Julho de 2023 – Vol. 28 – Nº 7

Publicação de 2022
Ministério da Cidadania Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Ministério da
Saúde Ministério da Infraestrutura Ministério da Justiça e Segurança Pública

Redação:
Angela Vidal Gandra da Silva Martins
Carlos Adriano Ferraz
Daniel Celestino de Freitas Pereira
Daniel Mariz Tavares
Elis Viviane Hoffmann
Everaldo Valenga Alves
Frederico de Moura Carneiro
Gustavo Camilo Baptista
Joelle Karkour
Julio Cesar Cardozo de Lima
Lucas Barros Baptista de Toledo Ribeiro
Luciano Almeida Santos
Luiz Felipe Custódio Francisção
Quirino Cordeiro Junior
Rafael Bernardon Ribeiro
Susy dos Santos Gomes de Araújo
Prefácio
É sabido que o uso de drogas na atualidade é uma preocupação mundial, sendo a maconha a
substância ilícita mais utilizada no Brasil e no mundo. Conforme relatado na literatura médica,
o uso de maconha, além da dependência química, está relacionado com o desenvolvimento de
uma série de transtornos mentais, tais como esquizofrenia, transtornos psicóticos, depressão,
quadros ansiosos, comprometimento cognitivo e suicídio. Além disso, a atuação da droga no
sistema nervoso central pode induzir alterações da percepção do tempo, interferência na
atenção, alteração nas funções sensoriais, prejuízo na memória, entre outros efeitos. Cite-se
que os prejuízos diretamente decorrentes do uso de drogas ultrapassam a esfera do indivíduo,
atingindo toda sua família e o entorno, e impactando, por fim, toda a coletividade.
Recentemente, o uso terapêutico da maconha voltou a ser tema de discussão no Brasil,
baseado em informação científica de baixa qualidade e, sobretudo, em interesses financeiros
de determinados grupos que pretendem estabelecer o negócio da maconha no país. Além
disso, esses movimentos têm apoio de grupos ideológicos, que têm na legalização das drogas
sua irresponsável plataforma política. Na área científica, excetuando-se o uso bastante restrito

da substância canabidiol (CBD), ainda não há estudos consistentes que comprovem a eficácia e
a segurança de outros produtos derivados da maconha para uso clínico. Verifica-se, ainda,
outros movimentos que visam à flexibilização das normas de controle sobre a maconha,
destacando-se propostas apresentadas para deliberação da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) e ação em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF) – RE 635659 – que
busca a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal. Não bastante, há ainda em
trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei 399/2015, que propõe a autorização do plantio
em larga escala da maconha e sua comercialização em todo o território nacional. De maneira
completamente absurda e inconsequente, o PL 399/2015 busca a criação do marco regulatório
da maconha no país. Contudo, apesar das referidas iniciativas, constata-se claramente a
posição majoritária da população brasileira contra a legalização das drogas, incluindo
obviamente a maconha, o que está corroborado pela mobilização que culminou na “Marcha
das Famílias Contra as Drogas”, realizada em 2019, quando o STF colocou em pauta o
julgamento da descriminalização das drogas no Brasil. Por isso, o governo federal, em
cumprimento à nova Política Nacional sobre Drogas (PNAD) e aos anseios da sociedade
brasileira, tem atuado em diversas frentes, procurando esclarecer sobre o tema da maconha e
alertando quanto às danosas estratégias de flexibilização do controle sobre essa droga, que
têm sido direcionadas passo a passo rumo à legalização da maconha no Brasil. Notadamente,
percebe-se este tipo de estratégia em diversos países que facilitaram de alguma maneira o
acesso da população à maconha. Nesses países, a flexibilização tem causado efeitos adversos
relacionados à maconha, tais como aumento do narcotráfico, da violência, do
encarceramento, de acidentes de trânsito, de transtornos mentais, de hospitalizações
psiquiátricas e de intoxicações não intencionais de crianças pelo uso inadvertido da droga.
Ainda no âmbito internacional, o Brasil tem apresentado sua posição contrária à redução do
controle sobre a maconha perante a Comissão de Narcóticos (CND) da Organização das Nações
Unidas (ONU). As diversas ações que buscam a flexibilização sobre o controle da maconha têm
causado o desastroso efeito de diminuição da percepção de risco da população sobre os graves
malefícios que a maconha causa a seus usuários, suas famílias e todo o conjunto social,
afetando principalmente as camadas mais vulneráveis das sociedades. A redução do controle
sobre a maconha no Brasil aumentaria, sem dúvida alguma, os graves problemas relacionados
às drogas, que vêm assolando de maneira importante o país nos últimos tempos. Vale ainda
ressaltar que a Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes (JIFE) da ONU expôs sua
preocupação quanto ao pretenso uso medicinal da maconha e substâncias relacionadas, no
documento “Report of the International Narcotics Control Board for 2018” (Relatório do
Conselho Internacional de Controle de Narcóticos para 2018). A estratégia de tentar vender a
maconha como tendo efeito medicinal tem sido usada, segundo a JIFE, em vários países rumo
à legalização dessa droga para fins entorpecentes. Importante notar ainda que, não obstante
haver indicação apenas para o uso compassivo e em situações específicas, a utilização de
medicamentos à base de maconha já está devidamente regulamentada no Brasil, por meio das
Resoluções da Anvisa RDC nº 327/2019 e RDC nº 335/2020. Desse modo, é fundamental que
toda a sociedade brasileira esteja adequadamente informada e atualizada sobre a temática da
maconha. É importante reiterar que o governo federal tem posição firme contrária às drogas,
estando em plena sintonia 8 com a sociedade brasileira. Proteger crianças, adolescentes e toda
a população contra os danos da maconha e de outras drogas é ação de inquestionável
relevância e ponto de honra para o governo federal, o que resta demonstrado pela presente
cartilha, que alerta para os graves prejuízos individuais e sociais diretamente decorrentes do
uso da maconha. Vale ressaltar que o presente documento apresenta os mais variados e
graves problemas relacionados à maconha, tomando como base evidências científicas sobre o

tema. Assim, o governo federal, por meio do Ministério da Cidadania, Ministério da Justiça e
Segurança Pública, Ministério da Saúde, Ministério da Infraestrutura, e Ministério da Mulher,
da Família e dos Direitos Humanos deseja boa leitura a todos e solicita ajuda na divulgação
desse material para que toda a sociedade brasileira possa se conscientizar cada vez mais sobre
os graves malefícios da maconha.
Quirino Cordeiro Secretário Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas Ministério da
Cidadania
Esta cartilha deseja corresponder ao clamor das famílias, que desde os primeiros momentos de
existência desta secretaria, solicitaram a nós um cuidado especial para impedir o acesso das
drogas aos lares e o desencadeamento de suas tristes consequências: dependência, evasão
escolar, destruição dos laços familiares, danos à saúde, suicídio, pobreza e risco de morte.
Como vemos que falta ainda uma boa informação para orientar as famílias sobre a gravidade
do uso recreativo, apresentado como inofensivo, bem como sobre a eficácia do uso
terapêutico, vimos muito oportuno publicar material técnico que possa auxiliar seu
discernimento e ajudar também outras famílias. Não desejamos que, em nome da liberdade,
abram-se as portas para a escravidão e para a manipulação. Apostamos, sim, em horizontes
mais elevados para o futuro de nossa Nação.
Ângela Gandra Secretária Nacional da Família Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos 9
O futuro da nação, diante da expansão da venda e consumo de drogas e dos riscos inerentes,
conforme demonstrado nesta cartilha, exige de cada um de nós o trato desta questão sem
passionalidade, e sim com muita discussão, reflexão e, principalmente, responsabilidade pelo
desafio que representa. A nossa missão é informar e conscientizar sobre os riscos e efeitos à
saúde do uso de drogas, especialmente a maconha, pelo público infanto-juvenil, não somente
para a comunidade médica, mas também para pais, educadores, gestores e o público em geral.
A doutrina da proteção integral, fundante dos nossos marcos normativos de proteção da
infância, possui, como um dos seus pilares, o princípio de que crianças e adolescentes estão
em especial e peculiar condição de desenvolvimento, devendo, portanto, receber a proteção
biopsicossocial que garanta o seu florescimento rumo à plenitude de vida, da qual o contato
com as drogas certamente os privaria. A Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos tem a expectativa de
que esta cartilha possa ser uma fonte de informação, reflexão e conscientização. Além disso,
queremos informar, sensibilizar, mobilizar e convocar toda a sociedade a participar dessa
causa em defesa da proteção dos direitos de crianças e adolescentes, manifestando o princípio
constitucional expresso de que criança e adolescente, incluindo o seu cuidado e proteção, são
prioridade absoluta.
Maurício Cunha Secretário Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente Ministério da
Mulher, da Família e dos Direitos Humanos
A presente cartilha compila ações de excelência concebidas, desenvolvidas e operacionalizadas
pelo Ministério da Cidadania, a partir da atuação e enfrentamento da Secretaria Nacional de
Cuidados e Prevenção às Drogas. A obra não apenas encoraja e fomenta a replicação de boas
práticas, como enaltece e apresenta resultados positivos das políticas públicas dos demais
Ministérios e Secretarias do Governo Federal, em cumprimento à Política Nacional sobre
Drogas, no que tange à prevenção e combate ao uso da Maconha. Ciente de que a
problemática da dependência química, independentemente da droga, é sempre uma violação

