Maio de 2024 – Vol. 29 – Nº 5

Clara Renata M. de Oliveira (1); Lucas P. G. de Faria (2),

Matteo Celano(3); Prof. Dra.Márcia Gonçalves (4)


Resumo – Uma grande preocupação da área da psiquiatria contemporânea é o uso
excessivo das redes sociais e as formas pelas quais esse fenômeno pode impactar na
saúde mental do indivíduo e no seu desenvolvimento pessoal.
Estudos de diversas universidades apontam que o uso prolongado e inadequado de
redes sociais pode impactar no bem-estar psicológico de cada pessoa. Com o objetivo
de confirmar esse impacto, foram analisados 11 artigos sobre o tema, todos encontrados
na plataforma Pubmed, publicados na última década, os quais correlacionavam o uso
das mídias sociais e a saúde mental dos usuários, incluindo transtornos de ansiedade e
depressão.
Dessa forma, foi possível concluir que, embora a maioria dos trabalhos mostrasse
uma interferência negativa do uso das redes, alguns não constataram correlação
alguma, e outros, ainda, benefícios do uso dessas. Com isso, é provável que realmente
haja riscos para o bem-estar mental no uso inadequado das redes> Entretanto também
há pontos positivos no uso consciente.
Descritores: redes sociais; saúde mental; mídias sociais; ansiedade; depressão.


Introdução
Saúde mental
A saúde mental é um estado de bem-estar em que cada indivíduo realiza seu
próprio potencial, consegue lidar com os desafios normais da vida, consegue trabalhar
de forma produtiva e frutífera e é capaz de contribuir para a sua comunidade. [1]
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a prevalência de ansiedade e
depressão aumentou em 25% no primeiro ano de Pandemia de Covid-19. [2] Houve
também no período um crescente com relação ao uso das redes sociais, que
apresentaram impactos negativos diretamente na saúde mental da população jovem. [3]
O cuidado com a saúde mental é uma preocupação cada vez mais importante na
sociedade atual, visto que o número de doenças mentais como depressão e ansiedade
estão crescendo ao longo dos anos, e isso é um cenário alarmante para a medicina. [4]
O bem-estar mental está relacionado com as ideias e emoções de um indivíduo,
assim como sua forma de reagir, pensar e se relacionar com outras pessoas.

Atualmente, sabe-se de sua devida importância e como os distúrbios psicológicos
podem impactar na saúde geral do paciente. [4]
Desde que a primeira rede social foi criada em 1997, esse meio de comunicação
foi crescendo e conquistando principalmente o público jovem. Atualmente, é comum ver
crianças ativas nas redes, e alguns aplicativos como o Tiktok atingem cerca de 1 bilhão
de usuários mensalmente. Entretanto, é preciso ficar atento aos malefícios que essa era
digital pode causar. [5]
A exposição midiática e o tempo de uso prolongado são fatores a serem
relacionados com o bem-estar da saúde mental dos usuários. Assim, diversos pontos
desses meios de comunicação podem ser analisados nesse quesito, como a alta
exposição de privacidades e intimidades, a dependência de aprovação alheia, a falta de
atenção para atividades cotidianas e o prejuízo da autoestima causado pelas mídias
irreais e pelo estilo de vida “perfeito” exibido por influenciadores. [6]
Além disso, o consumo de conteúdos cada vez mais rápidos, como vídeos de 15
ou 30 segundos, é uma realidade no mundo digital e vem ganhando cada vez mais
destaque, podendo estar relacionado com a perda da capacidade de concentração dos
usuários. E por fim, o sedentarismo relacionado ao uso excessivo dessas ferramentas
também pode impactar o bem-estar mental da população. [5]
Ansiedade
Segundo um estudo da universidade de Queensland, a ansiedade é um dos
transtornos psicológicos mais presentes em todo o mundo: uma em cada 14 pessoas
tem ansiedade, além disso uma em cada 9 pessoas vai apresentar sintomas de
ansiedade uma vez ao ano. [7]
A sensação de ansiedade é comum diante de algumas situações que apresentem
perigo ou novidade. No entanto, quando essa sensação deixa de ser esporádica e passa
a ser patológica, durando um longo período e impactando as atividades rotineiras do
indivíduo, ela merece uma atenção especial. [7]
A ansiedade é um dos transtornos de saúde mental mais prevalentes na
sociedade, e implica sintomas físicos como taquicardia, taquipneia, sudorese,
palpitações, inquietação, insônia; e psicológicos como falta de concentração, estresse,
irritabilidade, medo, entre outros. Ainda, a ansiedade pode ser um fator de risco para
depressão. [7]


