A genética determina a estruturação orgânica e a constituição mental através da interação entre organismo e ambiente. Os determinantes do comportamento dependem da gênese orgânica e do estímulo do meio exterior. É possível concluir que muito do que é relativo à atividade mental, decorre da epigênese.

É simplista, desse modo, atribuir processos mentais psicológicos e psicopatológicos exclusivamente à genética ou às condições do meio.

Nenhum transtorno mental é genético, a não ser indiretamente.

Ainda assim, as investigações da genética levam a conclusões bem fundamentadas sobre a predisposição genética aos transtornos mentais.

Não propriamente como herança, em sentido estrito, ou seja, como hereditariedade determinada. Porém, seguramente como agregação familial, ou seja, incidência e prevalência maior em determinadas linhagens sanguíneas. Em outras palavras, como vulnerabilidade maior a determinados transtornos.

(Ruy Mendes)

A biologia e a genética molecular vêm tendo crescente importância para o entendimento e o tratamento dos pacientes com transtornos mentais. Contudo, até hoje, não foi possível encontrar genes específicos para qualquer um dos transtornos mentais.

Devemos reconhecer que ninguém pode ser completamente entendido, sem que se leve em conta o ambiente no qual vive, seu valor social e cultural.

Quando os filhos saem de casa e entram na universidade ou no trabalho, a interferência dos pais começa a enfraquecer. Nesse ponto, temos de tomar as nossas próprias decisões e a biologia passa a falar mais alto. Em suma: sejamos crentes ou céticos, a “culpa”, em grande parte, é da nossa genética.

Enquanto criança o cérebro dos pais funciona por elas. Já os adultos têm de tomar decisões e assumir responsabilidades sozinhos.

Os genes não são destinos fixos de tendências, são apenas fronteiras da constituição.

A psiquiatria até o momento não encontrou um modelo que represente a expressão fenotípica de cada sujeito. A solução para isto tem sido o uso do conceito de espectro. Sabe-se que o mesmo gene pode predispor o mesmo indivíduo a uma variedade de expressões de um mesmo espectro tornando-se difícil limitar cada expressão patogênica a uma determinação genética. Ou seja, conforme a interação ambiental, mesmo o sujeito apresentando um gene determinante pode não vir a expressar o transtorno mental previsível, ou expressá-lo em um amplo espectro de configurações clínicas.

Hoje se sabe que sistemas complexos têm propriedades de auto-organização que independe de qualquer programação prévia, seja ela genética ou de outra ordem, ou seja, forma-se segundo a dinâmica do processo em fluxo. O cérebro, p. ex., na dinâmica de seus fluxos neuroquímicos e circuitais, formam atratores, zonas de ordem, de estabilidade assintótica (ou creodos, como chamava Waddington, quem introduziu esta palavra em biologia, no seu livro sobre embriogênese, 1947). Justamente essas tendências estáveis predeterminam os modelos de linguagem, de semântica, de memória, para não falar em outra coisa mais no campo orgânico. Há, portanto, uma tendência a organizar informação complexa que emerge da própria dinâmica do sistema, particularmente naqueles em que o processamento é distribuído em paralelo, com em redes neurais. (PORTELA)

Verifica-se que sujeitos com sintomas de um mesmo espectro respondem a tratamentos de forma semelhante. Antigamente esta questão era estudada por ciclos heredológicos tais quais o ciclo heredológico da epilepsia, o das doenças afetivas e o das esquizofrenias.

Um modelo categorial limita-se a relacionar sintomas comuns a uma determinada expressão psicopatológica. Para o estudo dos transtornos da personalidade, o modelo não categórico no qual se utiliza o conceito de espectro atende melhor à realidade da expressão fenotípica. Desta orientação surge a proposta dimensional que estabelece um contínuo de pólos opostos de manifestação.

Eric Hollander, 1990, propõe um esquema que se tornou clássico para a proposta dimensional. Propõe contínuo de pólos opostos entre comportamentos mais compulsivos e outros mais impulsivos (ver figura). No pólo compulsivo as patologias relacionadas mostrariam uma maior rigidez do sujeito acometido de forma a apresentar comportamentos repetitivos ou idéias prevalentes que teriam objetivo de aliviar a ansiedade que a rigidez de propósitos os impõe. Nesse sentido têm aversão ao risco no entender de Hollander. Ou seja, a expressão genética nestas patologias contém o indivíduo de forma a se alto proteger a todo custo, não correndo nenhuma possibilidade de risco, em sua forma de ser.

No polo oposto, Hollander relaciona as patologias de caráter impulsivo, aonde correr riscos é o que excita e atrai. Nessas condições que encontramos os transtornos da personalidade.

Resumindo, na compulsão ocorre uma preocupação exagerada com os danos possíveis e no pólo oposto, a impulsividade, o sujeito se preocupa muito pouco com o dano que pode causar a si e aos outros. O interessante ainda é que como são condições patológicas de um mesmo espectro, ambos os sintomas podem coexistir.