da vida e da liberdade, apresento, pois, a obra, com a finalidade de educar e esclarecer os
jovens quanto aos fundamentos de nossas políticas públicas para a juventude. Neste sentido, a
Secretaria Nacional da Juventude, marcadamente por estar ciente das mazelas causadas pela
drogadição da Juventude e cumprindo sua missão de orientar e, sempre atenta ao clamor dos
jovens, alerta a sociedade para a preocupante diminuição da percepção dos riscos da
maconha, em face do aumento do consumo entre os jovens.
Luiz Felipe Custódio Francisção Secretária Nacional da Juventude Ministério da Mulher, da
Família e dos Direitos Humanos
O consumo de substâncias psicoativas é um fenômeno que acompanha a humanidade desde o
alvorecer da civilização, seja no contexto de rituais religiosos, seja com a expectativa
terapêutica ou por um caráter puramente hedonista. Estas variadas substâncias têm a
capacidade de proporcionar algum tipo de prazer ou gratificação, seja por estimular, excitar,
alterar as percepções dos sentidos, ampliar as percepções do mundo, induzir euforia ou calma.
Contudo, cobram um preço ao indivíduo e à sociedade. E não é diferente com a maconha.
Infelizmente observamos nos últimos anos campanhas que buscam induzir as pessoas –
especialmente os jovens – ao erro de julgamento e a uma falsa percepção de segurança. A
droga é apresentada como uma “erva natural”, ou uma espécie de remédio fitoterápico com
aplicações as mais diversas possíveis, uma panaceia! A realidade é que o uso de maconha tem
consequências importantíssimas, especialmente quando usada antes da maturidade cerebral,
na adolescência: pode desencadear síndromes ansiosas e quadros psicóticos. E estes quadros
podem se perpetuar, a despeito da interrupção de uso. Plantas híbridas cada vez mais fortes
em teor de THC, extratos concentrados e vaporizadores aumentam em muito o risco, se
compararmos com a maconha dos anos 1960. Os dependentes podem apresentar prejuízos ao
intelecto e lentificação global (síndrome amotivacional). Além do risco para esquizofrenia, há
também risco de aumento de acidentes com pessoas dirigindo sob efeito da droga. Portanto,
não se trata de uma substância natural e sem riscos. Há grandes interesses comerciais por trás
da política de diminuir a percepção de risco da população. Importante diferenciar o uso
recreativo do estudo e uso de alguns dos canabinoides presentes na maconha em
determinadas doenças, quando passam nos testes clínicos e apresentam evidências de
eficácia, segurança e efetividade. Assim é o caso do canabidiol e epilepsias refratárias em
crianças. Ao escolher um fármaco, o médico precisa ter segurança da sua procedência, para
que as características farmacológicas não variem de um frasco para outro, como acontece com
a planta natural, em preparados não farmacêuticos, ou na forma fumada. Além da questão da
evidência, também faz parte do racional comparar custos e efeitos das drogas disponíveis que
tratam o mesmo problema, sempre buscando a melhor opção para o paciente. Maconha
fumada jamais será remédio! A atual publicação traz informações fundamentais para a
população geral. Contudo, é importante destacar o papel basilar dos formadores de opinião,
em especial dos educadores, para a difusão destas verdades. A maconha não é um remédio.
Não é inofensiva. Ela altera a formação do cérebro de jovens, aumenta o risco de doença
mental incurável e prejudica os vínculos familiares. Certamente, reduzir a percepção do mal
que a maconha faz servirá para aumentar seu consumo e consequentemente seus danos à
família e à sociedade. Já vimos isso ocorrer no início da venda do tabaco: o cigarro era visto
como charmoso, inofensivo e até recomendado para gestantes como método de melhorar o
enjoo. O final já sabemos. Não precisamos de uma nova indústria bilionária, assediando
crianças com maconha com cores e sabores diferentes. Precisamos aprender com o erro alheio
e não cair na mesma vala que os países que legalizaram seu consumo caíram. O Ministério da
Saúde através da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, referenda a atual publicação e

mantém o esforço contínuo, para passar informações verdadeiras e que auxiliem as famílias
perante essa realidade que nos é imposta. Certos de que a articulação dos diferentes
ministérios que trabalharam neste conteúdo, trará nova força e acesso a informações
relevantes, com intuito de reduzir o consumo de maconha e auxiliar o fortalecimento dos
vínculos familiares, enviamos nosso agradecimento a todos que auxiliarem na divulgação desta
cartilha.
Raphael Câmara Medeiros Parente. Secretário de Atenção Primária à Saúde Ministério da
Saúde.
No mundo, cerca de 1,3 milhão de pessoas perdem a vida em decorrência de acdentes de
trânsito a cada ano. No Brasil, as estatísticas oficiais mais recentes apontam para algo em
torno de 32 mil mortes nas ruas, avenidas e rodovias brasileiras. Estudos 12 revelam que a
causa de expressiva parcela desses sinistros está associada ao uso de álcool e drogas,
principalmente por condutores de veículos automotores, mas também por pedestres e
ciclistas, muitos deles jovens e adolescentes. Nesse contexto, a presente cartilha se mostra
como importante instrumento de política pública de prevenção ao uso de drogas, em
particular a maconha. Ao contrário do que equivocadamente alguns dizem, essa droga não
tem nada de leve e traz inúmeros prejuízos à infância e à juventude. Como bem tratam as
páginas seguintes, a maconha afeta o convívio social e familiar, compromete o processo de
aprendizagem e contribui para a evasão escolar. Além disso, costuma ser a “porta de entrada”
para drogas mais nocivas e letais e, ainda, por ser uma droga ilícita, a maconha está associada
a diversos crimes. No trânsito, o uso dessa droga prejudica consideravelmente a atenção, os
reflexos e o tempo de reação de condutores, pedestres e ciclistas, colocando em risco as suas
próprias vidas, bem como a de outros usuários das vias. Por isso, a associação droga e direção
configura infração e crime de trânsito. Assim, toda iniciativa para coibir o uso de maconha,
principalmente associada ao trânsito, deve ser apoiada e valorizada. Assim como o barro deve
ser moldado enquanto está molhado, devemos conscientizar desde cedo as crianças, os
adolescentes e os jovens sobre os riscos e prejuízos causados pelo uso da maconha. E que essa
turminha possa atuar como polinizadores de hábitos e práticas mais saudáveis e mais seguras
perante seus pais e familiares.
Frederico de Moura Carneiro. Secretário Nacional de Trânsito Ministério da Infraestrutura
Em diversos momentos históricos, surgiram movimentos que propuseram ora a legalização,
ora o incentivo ao uso de determinadas drogas como solução para os mais diversos problemas
públicos. No início do Século XX, com a descoberta e difusão do método de refino da folha de
coca, a cocaína passou não apenas a ser fabricada em grande escala, mas também indicada em
receitas médicas como remédio para diversos tipos de problemas de saúde (tais como
hipocondria, histeria, neurastenia, depressão, dores e até mesmo dependência de drogas). No
decurso da Segunda Grande Guerra, a metanfetamina tornou-se uma parte essencial da
estratégia militar nazista. No caso, as lideranças militares promoveram ampla distribuição
dessa droga para os seus soldados, de modo a dotá-los de melhores condições de combate.
Alguns anos 13 depois, já na década de 1950, um movimento semelhante ocorreu em
determinadas universidades ocidentais, quando alguns professores descobriram as
propriedades do LSD em causar alucinações e passaram a incentivar seu uso como uma
“terapia” para diversos problemas psiquiátricos. Enfim, há exemplos robustos de movimentos
permissivos ao uso de drogas nas mais diversas sociedades e períodos históricos recentes.
Entretanto, a própria História demonstra que o entusiasmo inicial provocado pelos supostos
benefícios do uso dessas substâncias é rapidamente substituído por frustrações e

consequências deletérias à saúde do usuário e ao bem-estar familiar, comunitário e social. Ou
seja, novos e graves problemas públicos surgiam com frequência e intensidade. Isso ocorria
porque os supostos benefícios não eram devidamente verificados, discutidos e considerados a
contento e com a responsabilidade e perspectiva demandadas pelo assunto. Uma das maiores
ilusões colocadas pela nova geração desses movimentos é a de que a legalização da maconha
acabaria com os mercados ilícitos (e, consequentemente, com o tráfico de drogas, com o crime
e com a violência). Tal argumento é posto, primeiro, como se não houvesse crime e violência
no contrabando e no comércio não autorizado de drogas lícitas (tais como o cigarro e o álcool)
e, segundo, como se as organizações criminosas envolvidas com o narcotráfico não estivessem
envolvidas com outros tipos de crimes (tráfico de armas e pessoas; lavagem de dinheiro; roubo
a bancos; fraudes; dentre outros ilícitos). Nesse contexto, esta publicação é especialmente
relevante e oportuna. Não há dúvidas de que é necessário informar à sociedade sobre os
acentuados riscos que estão presentes nessa questão e no debate sobre a legalização do uso
da maconha, principalmente no que tange à segurança pública do país.
Paulo Gustavo Maiurino. Secretário Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos
Ministério da Justiça e Segurança Pública 14
A Droga da maconha
Introdução
O uso de drogas na atualidade é uma preocupação global. O Relatório Mundial sobre Drogas,
publicado em 2021 pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) (ONU,
2021), aponta que 275 milhões de pessoas usaram drogas no ano de 2019, e destes, estima-se
que aproximadamente 36,3 milhões (quase 13% da população mundial) sofram de transtornos
por uso de drogas. Isso corresponde a uma prevalência global de 0,7% para transtornos por
uso de drogas, entre a população com idade entre 15–64 anos, e um aumento destes
transtornos em 18% quando comparado ao ano de 2016, sendo este dado o recorte de apenas
uma das consequências do problema. Tal condição extrapola as questões individuais e se
constitui como um grave problema de saúde pública, com reflexos nos diversos segmentos da
sociedade. Os serviços de segurança pública, educação, saúde, sistema de justiça, assistência
social, dentre outros, e os espaços familiares e sociais são repetidamente afetados, direta ou
indiretamente, pelos desdobramentos e consequências do uso das drogas. Popularmente
conhecida como maconha, a Cannabis sativa, um arbusto da família das Moraceae, é a droga
ilícita mais usada mundialmente (Ribeiro et al., 2005). O Relatório da UNODC (ONU, 2021),
previamente citado, aponta um aumento de usuários de maconha em 18% entre os anos de
2010 e 2019, e que no ano de 2019, havia cerca de 200 milhões de usuários de maconha no
mundo. Este número corresponde a 4% da população global com idade entre 15–64 anos. No
Brasil, segundo o último Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD), realizado em
2012, 6,8% da população adulta e 4,3% da população adolescente declararam já ter feito uso
dessa substância, ao menos, uma vez na vida. O consumo nos últimos 12 meses, foi relatado
por 2,5% na população adulta e 3,4% entre adolescentes, sendo que, 62% deste público referiu
a experimentação antes dos 18 anos (Laranjeira et al., 2014). As Nações Unidas consideram
que os dados oficiais da América Latina possam estar subestimados, uma vez que o volume de
maconha apreendido no Brasil está entre os maiores do mundo e o país não é um grande
fornecedor para nenhuma região. O número de usuários é significativo, com mais de 1,5
milhões de brasileiros consumindo maconha diariamente, sendo a percentagem de
dependentes de maconha entre esses usuários, a mesma encontrada em países com maior
prevalência de uso (Laranjeira et al., 2014). Há robustas evidências na literatura científica