Depressão

Segundo a OMS, a depressão,atinge mais de 300 milhões de pessoas no mundo,
e o número de doentes vem crescendo cada vez mais.
Esse quadro pode ser extremamente grave e estar relacionado a fatores químicos
e hormonais do organismo além de influências externas. Entre os principais sintomas da
depressão, encontram-se: tristeza e angústia persistentes, fadiga, desinteresse, falta de
motivação, isolamento social, desesperança, apatia, entre outros. [8] . Também é
possível se observar alguns pacientes também apresentam hiporexia ou anorexia,
podendo ter perda de peso significativa, e cometam atos como automutilação. Essa
doença não só afeta a vida social do indivíduo, mas também podem causar importantes
manifestações físicas e por isso merecem uma atenção redobrada. [8]
Por isso, é preciso fazer o diagnóstico precoce e iniciar o tratamento o mais breve
possível, para assegurar um melhor prognóstico.
Outros Distúrbios Mentais
Além da ansiedade e da depressão, que são distúrbios que podem ser
associados ao uso excessivo das redes sociais, existem outras patologias que podem
estar relacionadas. Entre eles, podemos citar, Transtorno Afetivo Bipolar, dependência
emocional, Síndrome do Pânico, e diversos outros transtornos que podem ser estudados
futuramente. [9]
Muitos desses quadros podem estar interrelacionados entre si, ou ser um fator de
predisposição ou agravante para outra doença. [9]


Objetivos
O objetivo desse trabalho é fazer uma revisão de artigos publicados que
correlacionam o uso de redes sociais e sua influência na saúde mental, procurando
dados e estudos que correlacionem algum possível impacto do meio digital com o
desenvolvimento ou agravamento de transtornos mentais como ansiedade e depressão
em adultos e adolescentes.


Metodologia
Foram escolhidos 30 trabalhos do PubMed, os quais correlacionavam os
descritores saúde mental e redes sociais, ou, em inglês “social media” e “mental health”.
Desses, foram excluídos 18 trabalhos por motivos de relação com o tema, língua, data
de publicação e relevância acadêmica. Então foram selecionados 11 trabalhos, sendo
eles, em inglês ou português, incluindo estudos quantitativos e qualitativos, de pesquisa
e análise de dados ou de revisões sistemáticas, sendo todos de 2017 a 2023. Foi feita

então uma revisão de todos os artigos separadamente, destacando-se os pontos mais
relevantes para este trabalho, os quais serão discutidos a seguir.


Discussão
Um estudo sueco feito em 2021 contou com 2118 entrevistados numa pesquisa
transversal, dos quais apenas 2002 dos participantes concluíram todo o questionário. A
pesquisa avaliou um público com idade variável entre de 16 a 80 anos com relação ao
uso das redes sociais e jogos online e suas implicações na saúde mental de cada um
deles. Neste estudo foram utilizados quatro questionários a fim de avaliar fatores como a
e a influência dos jogos , associando a frequência da exposição à internet, o
comportamento associado aos meios digitais, a interferência na saúde mental nos
últimos 6 meses. Além disso, foram incluídas variáveis sociodemográficas como sexo e
idade. [10]
A pesquisa não mostrou diferenças importantes entre os sexos feminino e
masculino nos quesitos avaliados, porém ficou clara uma disparidade entre as faixas
etárias, sendo o público jovem muito mais afetado do que os adultos acima de 40 anos.
Ainda, o tempo gasto com mensagens instantâneas foi significativamente correlacionado
com o desfecho de transtornos mentais. Um dos pontos relevantes foi a análise dos
sintomas de vício nas mídias sociais. [10]
Um estudo feito nos Estados Unidos monitorou o tempo de uso de redes sociais
de 500 adolescentes e jovens entre 13 e 20 anos durante oito anos. Este trabalho não
constatou grandes associações entre o uso de mídias sociais e o desenvolvimento de
problemas de saúde mental. [11]
O estudo utilizou como método um questionário com perguntas sobre o tempo de
uso das redes sociais, sintomas de ansiedade e uma escala sobre depressão (CES-DC;
Weissman, Orvaschel e Padian, 1980). Uma das hipóteses levantadas pelo trabalho
seria de que a geração que coincidiu com a explosão da internet está desenvolvendo
maiores índices de transtornos mentais, sem que esses eventos tenham
necessariamente alguma associação. [11]
Uma pesquisa feita em 2020, publicada na Journal of Talibah University Medical
Sciences, com 893 estudantes universitários, onde foram analisados estudos
transversais com universitários, os quais obtiveram resultados distintos demonstrou um
impacto significante na saúde mental relacionado ao uso das mídias sociais. Os dados
da pesquisa também foram coletados por meio de questionário, utilizando de
ferramentas como a HADS (Hospital Anxiety and Depression Scale), Escala de

