Setembro de 2024 – Vol. 29 – Nº 9

Sérgio Telles

  1. Importante comentário-resenha do livro “The Madman in the White House: Sigmund Freud, Ambassador Bullit, anda the Lost Psychobiography of Woodrow Wilson” (2023), de Patrick Weil. É sabido que o livro escrito por Freud e Bullitt suscitou muitas polêmicas desde sua criação em 1931, tendo sido até mesmo contestada a parceria de Freud. Interesses variados estavam em jogo – Freud devia favores a seu importante paciente Bullitt, embaixador dos Estados Unidos na Inglaterra e importante agente na fuga da família Freud para Londres, escapando dos nazistas. Tal fato teria forçado Freud a participar a contragosto da coautoria. O teor do livro – mostrando como a doença mental do presidente dos Estados Unidos Woodrow Wilson (homossexualismo latente, messianismo religioso) o levou a exercer um papel catastrófico nas negociações do Tratado de Versalhes, no final da Primeira Guerra Mundial, sendo por isso o responsável direto pelas circunstâncias que levaram à Segunda Guerra Mundial. Assim, o livro só foi efetivamente publicado em 1966, quando ambos os autores já estavam mortos. Patrick Weil fez uma pesquisa de fôlego, que o levou à descoberta dos originais do livro, com todas as páginas rubricadas por Freud e Bullitt, o que elimina a suspeita de que Freud não seria co-autor do mesmo, mas também expõe a fraude de Bullitt, que adulterou o texto, extirpando importantes fragmentos ligados à passividade homossexual inconsciente de Wilson, que refletiria – por sua vez – o papel passivo homossexual de Cristo frente a Deus pai. Tais interpretações – de larga envergadura politica, religiosa e cultural – seriam inaceitáveis na ocasião e mesmo agora podem causar espécie em mentes mais susceptíveis. O resenhista se surpreende com a grande atualidade do livro, pois ele antecipa questão candente na atualidade – o uso da psicanálise para a compreensão dos homens públicos, especialmente aqueles que mostram desequilíbrio mental, o que pode ser danoso para a sociedade. Ao falar de Wilson e do cristianismo, Freud pensaria na loucura de Hitler e nas psicoses sociais – nos “delírios coletivos”, com chamou as religiões. Retoma-se as questões trazidas pela Lei Goldwater (psiquiatras não podem dar diagnósticos de pessoas que não os consultaram diretamente) e as polêmicas sobre a saúde mental de Trump. A mim chamou a atenção a análise do cristianismo que Freud não havia especificado claramente em seus trabalhos sobre religião – Totem e Tabu, O futuro de uma ilusão e Moises e o monoteísmo.

Freudulence | Los Angeles Review of Books (lareviewofbooks.org)

  1. Em longa reportagem, a revista L´Express de Paris, aborda o escândalo em torno de Gerard Miller, irmão de Jacques-Alan Miller, que é genro de Lacan e atual sumo-sacerdote do culto em que se transformou o ensino “oficial” de Lacan. Segundo o texto, ali está implantado um sistema regido por três gurus que exercem o poder de forma incontestável – os dois irmãos já citados e Judith, filha de Lacan e mulher de Jacques-Alan. O escândalo em pauta gira em torno da acusação de estupro e abusos diversos feita contra Gerard por mais de 60 mulheres. A instituição lacaniana, sempre muito presente e atuante na mídia, mantem um pesado silêncio, comparado pela revista ao existente na Coreia do Norte em torno dos dirigentes supremos. Dá muito o que pensar e lamentar tal situação.

Sua influência, escândalo e silêncio: os Millers, gurus caídos da psicanálise – L’Express (lexpress.fr)

  1. Angela Bismarchi, ex-rainha de bateria, personagem de televisão formou-se em psicanálise. Pousou para as fotos com beca e diploma. Antes desse título, tinha se formado em teologia e moda. A noticia nos faz pensar sobre a mercantilização do ensino e as vicissitudes dos mecanismo de formação de analistas no Brasil de hoje.

Ângela Bismarchi: Ângela Bismarchi forma em Psicanálise e celebra: ‘Um novo caminho’ | Famosos | Head Topics

Ex-rainha de bateria, Ângela Bismarchi se forma em psicanálise | Metrópoles (metropoles.com)

Ângela Bismarchi, ex-rainha de bateria, conclui sua terceira faculdade aos 57 anos – O Segredo

  1. Nelson Rodrigues, na crônica intitulada “Freud no futebol”. publicada em 07/04/1956 em “Manchete Esportiva”, trata de forma jocosa, mas correta, as agruras emocionais dos jogadores, responsáveis por derrotas inexplicáveis em jogos decisivos. Que recursos os pobres técnicos de futebol têm para lidar com tais complexas situações? – pergunta ele.

O futebol brasileiro tem tudo, menos o seu psicanalista. (pragmatismopolitico.com.br)

  1. Dois jovens psicanalistas, André Alves e Lucas e Liedke, criaram um podcast em que analisam acontecimentos e relações através da ótica da psicanálise.

Psicanálise na cultura: podcast Emoção Criativa recebe “Vibes em Análise” (ig.com.br)

  1. “Domingo é Freud” é um canal do YouTube mantido por Danny Correia, crítico de arte e estética, que analisa produções estéticas à luz da psicanálise.