atual, de que o início precoce, a frequência de uso, e mesmo o consumo eventual da maconha
estão relacionados com maior probabilidade de uso crônico, uso abusivo e dependência, além
de enormes prejuízos econômicos, sociais, e à saúde física e mental, não se tratando de uma
droga inofensiva. Um recente estudo brasileiro com objetivo de fornecer taxas de uso e
dependência de maconha, além dos fatores de risco, revelou forte associação entre idade de
início 16 do uso de maconha e a dependência, ou seja, quanto mais precoce o início, maior o
risco de causar a dependência química desta substância. Isso mostra a importância de
intervenções de prevenção primária, priorizando o adiamento ou evitando a experimentação
de maconha, e levantam o debate sobre políticas e legislação sobre drogas, reforçando assim a
necessidade de restrições mais fortes ao acesso de adolescentes às drogas e a garantia de sua
aplicação (Madruga et al., 2021). Essas descobertas destacam os grandes riscos do uso de
maconha, que são altamente relevantes à medida que o interesse médico, social e político
pelos componentes da maconha, conhecido como canabinóides, continua a crescer. Estas
evidências serão apresentadas em detalhes nesta cartilha. 17
Prejuízos à saúde
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (APA, 2013), em sua 5ª
edição (DSM-5), o diagnóstico de transtorno por uso de maconha, inclui um grupo de sintomas
e critérios de diagnóstico para dependência –, como tolerância, abstinência, desejo e esforços
persistentes ou malsucedidos para reduzir ou controlar o uso desta droga. Visto esta
classificação e critérios específicos, o consumo de maconha pode levar ao desenvolvimento de
dependência química, assim como a outras doenças mentais e físicas, como será explanado a
seguir.
Transtornos mentais.
O transtorno por uso de maconha é responsável por uma proporção substancial de pessoas
que procuram tratamento para transtornos por uso de drogas, devido à alta prevalência global
do seu consumo (Connor et al., 2021). Ele afeta aproximadamente 10% dos 193 milhões de
usuários de maconha em todo o mundo, e costuma ser complicado por comorbidades de
saúde mental e outros transtornos por uso de substâncias psicoativas. A dependência de
maconha está entre as dependências de drogas ilícitas mais comuns, mostrando que a cada
dez pessoas que usaram maconha na vida, uma se torna dependente em algum momento
(Ribeiro et al., 2005; Fergusson e Horwood, 2000). Segundo o último LENAD, quase 40% dos
adultos e 10% dos adolescentes usuários de maconha são dependentes, sendo mais de 1% da
população masculina brasileira, dependente desta droga (Laranjeira et al., 2014). 18 Qualquer
substância com potencial de causar dependência pode apresentar danos decorrentes do uso
crônico, e as consequências do consumo de maconha costumam ir para além do usuário,
atingindo também a família, os amigos e a sociedade como um todo. Os efeitos adversos do
uso de maconha para a saúde são bastante reconhecidos pela comunidade médica e
corroborados pela literatura científica, sendo o desenvolvimento de transtornos mentais um
dos mais estudados. Estudos epidemiológicos fornecem evidências fortes o suficiente para
garantir uma mensagem de saúde pública, de que o uso de maconha aumenta o risco de
transtornos psicóticos, o desenvolvimento de esquizofrenia e traços de personalidade
esquizotípicos, quadros maníacos (não apenas em pacientes com diagnóstico de transtorno
bipolar do humor), ansiedade, depressão, e comportamento suicida (Walsh et al., 2017; Moore
et al., 2007; Lagerberg et al., 2014; Davis et al., 2013; Tijssen et al., 2010; Gibbs et al., 2015;
Patton et al., 2002; Gobbi et al., 2019; Leite et al., 2015; Hjorthøj et al., 2021; Bechtold et al.,
2016; Yücel et al., 2016; Hindley et al., 2020; Livne et al., 2022; Di Forti et al., 2019; Kuhl et al.,

2016; Ganesh et al., 2020; Tikka e D´Souza, 2019; Radhakrishnan et al., 2014; Wilkinson et al.,
2014; Pope et al., 2021; Johnson et al., 2021). Revisão sistemática da literatura e meta-análise
(Hindley et al., 2020) com estudos entre 1946 e 2019, analisou o potencial para o aumento do
uso de maconha e assim, entender melhor os seus riscos. Os resultados mostraram que uma
única administração é capaz de induzir sintomas psicóticos e outros sintomas psiquiátricos em
grandes proporções. Estudos revelam que há um componente genético que favorece o
aparecimento de esquizofrenia e que também favoreceria o uso de maconha, demonstrando
uma relação estreita entre esses dois fenômenos, e ampliando assim a discussão sobre os
possíveis mecanismos causais comuns relacionados à genética da esquizofrenia (ou outros
quadros psicóticos) e do uso de maconha (Ganesh e D’Souza, 2022; Gillespie e Kendler, 2021;
Johnson et al., 2021). Além disso, estudo longitudinal realizado com grande amostra
populacional da Finlândia revelou que o uso de maconha na adolescência pode aumentar o
risco de automutilação, independentemente da psicopatologia do usuário e do uso de outras
substâncias. (Alexander et al., 2021). O uso crônico de maconha também tem sido associado a
uma série de deficiências cognitivas, como diminuição de atenção, memória e atividades
responsáveis pelo planejamento e execução de tarefas (Carey et al., 2015; Auer et al., 2016;
Gruber et al., 2012; Oliveira et al., 2020), levando a uma deterioração desses domínios
cognitivos, e prejudicando a percepção da realidade e de tomada de decisões. Além disso, leva
a uma disfunção de desempenho associado à aprendizagem, que impede o reconhecimento
das consequências negativas do uso da droga (Carey et al., 2015), e leva ao declínio de até 8
pontos no QI (quociente intelectual) – fator que mede a inteligência com base em resultados
de testes específicos (Madeline et al., 2012; Jackson et al., 2016). Iniciar o consumo de
maconha na infância ou adolescência acelera a perda de memória. Dados sugerem que
adolescentes que usam maconha algumas vezes por semana, durante dois a três anos,
desenvolvem problemas de memória semelhantes aos relatados em usuários adultos, que
começaram na idade adulta, e têm consumido a droga regularmente por pelo menos 20 anos
(Solowij et al., 2011). O início precoce do consumo de maconha pode levar ao agravamento
dos prejuízos em todos os domínios do funcionamento cerebral. As evidências científicas
trazem que a exposição ao longo da vida do uso de maconha tem uma forte associação com a
deterioração do desempenho no nível comportamental destes usuários (Kroon et al., 2019), e
que para aqueles com início durante a adolescência, a cessação do uso de maconha não
restaurou totalmente o funcionamento neuropsicológico (Meirr et al., 2012; Broyd et al.,
2015). Em uma revisão sistemática da literatura, pesquisadores da Austrália descobriram que
mesmo após 12 a 24 horas de abstinência, usuários de maconha tiveram desempenho ruim em
tarefas que avaliaram o aprendizado verbal e a memória. Embora várias semanas de
abstinência possam levar a alguma recuperação da função cognitiva, 20 estudos de imagem
sugerem que o uso pesado* de maconha está associado a mudanças mais duradouras na
função e estrutura do cérebro (Broyd et al., 2015). Para além de todo esse impacto negativo
do uso de maconha à saúde mental, este consumo dificulta a adesão ao tratamento e aumenta
o número de hospitalizações (Zammit et al., 2008)1.
Doenças Físicas
Para além dos efeitos neurotóxicos, as doenças físicas resultantes do consumo de maconha
vêm sendo alvo de estudos, há mais de duas décadas. A maconha fumada tem um alto
potencial cancerígeno e está relacionado à baixa resistência imunológica a infecções (Hall e
Solowij, 1998; Boutaleb et al., 2021). Seu consumo está associado ao aumento de sintomas de
bronquite crônica, asma, enfisema, e infecções respiratórias, entre outras alterações nos
diferentes sistemas orgânicos (Bui, Simpson e Nordstrom, 2015; Mozaffarian et al., 2016),

sendo até mais graves do que aquelas decorrentes do uso de cigarro de tabaco (BLF, 2012).
Para além das doenças respiratórias, o uso de maconha é um possível fator de risco para o
desenvolvimento de pancreatite aguda (Barkin et al., 2017) – ocorrendo principalmente em
pacientes jovens com idade inferior a 35 anos -, além de sintomas cardiovasculares e
gastrointestinais (Monte et al., 2019), estando significativamente associado a um risco
aumentado de mortalidade por doença cardiovascular, especialmente entre aqueles que
iniciaram o seu uso antes dos 18 anos de idade (Sun et al., 2020). Recentes estudos, que
trazem novos dados sobre a associação do uso de maconha ao desenvolvimento 1 Uso pesado:
refere-se a pessoas que usam maconha pelo menos três vezes por semana e geralmente
durante anos. 21 de doenças, mostram que os componentes da maconha são capazes de
induzir alterações no material genético, causando cânceres e doenças hereditárias (Reece e
Hulse, 2021), inclusive em crianças (Reece e Hulse, 2021). O uso regular de maconha durante a
adolescência e nos anos adultos emergentes resulta em consequências significativas durante o
período de desenvolvimento neurológico (Madeline et al., 2012). É necessário enfatizar que o
consumo regular de maconha não é inofensivo, tampouco seguro, e resulta em danos
irreversíveis à saúde física e mental.
Riscos da exposição pré-natal à maconha
O aumento das concentrações de tetrahidrocanabinol (THC) na maconha atual levou
investigadores a investigar os mecanismos da exposição pré-natal a esta droga. Diversos
estudos vêm trazendo importantes dados que constatam que o consumo de maconha durante
a gestação prejudica o desenvolvimento do feto, e pode ser a causa de diversas doenças,
indicando, inclusive, que este uso deixa quantidades significativas no leite materno, com
potencial de impacto negativo na ação da amamentação (Wymore et al., 2021). O uso de
maconha durante a gestação aumentou entre 5 a 37 vezes as condições de desenvolvimento
fetal anormal, como defeito do septo atrial, espinha bífida, microcefalia, síndrome de Down,
defeito do septo ventricular e persistência do canal arterial, defeitos cardiovasculares,
geniturinários, respiratórios, cromossômicos e musculoesqueléticos. Estes dados foram
estatística e robustamente significantes (Reece e Hulse, 2019). 22 Além disso, a leucemia
linfoide aguda – tipo de câncer mais comum na infância – vem apresentando aumento de
incidência em muitos países. Estudo recente revelou forte associação do consumo de maconha
durante a gestação e este tipo de leucemia, sendo o efeito da maconha o mais forte entre
todas as drogas investigadas, e independente de outros fatores (Reece e Hulse, 2021).
Alterações no Cérebro
O uso de maconha está associado a relevantes alterações neuro anatômicas, ou seja, na
estrutura e na organização do cérebro. Evidências robustas na literatura científica de que estas
alterações são danosas à saúde vêm crescendo devido às novas tecnologias que tornaram
possíveis os exames de neuroimagem. Diversos destes estudos corroboram com o fato de que
há importantes alterações no cérebro dos usuários de maconha. Publicado recentemente em
revista internacional renomada, um desses estudo investigou as ligações entre o uso de
maconha e o desenvolvimento do cérebro de 799 adolescentes através de ressonância
magnética – exames de imagem cerebral –, durante 5 anos (dos 14 aos 19 anos de idade), e os
resultados revelaram que o consumo de maconha entre esses adolescentes está associado
com acelerado afinamento cortical em regiões pré-frontais do cérebro – áreas responsáveis
pelo controle das emoções positivas e negativas, e associadas a áreas com riscos maiores de
depressão, problemas de atenção e até ideação suicida. Os exames mostraram ainda que as
mudanças cerebrais não começaram antes do início do uso da droga, corroborando com o fato