Autoestima de Rosenberg, e outras escalas sobre o estado emocional. Já para avaliar o
uso de redes sociais, foram utilizadas três medidas, resumidamente: exposição e tempo
gasto, uso noturno e relevância da rede para o participante. [12]
De acordo com esse questionário, foi criada uma pontuação e uma classificação
para esta, na qual quanto maior a pontuação, maior a influência das redes sociais na
saúde mental do universitário.
Notou-se um grande tempo gasto nas redes sociais, sendo o uso noturno, cujo é
ainda mais prejudicial, muito expressivo. Ainda é possível observar um grande impacto
na autoestima dos participantes, o que pode estar ligado direta ou indiretamente a outros
transtornos mentais, atuais ou futuros. Com isso, os resultados mostram que a
probabilidade de possuir ansiedade e depressão aumenta em 1,76 e 1,48,
respectivamente, na amostra estudada. [12]
Outrossim, um trabalho brasileiro realizado em 2015 com 169 estudantes de
medicina mostrou uma forte associação entre o uso da internet e interferências
negativas em vários fatores como família, lazer, estudos, relacionamentos, entre outros.
[13]
Contudo, este estudo, realizado no estado de Sergipe, não constatou correlações
diretas entre o tempo gasto nas redes sociais e sintomas de ansiedade e depressão. Por
outro lado, ao deparar-se com a impossibilidade de estar conectado à rede, os
participantes apresentaram sintomas negativos, como ansiedade, tédio e irritabilidade.
Isso demonstra que talvez o uso das mídias sociais esteja causando certa dependência,
e seus prejuízos estão mais relacionados à sua falta. [13]
Contrariamente, uma outra pesquisa estadunidense observou 471 estudantes
universitários com base no uso de redes sociais e constatou uma influência mínima
destas em transtornos mentais dos estudantes, com exceção de algumas atitudes
específicas. [14]
Esse trabalho utilizou a escala Likert para a maioria dos questionários, colhendo
informações sobre tempo gasto nas redes sociais, sintomas relacionados a saúde
mental, ansiedade social, entre outros. Os resultados indicaram que as mídias sociais
são pouco relacionadas à sintomas negativos, com exceção do termo “vaguebooking”
utilizado no artigo, que se refere a postagens, majoritariamente no Facebook, com
sentido vago, mas com alto teor emocional. Essa ação pode estar ligada a solidão e
pensamentos suicidas. [14]

Contudo, essa relação pode estar presente em casos de problemas mentais
preexistentes, em que a postagem é apenas uma forma de alerta. Fora isso, a pesquisa
não demonstrou efeitos negativos do tempo gasto nas redes, nem de sua importância
para cada participante. [14]
Uma análise de cluster (por agrupamento de dados) feita nos Estados Unidos
com 1730 adultos utilizou 5 variáveis ​​(tempo, frequência, uso de múltiplas plataformas,
uso problemático de mídias sociais e intensidade de mídias sociais) para identificar
padrões distintos de uso de mídias sociais. [15]
Os resultados da pesquisa mostraram dois padrões específicos mais associados
à ansiedade e depressão, sendo eles o grupo com mais tempo de uso e o grupo com
mais interesse nas redes. Os outros três grupos com padrão de uso moderado das
mídias sociais não foram associados a sintomas elevados de depressão e ansiedade.
[15]
Com relação às revisões sistemáticas, dois trabalhos foram avaliados, um deles
avaliou 16 artigos e, embora não tivesse resultados totalmente consistentes, observou
uma associação geral entre o uso das redes sociais e problemas de saúde mental. [16]
Esse trabalho também identificou outras causas potenciais de ansiedade e depressão
que estão relacionadas a internet e que precisam ser mais bem exploradas [16]


