qualidade de sono de Pittsburgh. Os resultados foram que a má qualidade do sono é semelhante a casos de LES com outros tipos de tratamento. A prevalência de depressão foi de 40% da amostra.  Além disso, esta qualidade está relacionada com a atividade da doença e com a presença de sintomas depressivos. Relata também que os distúrbios do sono podem ser simultaneamente uma causa e uma consequência de diversas doenças autoimunes visto que mediadores imunes têm sido associados a mudanças do sono em outros estudos clínicos e experimentais. Por outro lado, a evidência experimental indica que a privação de sono provoca manifestações precoces da doença e a secreção de corticosteroides, por isso fadiga, uma queixa comum dos pacientes com LES, tem sido associada ao desempenho diurno reduzido e deve-se ter em mente que a sonolência diurna excessiva pode ser confundida com a fadiga. Higiene do sono e tratamento farmacológico ainda não foi sistematicamente testado nestes pacientes. Os autores afirmam que o tratamento de sintomas depressivos pode ser fundamental para o controle da fadiga, perturbações do sono e a atividade da doença.

            Hawro et. al 8 em seu trabalho longitudinal observou 52 pacientes lúpicos, diagnosticados com os critérios do ACR e desordens psiquiátricas avaliadas por especialista de acordo com a Classificação Internacional das Doenças 10ª revisão (CID 10) e a Classificação Neuropsiquiátricas do LES (NPLES). A prevalência de MNP foi de 30,77%. Transtornos do humor foram diagnosticados em 11,54%. Em todos os casos, havia transtorno depressivo, enquanto que os transtornos de humor maníacos / submaníacos e mistos não foram observados. Disfunção cognitiva foi diagnosticada em 9,62%, transtorno de ansiedade em 7,69%, e psicose em 1,92%. Os autores afirmam que o envolvimento do SNC tem um lugar especial entre outros sistemas no curso do LES, sendo responsável por um curso mais grave da doença e que comparando com os a população geral de adultos, os pacientes com LES possuem uma prevalência maior dessas desordens. Supõe-se que perturbações do cérebro resultantes da oclusão de vasos sanguíneos e diminuição da perfusão, bem como interações imediatas de anticorpos com as células da Glia e os neurônios são considerados como sendo os mais importantes mecanismos etiológicos das MNP. Na amostra, observou-se menor tempo de LES em pacientes com transtorno de ansiedade. Pode-se especular que a ansiedade resultada nestes pacientes é devido ao conhecimento insuficiente sobre o curso da doença e métodos de tratamento. Com conhecimento adquirido, sucessivamente, durante o curso da doença e com o desenvolvimento de estratégias eficazes de enfrentamento podem provocar uma menor taxa de transtorno de ansiedade em pacientes com pouco tempo de LES. Dessa forma, os resultados obtidos e dados da literatura podem sugerir que pelo menos uma parte dos distúrbios ansiosos encontrados nas NPLES tem um processo de adaptação e que há uma necessidade de ajuda psicológica dirigida a pacientes com LES recém-diagnosticados.

            Maneeton et al. 9 em estudo transversal para identificar a prevalência de distúrbios depressivos e seus fatores de risco utilizando a NPLES e Escala de Depressão de Hamilton, descobriu uma prevalência de 45,2% de pacientes depressivos, 37,1% de desordens ansiosas, sendo que 30,4%, 34,8% e 34,8% tinham ansiedade severa, moderada e leve, respectivamente. Autores inferem que em geral, a relação entre a depressão e a ansiedade em pacientes entre diferentes idades e diferentes doenças crônicas tem sido relatada. Além disso, uma idade mais jovem de pacientes com LES também está associada com depressão. Da mesma forma, foi constatado que, em pacientes pediátricos com LES houve uma maior prevalência de TDM. Aflição de longo prazo e dificuldade de se ajustar às suas vidas com deficiência podem desempenhar um papel na causa da depressão. Resumindo a depressão e a ansiedade são altamente prevalentes em pacientes com LES. Ansiedade e pouca idade estão associados com transtorno depressivo nos pacientes.

            Hanly et. al 10 em estudo prospectivo de coorte para avaliar a frequência, características, associações clínicas e auto anticorpos e os resultados dos transtornos do humor em um grande grupo multiétnico. Utilizando os critérios do ACR para diagnóstico do LES e DSM-IV para as MNP. A frequência observada de distúrbios de humor foi de 12,7% dos pacientes, a estimativa de transtornos de humor em 10 anos foi de 17,7% e depressão maior foi o tipo predominante e esses achados estão de acordo com a prevalência de transtornos de humor na população em geral e em outras doenças crônicas. O menor risco de transtornos de humor em pacientes que receberam medicamentos imunossupressores poderia sugerir um efeito terapêutico benéfico de uma condição mediada por autoimunidade, mas a falta de associação com a atividade global da doença, lesão cumulativa de órgão e um painel de auto anticorpos lúpicos tradicionalmente associados com NPLES implicam que a maioria distúrbios de humor não são manifestações principais da doença. Ademais, a detecção de um transtorno de humor através de uma consulta clínica foi associado com autorelatório com menor qualidade de vida (QV) e a co-ocorrência de transtornos de humor com outros eventos MNP, o que foi frequente no estudo, pode complicar a avaliação de outras MNP. E ao considerar as opções de tratamento, os resultados suportam tanto o uso de terapias sintomáticas (por exemplo, antidepressivos) e terapias dirigidas ao lúpus (por exemplo imunossupressoras), quando indicado para o LES ativo globalmente.