de que a maconha é prejudicial para um cérebro que ainda está em desenvolvimento (Albaugh
et al., 2021). Para além disso, o uso precoce parece afetar a organização da substância branca
no cérebro, o que facilita a comunicação entre as regiões do cérebro e as conexões neurais.
Essas mudanças estão relacionadas a níveis mais elevados de impulsividade (Gruber et al.,
2011). Pesquisadores revelam que para além destas alterações, a maconha tem um alto
potencial de risco para o vício, e consequentemente à dependência, podendo evoluir para
quadros graves e de difícil recuperação (Filbey et al., 2016), e sugerem que o uso frequente de
maconha está associado a mudanças duradouras na função e estrutura do cérebro (Broyd et
al., 2016). 23
O perigo da maconha dita “medicinal”
No que diz respeito ao uso da maconha dita “medicinal”, é importante salientar que o uso
terapêutico dos componentes da maconha ainda é extremamente restrito, contando com
pouquíssimas evidências científicas. Como previamente mencionado, das centenas de
moléculas encontradas na maconha, o canabidiol (CBD) é o único que vem apresentando
potencial uso terapêutico, porém em condições clínicas muito específicas. O Conselho Federal
de Medicina (CFM) deixa claro a escassez de estudos que sustentam o uso terapêutico do
canabidiol (CFM, 2014). Por conta disso, liberou no Brasil apenas “o uso compassivo do
canabidiol como terapêutica médica, exclusiva para o tratamento de epilepsias na infância e
adolescência refratárias às terapias convencionais” (CFM e ABP, 2019b). Esse mesmo
Conselho, em parceria com a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) publicaram o “Decálogo
sobre a Maconha” (CFM e ABP, 2019a), reforçando a presença de ações danosas do uso da
maconha sobre a saúde de seus usuários, bem como a escassez de evidências científicas para o
uso terapêutico de seus compostos. Além disso, outras entidades médicas, como os Conselhos
estaduais de medicina, a Academia Nacional de Neurologia (ABN) e a Sociedade Brasileira de
Pediatria 24 (SBP), também apresentam posições bastante reservadas sobre o uso terapêutico
dos compostos da maconha (Cremesp, 2016; SBP e ABP, 2017). Ademais, fica ainda bastante
clara a posição do Conselho Federal de Medicina (CFM) de que não se deve falar em “maconha
medicinal”, já que não há qualquer evidência científica sobre atividades terapêuticas da
maconha bruta. Conforme estudo publicado no ano de 2016 (Kim e Monte, 2016), houve um
aumento do uso de maconha como droga entorpecente, após a flexibilização do seu controle
nos Estados Unidos para o uso da maconha dita medicinal. De acordo com a pesquisa referida
acima, a prevalência do consumo de maconha entre jovens adultos do Colorado, com idades
entre 18 e 25 anos, aumentou de 35% entre 2007 e 2008 para 43% entre 2010 e 2011. O uso
terapêutico da maconha por grávidas e lactantes também é foco de preocupação nos Estados
Unidos. Em revista médica, internacionalmente renomada, foi publicado um estudo (Volkow et
al., 2019) sobre gestantes e clínicas autorizadas a prescrever e fornecer maconha medicinal. O
resultado é assustador: o número de mulheres nessas condições que usam maconha mais do
que dobrou entre os anos de 2002 e 2017. Apenas no estado do Colorado, foi constatado
(Dickson et al., 2018) que 70% dos estabelecimentos regulamentados pelo Governo local para
venda de maconha e produtos derivados de maconha recomendam o uso de maconha
medicinal para evitar os enjoos durante a gravidez. O uso de maconha durante a gestação
pode causar atraso no desenvolvimento fetal e problemas neurológicos nos bebês (Corsi et al.,
2019), e a legalização dessa 25 droga pode trazer uma sensação de segurança a essas
mulheres, levando-as a ignorar os riscos ao bebê ao confiarem na recomendação do vendedor.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou, em 2020, por meio de
duas resoluções (Anvisa, 2019; 2020), a regulamentação para fins de fabricação, importação
(por pessoa física e jurídica), comercialização, prescrição, dispensação, monitoramento e

fiscalização de produtos derivados de maconha, devendo-se observar as restrições do CFM
para sua prescrição, como descrito acima. Assim, não se faz necessária uma legislação que
permita uso “terapêutico” de derivados de maconha. 26 Na adolescência, os índices de
dependência de maconha são maiores que nos adultos, e alcançam 10% entre os usuários
(Laranjeira et al., 2014). O consumo recente de maconha (nos 30 dias anteriores à pesquisa),
levantado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, com colaboração do Ministério da
Saúde e apoio do Ministério da Educação, na Pesquisa nacional de saúde do escolar – PeNSE,
ficou em 5,3% para os escolares de 13 a 17 anos. A variação desse indicador quanto aos grupos
de idade foi significativa, sendo de 3,4% para os escolares de 13 a 15 anos e de 8,8% para os de
16 e 17 anos. Na distinção entre os sexos dos escolares, os maiores valores desse indicador
ficaram com os meninos (5,8%) enquanto nas meninas foi de 4,8% (IBGE, 2019). Os cérebros
em desenvolvimento dos adolescentes parecem ser especialmente vulneráveis aos efeitos da
maconha a longo prazo. Pessoas que começam a usar maconha regular e pesadamente antes
dos 16 anos podem acabar usando-a com mais frequência e consumindo mais quando adultos
(Gruber et al., 2012).
Prejuízos às crianças e aos adolescentes (crianças: até 12 anos incompletos; adolescentes:
entre 12 e 18 anos)
As consequências do uso da maconha nessa faixa etária podem ser: déficits cognitivos,
alterações em funções associadas direta ou indiretamente ao córtex pré-frontal, alterações
neuropsicológicas, nomeadamente memória de curto prazo, redução 27 em funções
executivas e funções psicomotoras, bem como redução na capacidade de aprendizado (Bolla
et al., 2002; Pope et al., 1995; Solowij et al., 2022).
O envolvimento precoce com esse tipo de substância, ainda que de forma curiosa e
experimental, poderá causar danos ao desenvolvimento cognitivo e fisiológico, além de atraso
no desenvolvimento da capacidade de autocontrole dos adolescentes, tornando-os mais
suscetíveis às influências de amigos e no seu envolvimento em outros comportamentos de
risco. Estudo sobre as consequências do uso de maconha entre adolescentes (Bechtold et al.,
2016) relatou que para cada ano de uso regular de maconha, houve um aumento de 21% de
sintomas psicóticos, e as chances destes adolescentes apresentarem paranoia ou alucinações
aumentaram em 133% e 92%, respectivamente. Este efeito persistiu mesmo após um ano de
abstinência, sugerindo que o uso regular de maconha pode aumentar significativamente o
risco de um adolescente apresentar sintomas psicóticos persistentes. Relatórios recentes
mostram que cada vez menos adolescentes acreditam que o uso de maconha é prejudicial à
saúde (Meier et al., 2012), revelando um importante fator social que pode afetar o aumento
da sua utilização. Estudos demonstram também que o uso de maconha pode afetar o
desenvolvimento do cérebro e as suas funções, (Volkow et al., 2016), diminuindo a percepção
de risco sobre o uso da droga (Hurd, 2020), e desencadeando um uso cada vez mais precoce, e
em maior intensidade. Além disso, estudos demonstram que a dependência da maconha
aumentou após a legalização da droga entre os adolescentes de 12 a 17 anos, assim como
entre os adultos de 26 anos ou mais (Cerdá et al., 2020). Nos Estado Unidos, 28 por exemplo, a
taxa de prevalência de transtornos decorrentes do uso de maconha entre adolescentes
aumentou em 25% após legalização da droga (SAM, 2019). Este aumento foi relatado (Lalam et
al., 2017; Fonberg e Sinha, 2019) também em diversos outros países onde se instauraram
processos de legalização da droga, visto que o aumento da exposição é impulsionado pelo
aumento da sua disponibilidade em todos os níveis da sociedade (Volkow et al., 2016). Uma
séria questão de saúde pública que a maior disponibilidade e comercialização da maconha

trouxeram aos países que flexibilizaram o acesso à droga foi o aumento da exposição de
crianças ao fumo passivo, fácil acesso a cigarros de maconha “inacabados”, e aos produtos
comestíveis, como os doces à base de maconha. A ingestão não intencional de maconha por
crianças está bem documentada em vários estudos e relatos de casos (Richards, Smith e
Moulin, 2017). Tais ingestões têm levado a intoxicações sérias e prolongadas, resultando em
extensos períodos de hospitalização, com apresentação de quadros de hipotonia, midríase,
taquicardia e hiperventilação decorrentes da toxicidade da maconha. Outro tema que causa
bastante preocupação é o abandono escolar e os níveis de escolaridade de adolescentes.
Muitas pesquisas vêm demonstrando uma associação entre o uso precoce de maconha e baixo
nível de escolaridade (McCaffrey et al., 2010; Fergusson, Horwood e Beautrais, 2003), medidos
pelos anos de educação e evasão escolar precoce. Estes estudos apontam que há uma chance
três vezes maior de abandono da escola em adolescentes que iniciaram o uso de maconha
antes dos 15 anos (Fergusson, Horwood e Swain-Campbell, 2002), pois a droga prejudica o
desempenho geral por meio da redução da capacidade cognitiva, da vontade de estudar e de
tirar boas notas (DEA, 2020). Ademais, o consumo de maconha com início precoce também
está associado com crescentes riscos de abandono escolar sem qualificações, impedindo a
entrada em uma universidade e a obtenção de um diploma (Fergusson, Horwood e Beautrais,
2003; Schweinsburg, Brown e Tapert, 2008; Silins, Horwood e Patton, 2014). Para além disso,
há um aumento no risco de uso de outras drogas ilícitas e um maior envolvimento em crimes,
depressão e comportamentos suicidas, como já citado anteriormente (Fergusson, Horwood e
Swain-Campbell, 2002). 29 A proteção à vida e ao direito do pleno desenvolvimento físico e
psicológico sadio são condições que oportunizam à criança e ao adolescente a possibilidade de
um futuro com cidadania plena, e ao usufruto dos demais direitos concernentes à dignidade
humana. A proteção e defesa da criança e do adolescente são fins últimos e bem desejados de
interesse público, atingindo toda a vida comunitária, sendo estes colocados em grande risco
com o consumo de maconha e outras drogas. 30
Prejuízo aos jovens
O uso da maconha é comprovadamente danoso para a saúde mental do jovem, tendo também
efeitos deletérios sobre sua vida social e, por consequência, sobre a sociedade de uma
maneira mais abrangente. Ela não apenas causa dependência, comprometendo a autonomia
do usuário, como também conduz a vícios mais graves. A UNODC revelou que 83% dos
dependentes de crack e heroína começaram com a maconha. A maconha é mais prejudicial do
que o álcool, causando severos e irreversíveis danos cognitivos (Morin et al., 2019). A
flexibilização do controle sobre a maconha tem levado ao aumento do consumo da droga
entre os mais jovens, segundo estudo feito por pesquisadores da Universidade de Nova York, e
publicado em renomada revista científica (Cerdá et al., 2020). A comercialização da droga
levou à criação de novas formas de uso da maconha, expandindo sua exposição, e
aumentando drasticamente o consumo de maconha por jovens. O Relatório Mundial sobre
Drogas de 2021 da Organização das Nações Unidas (ONU) mostra que houve queda de até 40%
na percepção de risco quanto à maconha por parte de adolescentes em diversos países nos
últimos anos. O documento (ONU, 2021) cita que o declínio na percepção de risco ocorre
enquanto persistem evidências de que o uso da maconha está associado a uma variedade de
danos à saúde de seus usuários (Buckner, 2013; Johnston et al., 2016; Dzúrová et al., 2016;
Piontek et al., 2013). Os diferentes graus de associação entre percepções de risco e uso regular
de maconha poderiam ser explicados por fatores que determinam as tendências de uso, e a
sua disponibilidade, ou seja, a maior facilidade em obter a maconha. Nos Estados Unidos,
debates sobre medidas que permitem o uso da maconha dita medicinal, bem como a grande