Metanálise em Adolescentes
Com relação a estudos feitos exclusivamente com o público adolescente,uma
metanálise reuniu diversos trabalhos incluindo a faixa etária de 10 a 19 anos, para
analisar o TSSM (Time Spent on Social Midia) e o risco de depressão [17]. O estudo foi
conduzido seguindo as diretrizes do PRISMA [18]. Foram reunidos então 26 estudos,
sendo 21 transversais e 5 longitudinais, totalizando 55.340 participantes. Os resultados
mostraram que os adolescentes com maior TSSM diário tiveram um aumento de 59,6%
no risco de depressão quando comparados ao grupo de referência e esse risco
aumentou 13% por cada hora de aumento no uso das redes sociais [17].
Além disso, outra revisão sistemática feita com foco nos adolescentes avaliou 13
artigos dentro dos parâmetros do PRISMA [16]. Os trabalhos estudados incluíram
diversos países como China, Austrália, Canadá, Sérvia, Espanha, Polônia, entre outros.
A faixa etária da amostra utilizada variou entre 13 e 18 anos. [19]. Os resultados dessa
revisão mostraram algumas divergências com relação aos países e estudos. Na
pesquisa australiana, por exemplo, não houve relação entre frequência do uso das redes
e estresse psicológico, diferente de outras amostras, em que a relação foi comprovada.

Desta forma, a complexidade dessa interação é grande e envolve diversos fatores, como
tempo gasto, investimento, dependência e fatores de risco. [19]
Mais um exemplo de que a relação do uso das mídias sociais e seus impactos na
saúde mental pode ser controversa é a pesquisa feita com 54 adolescentes em Londres,
Reino Unido, em 2020. Os participantes, de 11 a 18 anos, foram questionados em três
categorias, incluindo suas próprias concepções de saúde mental, suas experiências com
as redes, e o potencial das redes sociais para promoção de saúde mental. [20]
Os resultados dessa análise mostraram três interações diferentes. A primeira
delas foi uma interação positiva que os participantes relataram, por meio de uma
melhora do estado psicológico devido à redução do sentimento de isolamento, e a
melhora das relações sociais e de comunicação pelas redes. A segunda interação foi
negativa, relacionada ao uso inapropriado, gerando diminuição da autoestima e
distúrbios do sono. Por fim, a última consequência seria ainda pior, ocasionando mais
risco e afetando diretamente o estado mental dos adolescentes. É nesta que se
enquadra os casos de bullying e pensamentos suicidas. [20]
No tocante a estudos brasileiros, foi feito uma pesquisa com alunos do Ensino
Médio do Rio Grande do Sul, totalizando 513 participantes. A variável dependente deste
estudo foi o uso exagerado de redes sociais, que foi avaliada pela pergunta “quanto
tempo por dia você passa utilizando as redes sociais (Facebook, Instagram, WhatsApp,
Twitter, Snapchat ou outra) [21]
Dos 513 estudantes, 35,9% relataram uso excessivo de redes sociais (5 horas ou
mais por dia). O trabalho também avaliou variáveis como cor de pele, sexo e nível
socioeconômico. Os resultados mostraram o uso excessivo das redes como um fator de
risco para ansiedade, depressão, estresse, e suicídio, [21].
O último artigo utilizado que envolve adolescentes trata-se de uma revisão de
trabalhos incluindo metanálises, estudos de coorte, longitudinais e ecológicos. Esta
revisão estadunidense também constatou interações positivas, negativas e nulas entre o
uso da internet e seu impacto na saúde mental dos participantes. [22]
Em conclusão, a revisão mostra que cada vez mais os novos estudos mostram
menos prejuízos gerados pela internet e mais dos seus benefícios, e ainda que os dados
de efeitos negativos são pouco significantes, em sua maioria. Mas tal tema deve
continuar sendo muito explorado, já que a era digital permanecerá. [22]


Conclusão

Ao analisar os artigos que foram selecionados, foi observada influência negativa
do uso inadequado das redes sociais na saúde mental em alguns trabalhos. Entretanto,
houve alguns estudos que constataram relação neutra entre esses fatores e outros que
relataram relações positivas.
De qualquer forma, fica claro que as redes possuem pontos positivos e negativos
e que a maneira como o público escolhe utilizá-las está diretamente relacionado a seus
efeitos psicológicos. Ainda, pode-se perceber a necessidade de mais estudos que
avaliem profundamente essa interação que se torna cada vez mais prevalente no mundo
contemporâneo.

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1- Clara Renata M. de Oliveira – Graduanda – Dep Medicina – UNITAU;
2- Lucas P. G. de Faria – Graduanda – Dep Medicina – UNITAU,
3- Matteo Celano – Residente Psiquiatria IPQ- USP ;
4- Prof. Dra. Márcia Gonçalves – Professora Titular de Psiquiatria e
Psicopatologia – UNITAU

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