Próxima parada: Estação 1397 (youtube.com)

Domingo é FREUD – A psicanálise anarquista de Otto Gross, com Pedro Paulo Rocha (youtube.com)

  1. Como mostra dos vários influencers e cursos de psicanálise à disposição na rede, temos o “Confraria Analítica”. Na apresentação do site se lê: “A Confraria é a maior e mais acessível escola de Teoria Psicanalítica do Brasil. São mais de 300 horas de aulas já disponíveis sobre diversos temas e conceitos da Psicanálise, além de duas aulas novas (uma delas ao vivo) toda semana com o psicanalista Lucas Nápoli, doutor em Psicologia Clínica (PUC-RJ)”.

Confraria Analítica – Dr. Lucas Nápoli (lucasnapoli.com)

  1. Mark Solms, psicanalista sul-africano comissionado pela British Psychoanalytic Association para uma revisar a “Standard Edition”, realizada por James Strachey e finalizada há 50 anos. Nessa “Revised Standard Edition”, Solms corrige o que considera equívocos da tradução de Strachey, que usa uma linguagem mais empolada e “cientifica” do que a usada originalmente por Freud, que se expressava de forma fácil e coloquial. Solms pensa que Strachey não deixa claro que Freud usava de forma mais ampla e abrangente o conceito de “sexualidaded”, afastando-se do uso comum, que o entende de forma restrita às práticas sexuais. Pensa que Freud usava “sexualidade” como equivalente a “fonte de prazer”, fosse ele erótico ou não. Ao corrigir essa concepção, Solms acredita que Freud ficará livre da pecha de “obcecado pelo sexo”, razão de ser ele visto hoje de forma um tanto caricatural, em detrimento da grandeza e profundidade de sua obra.

Freud was ‘misunderstood’ and wasn’t so obsessed with sex, new analysis of work suggests | Psychology | The Guardian

Freud’s Writings Get an Update—30 Years in the Making (publishersweekly.com)

Sigmund Freud did NOT believe all our suppressed feelings were due to erotic fantasies – as scholar discovers reason for popular misconception | Daily Mail Online

Freud voyait-il des références érotiques partout ? Une réédition de ses travaux conteste cette idée reçue – Le Parisien

Freud was not obsessed with sex, it was everyone else (telegraph.co.uk)

Freudian slip-up: Why the founder of psychoanalysis was not as sex- obsessed as people think (msn.com)

‘Let’s talk about sex baby’: Freud wasn’t just about the phallus, reveals new analysis of his work – Science News (wionews.com)

“Une incompréhension importante”: une nouvelle traduction des écrits de Freud clarifie son rapport à la sexualité (bfmtv.com)

Freud is coming for your kids – UnHerd

  1. Buenos Aires, capital da psicanálise. Essa é uma afirmação frequente, cujas implicações nunca foram devidamente exploradas. Se isso é verdade, não comportaria estudos que avaliassem o impacto provocado pela psicanálise na sociedade argentina? Se os argentinos de fato são os maiores consumidores e praticantes de psicanálise não haveria efeitos perceptíveis? Como pensar o peronismo sob esse parâmetro? Talvez a questão seja mais ampla – como aferir os reconhecidos efeitos da psicanálise sobre o indivíduo e a sociedade?

Buenos Aires, capitale de la psychanalyse, par Anne-Dominique Correa (Le Monde diplomatique, août 2024) (monde-diplomatique.fr)

  1. O autor comenta a negação coletiva dos perigos envolvidos pelo uso da tecnologia, especialmente do telefone celular e das redes sociais, que exercem um imenso poder de controle e manipulação das massas.
  1. Para o coletivo, o que é melhor – a normopatia ou a inadaptação social? O artigo enfatiza a crença do artista francês Henri Michaux na importância da inadaptação aos padrões sociais vigentes, que ele julga ser fonte de criatividade e originalidade, como comprovaria a observação de várias personalidades produtivas.

Henri Michaux: l’art de cultiver son inadaptation créatrice – Ici Beyrouth

  1. Nota obituária da psicanalista norte americana Jill Horowitz que ao se ver impedida de se candidatar nos institutos de formação analítica por ser psicóloga e não médica, juntou-se com outros preteridos da California e de Nova York e fundaram o Comitê para a Análise Leiga, que processou a IPA baseada na lei antitruste e venceu a causa em 1987, quebrando com isso o monopólio dos médicos na carreira analítica, até então vigente nos Estados Unidos. Fundou ainda o Psychoanlytic Institute of Nothern California (PINC) em 1989.

Jill Horowitz Obituary (1942 – 2024) – Lafayette, CA – San Francisco Chronicle – Legacy.com

  1. Pequeno resumo para público leigo de “Moisés e o monoteísmo”, em que Freud defende a ideia de que Moisés não era judeu e sim egípcio, assim como ser egípcia era a prática da circuncisão.

Por que Freud disse que Moisés não era judeu (aurora-israel.co.il)

  1. Os frequentes ataques e críticas sofridas pela psicanálise na França, surpreende a quem não tem conhecimento do fato.

Psicanálise oprimida? | Cairn.info

  1. Autora de muitas publicações acadêmicas e literárias, a psicanalista Ana Cecília Carvalho é eleita como nova imortal da Academia Mineira de Letras.

Academia Mineira de Letras elege a primeira psicanalista em seus 115 anos – Estado de Minas

Ana Cecília Carvalho é eleita nova imortal da Academia Mineira de Letras – BH Eventos

Ana Cecília Carvalho, uma aquisição valiosa da Academia Mineira de Letras – Cultura

  1. No próximo semestre, será lançado um filme contando o encontro de duas mulheres importantes na história da psicanálise brasileira – Adelaide Koch e Virgínia Bicudo.

Filme ‘Virgínia e Adelaide’ narra o encontro de duas mulheres pioneiras da psicanálise no Brasil – Verso – Diário do Nordeste (verdesmares.com.br)

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