cobertura da mídia sobre o uso médico de vários produtos derivados da maconha têm
apresentado papel importante na redução desta percepção de risco, e consequentemente, no
aumento do uso regular de maconha pelos jovens (ONU, 2019; Hall e Weier, 2017; Sarvet et
al., 2018). Pesquisa recente mostrou que jovens usuários da maconha sofrem de graves
prejuízos relativos à sua saúde mental, bem como são mais propensos a tentarem suicídio
(Gobbi et al., 2019). Assim, um estudo longitudinal de 1987 (Andréasson et al., 1987), realizado
com 50 mil pessoas ao longo de quinze anos, já revelava que jovens que fumavam maconha
aumentavam em 3,7 vezes a possibilidade de serem diagnosticados com esquizofrenia, a qual,
cabe notar, não tem cura. O que ocorre é que o consumo da maconha danifica o sistema
nervoso central, aumentando o risco de esquizofrenia, ansiedade, paranoia e depressão, além
de ideação suicida. Sem falar que seu uso provoca a síndrome amotivacional, tornando os
jovens apáticos e incapacitados para a ação. Um estudo de 2012 demonstrou que o uso da
maconha causa, inclusive, a queda de QI (quociente de inteligência) (Madeline et al., 2012).
Com efeito, os danos do uso da maconha não são apenas momentâneos, mas persistem ao
longo da vida de seus usuários, comprometendo a possibilidade de ascensão intelectual, social
e econômica. 32 Consequentemente, tais danos serão terríveis para a sociedade. Trata-se,
pois, não apenas de danos individuais, mas de danos sociais. Como foi demonstrado por
estudos longitudinais (Fergusson e Horwood, 1997; Fergusson e Boden, 2008), o uso da
maconha pelos jovens está inerentemente associado a um altíssimo risco de graves danos para
a saúde (psicoses – especialmente esquizofrenia –, depressão, problemas respiratórios etc.),
bem como importantes dificuldades sociais (usuários de maconha são mais propensos ao
fracasso educacional, a um maior prognóstico de baixa renda, a uma altíssima dependência de
políticas assistenciais do Estado, ao desemprego, a uma baixíssima satisfação com a vida, a
relações interpessoais pobres etc.). Para além, estas consequências não estão associadas
apenas a um consumo prolongado. Estudo recente mostrou que o consumo da maconha por
apenas duas vezes, já são suficientes para alterar o cérebro de adolescentes. (Orr et al., 2019).
33
Prejuízos na família Ambiente familiar saudável
A família exerce um forte impacto no comportamento dos indivíduos uma vez que transmite
crenças, valores e influencia sua forma de enxergar e construir as relações sociais e a si mesma
(Dessen e Polonia, 2007). Por isso, os pais e os representantes devem buscar transmitir valores
às crianças para que depois elas possam atuar de forma apropriada ao longo de suas vidas.
Como já descrito anteriormente, desde o ventre materno, o bebê já recebe os influxos
positivos ou negativos de seus pais, e o consumo de drogas pelos pais compromete o
crescimento e o desenvolvimento da criança, podendo ocasionar prejuízos, comportamentais
e de saúde mental, seja pelas consequências diretas da droga ou pelos efeitos indiretos do
consumo dessas substâncias na criança (Campelo et al., 2018).
Prejuízos do consumo da maconha na família
A perda da confiança e separação conjugal são algumas das consequências que o consumo de
maconha desencadeia nas famílias (Nimtz et al., 2014). E para além das separações, está a
violência. A associação entre violência doméstica, incluindo violência perpetrada por homens
contra parceiras íntimas e abuso físico e sexual de crianças por pais e outros cuidadores, e uso
de substâncias tem sido investigada e corroborada pela literatura científica (Zilberman e
Blume, 2005). Isso afeta intensamente os laços familiares. 34 O uso de maconha e outras
drogas também impacta diretamente no rendimento escolar e laboral dos membros de uma
família. Há uma perda de atenção expressiva que compromete a aprendizagem do indivíduo e

a execução de seu trabalho. Como consequência desses efeitos, tem-se a diminuição da renda
familiar. Pais e filhos deixam de trazer para dentro de casa condições melhores para sua
família, gerando consequências negativas também para sociedade como um todo (Laranjeira
et al., 2013). Importância dos vínculos familiares fortalecidos A família toda beneficia-se
quando os vínculos entre seus membros estão fortalecidos. Quando os vínculos são fortes, os
filhos ficam mais abertos para escutarem seus pais, e assim, os pais conseguem formar melhor
seus filhos e capacitá-los para a vida adulta. As famílias têm o potencial de ser a força
protetora mais poderosa na vida das crianças e dos jovens. Relacionamentos familiares
saudáveis podem impedir que crianças e adolescentes se envolvam no uso de drogas, na
delinquência e em comportamentos sexuais de risco. Famílias caracterizadas por apego seguro
e saudável, supervisão parental, disciplina eficaz e um ambiente familiar coeso e organizado,
ajudam a proteger as crianças do uso de drogas e contribuem para sua capacidade de superar
dificuldades e alcançar resultados positivos na vida. Por outro lado, famílias com relações pais-
filhos indiferentes e um ambiente doméstico caótico, aumentam o risco de crianças e jovens
iniciarem o uso de drogas ou outros comportamentos de risco (UNODC, 2009). 35 Estudo das
Universidades de Washington e de Colorado Boulder acompanhou 426 famílias de 2002 a

  1. Os resultados desta pesquisa mostram que o padrão de uso de maconha pelos pais,
    assim como seu histórico de consumo, afeta de diferentes formas a saúde dos filhos. Estes
    indicam que os filhos de pais que iniciaram o uso de maconha na adolescência eram mais
    propensos ao uso de substâncias. Filhos de pais com início de consumo na idade adulta jovem
    não apresentavam risco aumentado para o uso de substâncias, mas eram mais propensos a ter
    problemas de atenção e notas baixas na escola (Epstein et al., 2020). Todas essas questões
    destacam a importância de considerarmos o grande risco da transmissão intergeracional do
    uso de maconha, e da necessidade de abordarmos todos os aspectos familiares nos esforços
    de prevenção ao consumo de maconha e outras drogas. 36
    Prejuízos sociais e econômicos
    levando-se em consideração apenas as consequências à saúde, já existem informações
    suficientes para justificar o perigo da flexibilização do controle sobre a maconha. Porém, as
    consequências negativas do consumo da maconha vão muito além da saúde pública, estando
    ligadas também a questões importantes de segurança pública, trânsito, educação, sistema de
    justiça, assistência social, entre outros.
    Impacto no Trânsito
    A cada ano, 1,3 milhão de pessoas morrem em veículos envolvidos em acidentes em todo o
    mundo, e as taxas de mortalidade neste tipo de acidente são três vezes maiores em países de
    baixa renda, quando comparados a países de alta renda (OMS, 2018). O consumo de maconha
    tem se mostrado como um importante risco para a condução prejudicada de veículos e pelos
    acidentes de trânsito (Sewell et al., 2009). Além do álcool, a maconha é a principal droga
    detectada nos casos de acidentes fatais de veículos motorizados nos Estados Unidos (SAMHSA,
    2014). 37 Uma parte importante das evidências de que a maconha prejudica a condução de
    veículos motorizados e, consequentemente, leva a mais acidentes e mortes de veículos
    motorizados, baseiam-se em relatórios epidemiológicos. Embora o número anual de acidentes
    fatais com veículos nos Estados Unidos esteja diminuindo nos últimos anos (em parte devido à
    aplicação mais consistente dos regulamentos e altas penalidades para quem dirigir
    embriagado), o número de acidentes com veículos motorizados envolvendo testes positivos de
    THC aumentou, sendo mais recorrente nos estados americanos que legalizaram ou
    descriminalizaram o consumo de maconha (US Department of Transportation, 2021). Como

citado anteriormente, são fortes as evidências de estudos epidemiológicos e laboratoriais, que
avaliaram a natureza e extensão dos efeitos negativos do uso de maconha em uma ampla
variedade de tarefas cognitivas e motoras (Hall e Solowij, 1998). Um levantamento do Instituto
de Seguros para a Segurança na Estrada, nos Estados Unidos, apontou para o risco de se fumar
maconha e dirigir. Segundo o estudo, o número de acidentes de trânsito aumentou em 6% nos
estados americanos onde a droga foi legalizada (Monfort, 2018). No estado do Colorado, o
número de vítimas fatais no trânsito aumentou em mais de 31%, desde 2013 (SAM, 2019). No
Canadá, estudos apontam que a maconha prejudica as habilidades cognitivas e motoras
necessárias para operar um veículo motorizado e duplica o risco de envolvimento em colisões
(Beirness e Porath, 2019). Seu consumo também prejudica o desempenho em tarefas de
atenção, em especial aquelas que exigem a capacidade de monitorar e responder a mais de
uma fonte de informação por vez, e compromete a capacidade de lidar com eventos
inesperados, como por exemplo um pedestre correndo na estrada (Hartman e Heustis, 2013;
Hartman et al., 2015). 38 Recente ensaio clínico realizado para determinar a magnitude dos
efeitos negativos na condução de veículos por usuários regulares de maconha, revelou um
desempenho ruim no ato de dirigir desses usuários, quando comparado aos não-usuários. Para
além do desempenho prejudicado, dificuldades de direção específicas, como tarefas que
exigem atenção, também demostraram afetar negativamente a capacidade de dirigir. A falta
de conhecimento por parte dos usuários sobre essas deficiências na condução de veículos é
motivo de grande preocupação, uma vez que estes usuários se autoavaliaram como se
sentindo seguros para dirigir após o consumo da maconha (Marcotte et al., 2022). Deve ficar
claro, a partir dos vários estudos sobre o tema, que a condução de veículos prejudicada pelo
consumo de maconha é um problema real de saúde e segurança pública, na medida em que
resulta em uma maior probabilidade de acidentes automobilísticos. A decisão de se legalizar
uma substância como a maconha, e assim, expor a população aos seus importantes efeitos
deletérios com crescentes consequências para a saúde pública e segurança não deve ser de
forma alguma permitida.
Violência e Criminalidade
A violência é uma questão complexa e multifatorial que traz graves consequências sanitárias e
sociais (OMS, 2014), e a associação entre o uso de maconha e violência vem gerando uma
série de debates, já havendo evidências que apontam para uma associação positiva, sendo a
droga que mais coloca as pessoas em contato com o sistema de justiça criminal em nível global
(ONU, 2020). Entre 2014 a 2018, a maconha representou mais da metade das pessoas levadas
ao sistema de justiça criminal em 69 países. Uma metanálise de estudos, que examinaram a
associação do uso de maconha e violência física em uma amostra de jovens e adultos até os 30
anos de idade, demonstrou uma associação importante entre esses fenômenos, que
permaneceu significativa independente de outros fatores, como socioeconômicos e uso
concomitante de outras substâncias. O uso de maconha nessa população mostrou-se
claramente como um fator de risco para este tipo de violência (Dellazizzo et.al, 2020). Em
adolescentes, estudo com amostra de 63.196 indivíduos, buscando identificar os principais
fatores de risco associados a problemas de conduta – agressão e comportamento delinquente –
nessa população, com base em diversos fatores sociodemográficos e psicopatológicos,
apontou o uso de maconha como o fator de risco que mais se mostrou relacionado a esses
problemas (Dugré et al., 2021). 39 Diferentemente do que é esperado pelos defensores da
flexibilização sobre o controle da maconha, os estudos a respeito da violência nos países que
legalizaram a maconha apontam para um aumento no número de homicídios e criminalidade
nesses países, vinculados ao acerto de contas entre narcotraficantes, e associados a tensões