            Shakeri et. al 11 em estudo caso-controle, baseado em critérios da ACR, EDB, escala de ansiedade de Beck, e autorelato de QV, a fim determinar o impacto de correlações mútuas entre depressão, ansiedade e variáveis relacionadas à doença na qualidade de vida de iranianos. A prevalência de depressão e ansiedade neste estudo foi cerca de 20% entre as pessoas com LES o que não foi significativamente diferente da população em geral de Kermanshah. Além disso, foi mostrado que o único componente afetado pelo LES foi o físico. Os pacientes iranianos com LES autorelato mais pobre em componentes físicos enquanto que o componente mental estava relativamente poupado o que indica que os pacientes com LES têm o potencial de adaptabilidade mental apropriado para lidar com suas preocupações mentais. O status socioeconômico é um fator determinante da evolução da doença entre os pacientes com LES e o estudo mostra que maior renda representa uma melhor condição socioeconômica e é significativamente associada a melhores componentes de funcionamento social e saúde geral da QV. Além disso, mostrou-se que homens saudáveis tinham melhores condições de domínio de funcionamento social em comparação com mulheres saudáveis. No entanto, as mulheres com LES tiveram melhor saúde mental do que o sexo masculino, mostrando que a capacidade maior de enfrentamento para manter a estabilidade mental e saúde mental entre as mulheres com LES. Para que se entenda as razões, o papel das características clínicas da doença para determinar a QV deve ser considerado, visto que a existência de diferentes manifestações clínicas de LES entre homens e mulheres tem sido mostrado em literatura. Homens são conhecidos por serem mais propensos a desenvolver rash discóide e nefrite lúpica do tipo IV enquanto que a artrite e leucopenia ocorrem com mais frequência entre as mulheres. Não foi encontrada relação entre as manifestações clínicas com LES e gravidade da depressão e ansiedade.

            Asano et. al 12 em revisão sistemática de literatura consta que sintomas psiquiátricos são comumente relatados em pacientes com LES, contribuindo para a morbidade física e funcional. Além disso, durante o curso da doença, depressão e ansiedade são sintomas frequentemente observados por diversos autores, sendo a comorbidade psiquiátrica de maior prevalência o TDM, variando entre 18,3-75% nos diferentes estudos. Além disso, transtornos de ansiedade também foram descritos como de alta prevalência no LES entre os diversos artigos, e o TOC foi considerado frequente. Contudo, não há um consenso ainda para a correlação entre a atividade da doença e os diversos problemas mentais. Autores reiteram que o reconhecimento dessas associações fornece manuseios apropriados e pode também trazer novos conhecimentos para a compreensão dos mecanismos envolvidos nesta importante apresentação clínica do LES. Visto que apesar dos avanços científicos, o LES continua sendo uma doença ameaçadora e de evolução crônica, causando intenso sofrimento físico, psíquico e social, o que explica o maior risco de suicídio do que a população em geral.

 

Concluindo, é bem fundamentada a variabilidade da prevalência de MNP nos pacientes com LES. Essa variabilidade se dá pela diferença entre as populações estudadas, falta de padronização dos critérios adotados nos diversos estudos para diagnóstico das desordens psiquiátricas, trabalhos com amostras não representativas, entre outros. Visto que depressão e ansiedade são as manifestações mais comumente encontradas em pacientes com LES, e apesar do desconhecimento de causa ou de consequência entre as duas entidades, é notória a diminuição da qualidade de vida dos pacientes e as dificuldades que os sintomas causam para que a terapêutica apropriada seja adotada pelo paciente, postergando ainda mais seu sofrimento. Cabe aos profissionais de saúde o esclarecimento adequado da doença a fim de diminuir a ansiedade causada nesses pacientes, além de dar importância para aqueles pacientes com MNP isoladas, dado que estas podem preceder o surgimento da doença ou ocorrer em qualquer tempo durante o seu curso. Dessa forma, mesmo médicos não psiquiatras devem estar habilitados para reconhecer essas manifestações e sinais de suspeição dos transtornos mentais, especialmente nos ambulatórios de LES e fazer o encaminhamento para tratamento psiquiátrico, com o objetivo de diminuir o sofrimento dessa doença.

Referências:

 

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2.    VIEIRA, Walber Pinto et al . Análise de prevalência e evolução das manifestações neuropsiquiátricas moderadas e graves em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico internados no serviço de reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza. Rev. Bras. Reumatol.,  São Paulo ,  v. 48, n. 3, p. 141-150,  jun.  2008 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0482-50042008000300003&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  23  jul.  2016.  http://dx.doi.org/10.1590/S0482-50042008000300003.

 

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* Interna do Curso de Medicina da Universidade de Taubaté.

** - Coordenadora da disicplinad e psiquiatria da UNITAU

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