pelo controle dos pontos de venda após a redução de parte do mercado ilegal (Berenson,
2019). Além disso, há estudos reportando o aumento de outros tipos de violência (Flanagan,
2020). Muitos argumentam que a legalização reduzirá a atividade da maconha no “mercado
negro” em estados onde a maconha for legalizada. No entanto, nos Estados Unidos, a
legalização e a comercialização da maconha levaram a um aumento na atividade desse
mercado, como nunca visto anteriormente (DEA, 2020). A maconha é a droga que mais coloca
as pessoas em contato com o sistema de justiça criminal em nível global, e nos anos de 2014 a
2018, representou mais da metade daqueles trazidos para o sistema de justiça criminal,
quando comparados a outras drogas (ONU, 2021).
Desenvolvimento Pessoal e Profissional
Como consequência dos efeitos negativos na atenção, memória, aprendizagem e do abandono
escolar precoce, que levam a uma menor qualificação profissional, o uso da maconha está
associado a um desempenho acadêmico inferior e a piores perspectivas de emprego. Isso afeta
os usuários desta droga pelo resto de suas vidas. Alguns estudos têm associado o uso de
maconha a menores salários, maior chance de desemprego, comportamento criminoso, e a
menor satisfação com a vida (Fergusson e Boden, 2008; Brook et al., 2013). Em um desses
estudos, (Gruber et al., 2003), usuários de maconha de longo prazo apresentaram efeitos
negativos do consumo da droga em diversas áreas, como habilidades cognitivas, realizações
profissionais, vida social, saúde física e mental afetadas. Outros estudos também sugeriram
ligações específicas entre o uso de maconha e consequências adversas no local de trabalho,
como aumento do risco de ferimentos 40 ou acidentes (Fergusson e Boden, 2008). Um destes
estudos (Zwerling, Ryan e Orav, 1990), realizado com funcionários dos Correios norte-
americanos, demonstrou que os funcionários que testaram positivo para maconha, antes de
iniciarem no emprego, apresentavam 55% mais acidentes, 85% mais ferimentos e 75% mais
faltas no trabalho, em comparação com aqueles que testaram negativo para uso dessa droga.
Uma recente pesquisa revelou que o uso regular de maconha pode ter efeitos negativos
independentemente da idade em que a pessoa começou a usá-la. Os resultados mostraram
que os resultados na vida para usuários regulares foram piores aos 35 anos em comparação
com aqueles que não fumaram regularmente. Esses usuários de maconha eram mais
propensos a consumir álcool de forma nociva, fumar tabaco, usar outras drogas ilícitas e não
ter um relacionamento estável aos 35 anos de idade. Eles também estavam em maior risco de
depressão e menos propensos a ter um emprego remunerado (Chan et al., 2021). Estes
estudos ilustram os riscos nocivos envolvidos no uso de maconha, e enfatizam a importância
de os formuladores de políticas públicas transmitirem uma mensagem clara e forte ao público,
de que o uso de maconha é prejudicial, independentemente do momento que o indivíduo
inicia. Impactos Econômicos A legalização da maconha tem estado relacionada à perda de
produtividade no trabalho. Estudos têm revelado que os acidentes de trabalho e o
absenteísmo são maiores entre os funcionários que fumam maconha. Funcionários com teste
positivo para o uso de maconha apresentam 55% mais acidentes de trabalho, e as taxas de
absenteísmo são de 75% entre os usuários da droga (Zwerling, et al., 1990; Fergusson, D.M. e
Boden, J.M., 2008). Estudos têm mostrado também maiores taxas de acidentes de trabalho no
estado americano do Oregon, relacionados à legalização da maconha, indicando um aumento
nos custos com acidentes de trabalho, em cerca de U$ 7 a U$ 34 milhões por ano (Dong, X.,
2020). 41 O impacto econômico da implementação da legalização da maconha é bastante alto.
Os custos orçamentários para mudar o status de droga de ilegal para legal, só no estado
americano do Colorado, traduziu-se em um déficit orçamentário de U$ 5,7 milhões antes que
os primeiros impostos pudessem ser cobrados (Jacob, M., 2016). Para cada dólar arrecadado

em receita tributária, a população gasta aproximadamente U$ 4,50 para mitigar os efeitos
negativos da legalização (Centennial Institute, 2018). Os custos relacionados ao impacto no
sistema de saúde e ao abandono do ensino médio são os que mais contribuem para os gastos
públicos e as estimativas anuais. Nos Estados Unidos, os custos com esses usuários são de
U$2.200 para usuários pesados, U$1.250 para usuários moderados, e U$650 para usuários
leves. Já os custos estimados de dirigir sob a influência de maconha, apenas em 2016,
aproximaram-se de U$25 milhões (Centennial Institute, 2018). Ademais, em 2016, a indústria
da maconha foi responsável por aproximadamente 393.053 libras de emissões de CO2 na
atmosfera, prejudicando inclusive o meio ambiente (Centennial Institute, 2018). 42 A maconha
na atualidade Para além dos riscos atribuídos ao consumo de maconha já apresentados, faz-se
importante salientar que a maconha consumida atualmente é muito diferente da maconha
consumida há alguns anos. A maconha vem sofrendo grandes alterações em sua composição
ao longo do tempo (Mehmedic et al., 2010), principalmente após a flexibilização das políticas
acerca de sua disponibilidade em alguns países pelo mundo (ElSohly et al., 2021). Os
defensores da legalização ou da flexibilização sobre o controle da maconha apontam possíveis
benefícios médicos e a anunciam como “seguro” e até “saudável”. No entanto, a maioria
desses defensores pensa na maconha dos anos 1960 a 1980, quando o teor de um dos
componentes da droga, o tetrahidrocanabinol, conhecido popularmente como THC, era
inferior a 2%. Atualmente, a indústria da maconha desenvolveu variedades dessa droga com
concentrações altíssimas de THC, tornando-a mais potente, e aumentando em muito os riscos
de desenvolver dependência química, bem como de causar importantes danos aos seus
usuários e a todo o conjunto social. A maconha tem centenas de componentes diferentes
(Kroon et al., 2019). Os mais conhecidos são o Tetrahidrocanabinol (THC) e o Canabidiol (CBD).
O THC é responsável pelos efeitos psicoativos e neurotóxicos da droga, com grande potencial
de causar dependência, e o CBD vem sendo investigado com o objetivo de verificar se existe ou
não um potencial terapêutico para condições clínicas específicas. Tais componentes, em
especial o CBD, tem confundido a população no que diz respeito aos “benefícios” da maconha
dita “medicinal”, sobre a qual falaremos ainda nesta cartilha. Sobre o THC, acumulam-se cada
vez mais robustas evidências de que é o responsável não apenas pela dependência, mas por
todos outros diversos efeitos maléficos 43 da maconha. Estudo de revisão da literatura,
publicado em uma das mais conceituadas revistas internacionais de psiquiatria, ressaltou
diversas alterações cerebrais em usuários de maconha, principalmente em regiões
relacionadas à memória, à emoção, à tomada de decisão e ao equilíbrio motor (Lorenzetti et
al., 2016). Antes da década de 1990, o teor de THC encontrado na maconha era inferior a 2%.
Na década de 1990 cresceu para 4%, e, entre 1995 e 2015, houve um aumento de 212% no
teor de THC na maconha. Em 2017, as cepas mais populares encontradas em dispensários no
Colorado, nos Estados Unidos, tinham uma faixa de teor de THC de 17 a 28% (Stuyt, 2018).
Estudo com o objetivo de revisar e meta-analisar sistematicamente as mudanças nas
concentrações de THC na maconha ao longo do tempo encontrou que as concentrações de
THC aumentaram até 0,57% a cada ano, entre 1970 a 2017 (Freeman et al., 2021), podendo
chegar a até 30% nos dias de hoje (Hindley et al., 2020). Estudo da ONU também corroborou
esses dados, e identificou que a potência da maconha aumentou em até quatro vezes em
algumas partes do mundo, ampliando o potencial de dano da droga aos seus usuários (ONU,
2021). Na prática, estamos falando de outra droga, modificada, muito mais potente e perigosa.
Como anteriormente falado, a maconha com altas concentrações de THC apresenta um risco
aumentado de dependência e distúrbios de saúde mental (Freeman et al., 2021). A legalização
da maconha em alguns países de alta renda vem tornando 44 cada vez mais potentes os
produtos derivados da droga, além de mais disponíveis a um preço mais baixo, aumentando

assim, a prevalência do seu consumo e dos transtornos pelo uso da droga (Connor et al.,
2021). Estudos epidemiológicos têm demonstrado que a flexibilização sobre o controle da
maconha tem aumentado os quadros de psicose em diversos países (Ganesh e D’Souza, 2022),
sendo que a proporção de casos de esquizofrenia associada ao transtorno do uso de maconha
aumentou de 3 a 4 vezes, em alguns países, durante as últimas duas décadas, dado os
aumentos descritos anteriormente no uso e na potência da maconha atual (Hjorthøj et al.,
2021). Em Portugal, um estudo retrospectivo realizado nos hospitais públicos do país, entre
2000 e 2015, relatou um aumento de 29,4 vezes no número de hospitalizações de pessoas com
diagnóstico primário de transtornos psicóticos e esquizofrenia associados ao uso de maconha.
Esse aumento foi atribuído à alteração dos padrões de consumo de maconha na população
portuguesa, após a flexibilização sobre o consumo da droga para uso recreativo (Gonçalves-
Pinho, Bragança e Freitas, 2020). Um dos maiores estudos já realizados para avaliar a conexão
entre o consumo de maconha e psicose, que demonstrou uma forte associação entre o uso
diário de maconha e a probabilidade de desenvolver um transtorno psicótico, também revelou
que o alto teor de THC está associado a um risco cinco vezes maior de desenvolvimento desta
doença, e que a eliminação da disponibilidade de maconha altamente potente evitaria 12%
dos casos de primeiro episódio de psicose (Yücel et al., 2016). Para além da saúde, a
legalização da maconha e, portanto, o aumento das taxas de uso/disponibilidade da droga,
particularmente nas formas que contêm porcentagens mais altas de THC, traz uma certeza
matemática de que acidentes de trânsito também piorarão (Pearlson et al., 2021). Tendo em
vista os altos riscos sociais, de saúde e segurança pública que a legalização da maconha
apresenta, esse não é um caminho que deva ser seguido, e sim evitado. Faz-se importante
salientar também, que pesquisa feita pelo Paraná Pesquisas para a Gazeta do Povo, em 2017,
revelou que 70,9% da população brasileira, em todas as regiões do país, faixas etárias e níveis
de instrução, são contra a legalização da maconha no país (Gazeta do Povo, 2017). 45 Há
evidências crescentes associando o uso de maconha por adolescentes a consequências sociais
e de desenvolvimento danosas. Produtos de maconha estão se tornando cada vez mais
acessíveis, e em decorrência disso, as formas de consumo entre os adolescentes vêm
mudando. O vaping (em português “vaporizador”, também conhecido como cigarro eletrônico,
é um aparelho que tem como objetivo simular um cigarro e o ato de fumar) aumentou
rapidamente entre os jovens. Embora algumas formas de produtos de maconha, como bolo de
chocolate, não sejam novas, este e outros produtos comestíveis de maconha, fabricados e
vendidos comercialmente, estão cada vez mais disponíveis (Johnston et al., 2019). Dados sobre
os usuários adolescentes de maconha, entre 2015 e 2018, mostram que a maconha fumada
diminuiu de 94,7%, em 2015, para 89,3% em 2018, enquanto o consumo de maconha através
de produtos comestíveis e vaping aumentaram de 32%, em 2015, para 39,5%, em 2018, e de
26,4% para 34,1%, respectivamente, no mesmo período (Patrick et al., 2020). Estudo de
revisão ainda mais recente sugere que a prevalência de vaping de maconha aumentou entre
adolescentes nos Estados Unidos e no Canadá, nos últimos 12 meses, de 7,2%, em 2017-2018,
para 13,2%, em 2019-2020 (Lim et al., 2022). Essa pesquisa também revelou que
aproximadamente 1 em cada 3 alunos do ensino médio utilizava desses recursos para
consumo de maconha, apenas no ano de 2018. O Instituto Nacional de Abuso de Drogas
(NIDA), nos Estados Unidos (2019), vem alertando o público para centenas de relatos de
doenças pulmonares graves associadas ao vaping, incluindo várias mortes. Muitos dos
produtos testados pelos estados. Os riscos das novas formas de consumo da maconha pelas
autoridades federais de saúde foram identificados como produtos vaping contendo THC. Dado
o aumento de consumidores, principalmente entre os adolescentes, e os riscos todos do
consumo de maconha já citados nesta cartilha, medidas preventivas e de respostas eficazes e

imediatas são necessárias, e ainda que a comercialização de cigarros eletrônicos seja ilegal no
Brasil, é preciso considerarmos o uso de aparatos eletrônicos para o consumo de maconha
como um novo desafio para a saúde pública, especialmente por ter alta aceitação entre a
população mais jovem. 47 A impossibilidade de controle das cadeias produtivas da maconha
Um dos diversos problemas dos projetos de legalização da maconha é que eles se propõem a
criar diversas cadeias de oferta dessa droga e seus derivados. A maconha para chegar no
mercado precisa ser produzida, transportada e comercializada por alguém, tornando-a uma
atividade econômica. A legalização implica em autorizar pelo menos algumas cadeias
produtivas: a possibilidade de grandes propriedades que adotem sistemas de produção tipo
plantation (plantação) para produção de maconha, produção em estufas especializadas de
maconha, produção por meio de cooperativas, produção por meio de associações de
familiares de portadores de doenças raras, produção pelo próprio consumidor e produção em
laboratórios ou indústrias da maconha. Acresce-se a isso a possibilidade de produção de
produtos que tenham maconha como um de seus ingredientes, que poderiam ser
comercializados em qualquer lugar, tais como supermercados, pela internet, em feiras
públicas, dentre outros. Propõe-se, na maioria desses projetos, que a maconha e seus
produtos derivados sejam regulamentados e monitorados pelo Governo.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública, ademais, neste ano, realizou um balanço de ações
integradas entre as polícias federais e estaduais visando ao combate do tráfico de drogas.
Durante o primeiro semestre de 2020, as polícias federais e estaduais apreenderam em seu
conjunto cerca de 1 mil toneladas de drogas (incluindo maconha, cocaína, crack, etc.), sendo
que as polícias estaduais registraram 762 toneladas de maconha e a Polícia Federal cerca de
206 toneladas. Para se dimensionar o fluxo de drogas pelo território brasileiro, basta se
considerar que todas as polícias dos países vinculados às conferências internacionais sobre
drogas informaram à UNODC a apreensão de aproximadamente 9 mil toneladas de drogas em
todo o mundo durante todo o ano de 2019 (sendo 5,11 toneladas de maconha) 48 (UNODC,
2019) enquanto que, em seu primeiro esforço concentrado com os estados para este fim, o
Brasil registrou, apenas em um semestre, cerca de 1 mil toneladas em um semestre, a maior
parte de maconha. Tudo isto se relaciona com o fato de que o Brasil é vizinho dos três países
que produzem quase a totalidade de cocaína do mundo e do Paraguai, país que registrou a
maior quantidade de maconha apreendida do mundo, segundo o Relatório Mundial de Drogas
de 2019 (1.074 toneladas) (ONU, 2019). Todos estes fatores são um alto risco para a potencial
legalização de gigantescas cadeias de produção e redes de oferta de maconha no Brasil. De
acordo com a “Teoria do Triângulo do Crime”, criminosos se adequam às ações de Segurança
Pública de três formas: se deslocam no tempo (alteram o horário de cometimento de crimes),
no espaço (trocam o local de cometimento) e alteram a forma de cometimento (Felson, 2017).
Traficantes de drogas seguidamente mantém em seu poder pequenas quantidades de drogas e
escondem a maioria de seu estoque em locais próximos de seu ponto de venda, como forma
de escapar da tipificação do Artigo 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, passando-se
por usuários de drogas. É possível pressupor que a legalização de amplas redes de oferta de
maconha (bem como de cânhamo industrial), em um país como o Brasil, com uma das
lideranças mundiais na apreensão de maconha (ONU, 2019) daria condições para o
encobrimento de atividades criminosas. 49 Neste contexto, deve-se considerar os problemas
que alguns países, tais como os Estados Unidos, têm passado com a oferta de opióide
(medicamentos usados especialmente para o controle de dor), pois, mesmo com a venda
regulada e exigindo-se a apresentação de prescrição médica, ocorre uma epidemia naquele
país desses medicamentos, com relatos de distribuição indiscriminada de receitas pelos

médicos, falsificações e vendas no mercado ilícito. No último ano, mais de cem mil americanos
morreram por intoxicação com opioides. No caso da maconha, é perfeitamente possível
pressupor que teríamos problemas similares a esses de uso de documentos das empresas,
associações e outras organizações envolvidas na cadeia de produção e comércio para
encobrimento de atividades ilegais. Se, em nosso país, mesmo programas sociais com recursos
por beneficiários modestos possuem percentuais significativos de fraudes, imagine-se a
legalização de empresas e associações que podem ter suas atividades interseccionadas com o
segundo maior mercado ilícito mundial. O fato de a venda de tabaco ser legal, ademais, não
tem impedido que o contrabando de cigarros seja uma atividade muito lucrativa. Este, no
nosso país, passou por duas etapas, a inicial, conhecida como “exportabando”, na qual
algumas fábricas nacionais de cigarro legais, com o intento de aumentar a sua capacidade de
concorrência, exportavam parte da sua produção para o Paraguai fazendo uso da isenção fiscal
voltada para produtos exportados, sendo que em seguida a contrabandeava de volta para o
Brasil, escapando dos tributos para tabaco. Quando o governo regulamentou o imposto de
exportação aplicando uma alíquota de 150% deste produto para os países vizinhos verificou-se
uma derrubada acentuada dessa operação, mas um aumento da exportação dos precursores
do cigarro (folhas de tabaco e filtros de papel), bem como um aumento do número de
indústrias de cigarro no Paraguai. A logística do narcotráfico e do contrabando de cigarros na
fronteira entre nosso país e o Paraguai utilizam as mesmas estruturas do crime organizado,
constituindo uma prova dos riscos da legalização da maconha na América do Sul (Brasil, 2021).
50 O fracasso das experiências de legalização e de flexibilização do controle sobre a maconha
em outros países Diversos artigos foram publicados em um suplemento da renomada revista
Nature expondo um acumulado de evidências científicas que mostram que o consumo de
maconha traz riscos importantes em vários aspectos da vida dos usuários e de seus familiares
(Nature, 2019), e embora as leis internacionais obriguem os países a impor penalidades
criminais para o fornecimento de drogas para fins não-médicos, algumas jurisdições estão
criando exceções, e vêm legalizando ou flexibilizando o consumo da maconha, seja para fins
terapêuticos ou entorpecentes. Contudo, dados de pesquisas realizadas após a legalização
nesses países nos trazem informações que corroboram a ideia de que este não parece ser um
bom exemplo a ser seguido. É importante frisar que após a legalização da maconha tem havido
um aumento do uso e dependência desta droga em vários estados americanos, principalmente
entre adolescentes de 12 a 17 anos, e adultos jovens com 26 anos ou mais. Esse aumento se
dá, uma vez que há mais exposição da população à droga, impulsionado pelo aumento de sua
disponibilidade (Cerdá et al., 2019; Volkow et al., 2016; Connor, 2021; Rocky Mountain HIDTA,
2019). Para além disso, sabe-se também que a legalização da maconha para uso entorpecente
pode ser uma porta de entrada para outras drogas, levando a um uso mais pesado de
substâncias psicoativas (Park et al., 2020). Esse aumento nas prevalências do consumo de
maconha se dá muitas vezes pela diminuição da percepção de risco sobre a droga, ou seja,
pela crença de que o uso da maconha não traz prejuízos, ou ainda pior, que traz benefícios.
Quando uma droga é legalizada em uma sociedade, automaticamente é transmitida a ideia de
que ela não traz efeitos maléficos, contribuindo, assim, para a redução da percepção de seus
riscos por parte da população, consequente aumento do consumo e também de seus
problemas relacionados. 51 Pesquisas mostram que cada vez menos, os jovens acreditam que
o uso de maconha é prejudicial à saúde (Meier et al., 2012; ONU, 2019). O Relatório Mundial
sobre Drogas da ONU, mostra que houve queda de até 40% na percepção de risco quanto à
maconha por parte de adolescentes em diversos países nos últimos anos (ONU, 2021). No
Canadá, a intenção de acabar com o tráfico não teve sucesso. Dados mostram que o mercado
negro, ainda existente, respondeu à concorrência legal da venda de maconha, reduzindo seus

preços e colocando ainda mais pressão no mercado legal, minando os esforços regulatórios
para manter o preço legal em um determinado nível (Fischer et al., 2020). Ou seja, a
legalização não ocasionou redução do mercado negro de maconha, levando a um regime
regulatório fraco e preços legais cada vez mais baixos, e aumentando, assim, a atividade do
tráfico (DEA, 2020). No Uruguai, registrou-se aumento de apreensão de maconha ilegal entre
2015 (2,52 toneladas) e 2016 (4,305 toneladas), e houve surgimento de um “mercado cinza”,
consistente no desvio de maconha de fazendas de produção que funcionam com autorização
do governo, para serem vendidas no mercado ilegal (Gazeta do Povo, 2021). 52 Além disso, a
flexibilização do controle sobre a maconha está relacionada a um aumento no número de
homicídios e criminalidade em geral nos países que legalizaram o uso da droga (Berenson,
2019). No estado americano do Colorado foi reportado um aumento de 7,95% dos crimes
violentos no ano de 2018, em comparação com 2017 (Hindi, S., 2019), além do aumento de
outros tipos de violência, como a violência doméstica (Dellazizzo, L. et al., 2020; Flanagan, J.C.
et al., 2020). No Uruguai, o número de assassinatos pelo narcotráfico também tem aumentado
ano após ano (GZH, 2019). Em Portugal, os efeitos da descriminalização apontam para um
aumento nas taxas de prevalência para o uso de maconha e de outras drogas, e um aumento
de mortes relacionadas com drogas (Vale de Andrade e Carapinha, 2010). Na Holanda, a
flexibilização do controle sobre o consumo de drogas, descriminalizou a posse e a venda de
maconha. Essa política levou a um aumento significativo do consumo da droga, da tolerância
dos usuários para a droga, e assim, triplicando os quadros de dependência e incentivando a
produção de drogas cada vez mais potentes. Além disso, notou-se aumento das taxas de
internação e do mercado ilegal da droga, transformando o país na capital das drogas na
Europa e em um “imã para criminosos” (Collins, 1999). Além dos impactos sobre os sistemas
de justiça, os sistemas de saúde também vêm sofrendo muito com as políticas de legalização
ou flexibilização do controle sobre a maconha. Com o aumento do consumo, e consequente
aumento da dependência (Ethan et al., 2020), as entradas registradas nas emergências
médicas, em decorrência de intoxicação ou quadros relacionados ao consumo de maconha,
também aumentaram. Estudo canadense encontrou aumentos significativos na frequência e
gravidade das entradas no departamento de emergência pediátrica devido a exposições de
maconha entre crianças após a legalização recreativa da droga (Myran et al., 2022). Em
hospital pediátrico nos Estrados Unidos, as taxas de visitas relacionadas à ingestão acidental de
maconha por crianças dobraram dois anos após a legalização naquele local (Wang et al., 2016).
Hospitais do estado americano do Colorado também têm visto um número crescente de casos
relacionados à maconha. As ocorrências de condições graves de saúde, como a síndrome do
vômito cíclico (condição caracterizada por vômitos e fortes dores abdominais), dobrou após a
legalização da maconha medicinal (Monte et al., 2015). Casos de queimaduras relacionadas à
maconha também cresceram nesses hospitais, em decorrência do manuseio da planta de
maconha, com finalidade de extração de seus componentes para fabricação de outros
produtos (Bell et 53 al., 2015). Esse aumento de cerca de 40% de entrada nos hospitais, por
muitas vezes estavam relacionadas a doenças mentais, que foram diagnosticadas cinco vezes
mais frequentemente em pessoas que usaram maconha, quando comparado aos não-usuários
(Hall et al., 2018). Resultados de estudo de revisão da literatura sobre o impacto da legalização
da maconha encontrou robustas evidências de danos na saúde mental e física dos usuários
(Clement et al., 2018). Por último, porém não menos importante, os dados de acidentes de
trânsito relacionados ao uso dessa droga após a legalização são alarmantes. No Canadá, a
prevalência de motoristas moderadamente feridos nos centros de trauma mais que dobrou
(Brubacher et al., 2022). No Estado de Washington, nos Estados Unidos, onde a maconha foi
legalizada, estima-se que cerca de 21% de todos os motoristas envolvidos em acidentes fatais,

no ano de 2017, testaram positivos em testes para maconha, revelando um aumento de 18%
em nove anos (Tefft e Arnold, 2020). Esses dados devem ser vistos com muita preocupação,
dada que a prevalência do consumo de maconha vem aumentando significativamente em todo
o mundo, especialmente nos locais onde a droga foi legalizada ou descriminalizada. O relato
persistente de uma falta de reconhecimento sobre a maconha como uma substância
prejudicial, e o contexto emergente de legalização para uso entorpecente no mundo são muito
preocupantes. Na Nova Zelândia (Wilkins e Rychert, 2021), a possibilidade de legalizar o
fornecimento e a venda recreativa e comercial de maconha foi absolutamente rejeitada, e isto
se deu por inúmeras razões: preocupação sobre se as restrições de idade no uso seriam
realmente eficazes, refletindo uma longa experiência de limites de idade para compra de
álcool, bastante ineficazes; preocupação com as possíveis consequências negativas para o
trânsito e para o local de trabalho; preocupações sobre se a indústria legal da maconha e os
pontos de venda poderiam ser controlados, visto a péssima experiência com o álcool; receio
de que a legalização reforçaria ainda mais a normalização do uso da maconha, diminuindo a
percepção de risco e aumentando o uso e a dependência e adicionando pressão a um já
sobrecarregado sistema de saúde mental e dependência química; e dúvidas sobre se a
legalização realmente reduziria o poder dos traficantes de drogas, ou apenas resultaria em
uma 54 maior venda de maconha para menores de idade, e na expansão das vendas de outras
drogas. Todas essas razões acima citadas, contrárias à legalização ou flexibilização do controle
sobre a maconha encaixam-se perfeitamente na realidade do nosso país, e como no Brasil, há
evidências emergentes de que a indústria da maconha legal está usando estratégias para
influenciar o ambiente regulatório, colocando seus lucros acima da saúde pública, como na
Nova Zelândia (Adams et al., 2021) e em todo o mundo (Sabet, 2021). 55
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Association between cannabis use, psychosis, and schizotypal personality disorder: findings
from the National Epidemiologic Survey of Alcohol and Related Conditions. Schizophrenia
Research, v. 151, Dec. 2013.
Disponível em: DEA – DRUG ENFORCEMENT ADMINISTRATION. 2019 national drug threat
assessment. 2020.

Glossário
Absenteísmo: hábito de se ausentar com frequência, de não comparecer. Não participar de
votações obrigatório; abstencionismo.
Abstinência: ato de se privar de alguma coisa, em prol de algum objetivo.
Canabidiol: substância extraída da planta de maconha.
Canabinóides: componentes encontrados na maconha.
Canal arterial: vaso sanguíneo que liga a aorta (maior artéria do nosso corpo) à artéria
pulmonar.
Comorbidades: são condições prévias ou doenças pré-existentes associadas a um agravante do
quadro clínico do paciente.

Córtex Pré-frontal: região cerebral associada ao planejamento dos comportamentos
cognitivamente complexos e à expressão da personalidade.
Cromossomos: são estruturas compostas de DNA que, por sua vez, carregam os genes de um
ser vivo, responsáveis por definir as características físicas particulares de cada indivíduo.
Defeito do septo atrial: é um orifício na parede (septo) que separa o coração nos seus lados
esquerdo e direito. Os defeitos do septo atrial se localizam entre as cavidades superiores
(átrios) do coração.
Defeito do Septo ventricular: é um orifício na parede (septo) que separa o coração nos seus
lados esquerdo e direito. Os defeitos de septo ventricular se localizam entre as cavidades
inferiores (ventrículos).
Defeitos Cromossômicos: as alterações cromossômicas são síndromes genéticas provocadas
por alterações estruturais, ocasionadas pela perda ou inversões nucleotídicas ou também
numéricas, em consequência à falta ou excesso de cromossomos nas células, anormalidade
denominada de aneuploidias.
Defeitos Geniturinários: inflamação dos tecidos dos rins causada por agentes infecciosos; os
mesmos que provocam amigdalite e sinusite, por exemplo. 73
Defeitos Musculoesqueléticos: condição provocada por doenças que acometem os ossos,
articulações, músculos, tendões, ligamentos ou bursas.
Deficiências Cognitivas: termo usado para se referir a qualquer deficiência que afete os
processos mentais, como Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), dislexia,
autismo, lesão cerebral, dificuldades de aprendizagem, entre outras.
Dependência: condição de quem é dependente, da pessoa que não consegue desligar de um
hábito, especialmente um vício; consumo compulsivo de medicamentos ou drogas
(dependência química).
Espinha bífida: defeito congênito que ocorre quando os ossos da coluna não se formam
completamente.
Estudo longitudinal: método de pesquisa que visa analisar as variações nas caraterísticas dos
mesmos elementos amostrais (indivíduos, empresas, organizações etc.) ao longo de um longo
período de tempo.
Exposição pré-natal: dá-se o nome de pré-natal à assistência recebida pela gestante desde o
início da gestação até o momento do parto.
Exposição no período de gestação.
Funções executivas: é um termo abrangente para a gestão (regulação, controle) dos processos
cognitivos, incluindo memória de trabalho, raciocínio, flexibilidade de tarefas e resolução de
problemas, bem como o planejamento e execução.
Funções Psicomotoras: relativo a psicomotricidade, como esquema corporal; coordenação
motora global; coordenação motora fina; organização temporal, organização espacial e
lateralidade.
Geniturinário: relativo ao conjunto dos aparelhos genital e urinário.

Hipotonia: refere-se a uma diminuição do tônus muscular.
Hipoventilação: é a ventilação reduzida dos alvéolos pulmonares. Com isso, a eliminação de
gás carbônico pelo corpo também reduz e, consequentemente, sua concentração aumenta no
sangue, diminuindo o pH sanguíneo.
Latifúndios: propriedade rural privada e de grande extensão, geralmente utilizada para a
produção de apenas um produto (monocultura) e voltada para o mercado externo. 74
Leucemia Linfoide Aguda: é um câncer causado por um linfócito (tipo de célula responsável
pela defesa do organismo) que sofre mutação na medula óssea por algum erro no DNA. Esse
dano gera um linfoblasto que não amadurece e, por isso, não se transforma em uma célula
sanguínea funcional.
Microcefalia: malformação congênita em que a cabeça dos recém-nascidos é menor do que o
esperado.
Midríase: é a dilatação da pupila em função da contração do músculo dilatador da pupila.
Neuro anatômicas: organização anatômica (corporal, físico) do sistema nervoso.
Neuroimagem: imagem cerebral é o uso de várias técnicas para imagem, direta ou
indiretamente, da estrutura e função do sistema nervoso.
Neuroplasticidade: também conhecida como plasticidade neuronal ou plasticidade cerebral,
refere-se à capacidade do sistema nervoso de mudar, adaptar-se e moldar-se a nível estrutural
e funcional ao longo do desenvolvimento neuronal e quando sujeito é exposto a novas
experiências.
Neurotóxicos: substâncias químicas altamente tóxicas que envenenam o sistema nervoso
central do corpo e impedem que ele funcione adequadamente.
Persistência do canal arterial: geralmente acarreta alterações hemodinâmicas (circulação do
sangue) significativas nas circulações sistêmica (o sangue levado do coração para os tecidos e,
depois, é levado novamente para o coração) e pulmonar do prematuro desde os primeiros dias
de vida.
Precoce: prematuro; que se produz antes do tempo normal.
Psicopatologia: estudo sistemático do comportamento, da cognição e da experiência anormais;
o estudo dos produtos de uma mente com um transtorno mental.
Psicose: transtorno mental que faz com que as pessoas percebam ou interpretem as coisas de
maneira diferente das pessoas que as rodeiam.
Septo atrial: é a parte da estrutura (anatomia) do coração que separa o átrio esquerdo do átrio
direito.
Síndrome de Down: presença de três cromossomos 21 em todas ou na maior parte das células
de um indivíduo; anormalidade genética. 75
Sintomas psicóticos: sintomas da psicose, como delírios, alucinações, catatonia,
desorganização do pensamento, abulia e agitações de caráter.

Substâncias Psicoativas: substância química que age principalmente no sistema nervoso
central, onde altera a função cerebral e temporariamente muda a percepção, o humor, o
comportamento e a consciência.
Tetrahidrocanabinol: é o principal componente da planta da maconha, sendo responsável por
seus efeitos alucinógenos.
Tolerância: ação de tolerar; de suportar algo de maneiras resignada, sem reclamar; é um
termo que define o grau de aceitação.
Transtorno Mental: alterações do funcionamento da mente que prejudicam o desempenho da
pessoa na vida familiar, social, pessoal, no trabalho, nos estudos, na compreensão de si e dos
outros, na possibilidade de autocrítica, na tolerância aos problemas e na possibilidade de ter
prazer na vida em geral

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