Pode-se dizer que a disfunção é genética e tem um forte coeficiente de hereditariedade, desde que se entenda que os genes não são responsáveis pelo transtorno, mas pela predisposição. O sujeito herda a suscetibilidade.

http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=26573

periódico Journal of Neuroscience, da Sociedade para Neurociência dos EUA, o artigo do pesquisador brasileiro Stevens Kastrup Rehen, do Instituto de Pesquisas Scripps, leva a ciência a uma nova percepção sobre o cérebro

Estudo liderado pelo cientista demonstrou pela primeira vez a existência de células aneuplóides – com um número alterado de cromossomos – no cérebro de pessoas normais e sem qualquer indício de doença neurológica. A descoberta derruba um dogma. Até hoje, sempre se acreditou que todas as células do sangue e de outros tecidos tivessem 46 cromossomos e que apenas indivíduos portadores de anomalias como síndrome de Down ou câncer possuíssem células aneuplóides no cérebro. Os resultados da pesquisa de Rehen indicam que nem todas as células têm exatamente o número determinado de cromossomos.


A aneuploidia – alteração no número de cromossomos caracterizada por um exemplar extra ou inexistente – foi descrita pela primeira vez em tumores pelo biólogo alemão Theodor Boveri, em 1914, e desde então vem sendo estudada nesse contexto.

O cientista brasileiro é o primeiro a descrever a alteração no cérebro humano normal. Em 2001, ele havia identificado a existência de células aneuplóides no cérebro normal de camundongos. No novo estudo, Rehen e sua equipe, do Depto. de Biologia Molecular do instituto californiano, quantificaram 9 mil células de pacientes humanos entre 2 e 86 anos. De forma bastante resumida, essa descoberta revela que o cérebro humano é muito mais complexo do que imaginávamos. Nele, células com diferentes números de cromossomos expressam de forma distinta suas proteínas e reagem também diversamente a um mesmo estímulo. Poderíamos comparar o cérebro a uma sala repleta de computadores, onde cada neurônio é uma determinada máquina. Inicialmente, imaginávamos que todo e qualquer computador numa mesma sala fosse construído com as mesmas peças. Entretanto, tendo como base os resultados sobre aneuploidia no cérebro humano, fica claro que não é bem assim. Cada computador – ou grupo de computadores – tem sua própria individualidade. Poderíamos imaginar uma sala onde coexistissem Macs e PCs, com diferentes velocidades e capacidade de armazenamento. Sendo assim, numa sala com computadores diferentes é muito mais difícil prever a resposta a um determinado problema. É como se tivéssemos descoberto que computadores podem conter processadores e peças distintas, variando sua distribuição em diferentes salas. A aneuploidia no cérebro pode ocorrer em qualquer cromossomo – há 23 pares! – e temos indícios que seja esse realmente o caso. Podemos, portanto, sugerir que a combinação de perdas e ganhos dos mais diversos cromossomos caracterizariam tipos distintos de neurônios.

Como o processo de perdas e ganhos de cromossomos pode ajudar a ciência no futuro?

– Essa descoberta poderá ajudar a compreender o porquê de os neurônios serem tão distintos entre si. Poderá ainda contribuir na compreensão de diferenças de comportamento ou de suscetibilidade a doenças. No sistema imunológico, a diversidade celular – e geração de anticorpos, no caso – é conseqüência da recombinação entre alguns genes específicos. Talvez no cérebro essa diversidade celular seja conseqüência da perda e ganho de cromossomos. É o que acreditamos.

Outra informação divulgada em seu artigo é a detecção, nos cérebros estudados – de pessoas normais –, de células com três cópias do cromossomo 21. Essa não é uma característica dos portadores da síndrome de Down, também conhecida como trissomia do 21?
– Nosso estudo indica que pessoas normais podem apresentar um número pequeno, mas significativo de células com três cópias do cromossomo 21. Essas mesmas células, quando presentes em grande quantidade, caracterizam a síndrome de Down. Cabe ressaltar que a síndrome ‘clássica’ ocorre quando 100% das células no corpo do indivíduo possuem três cópias para o cromossomo 21, mas há ainda variações conhecidas como ‘síndrome de Down em mosaico’. Nesses casos, o indivíduo pode ter 70% de células com três cópias do 21 e 30% das células com duas cópias ou gradações dessa distribuição. O interessante é que, quanto maior o número de células diplóides – e menor o número de células trissômicas –, mais brandos são os sintomas da síndrome de Down. Em seu trabalho está sugerido que a presença dessas células alteradas pode estar também relacionada à origem de tumores no cérebro e até mesmo ao mal de Alzheimer.

Nessa hipótese de trabalho atual é que o mal de Alzheimer é a conseqüência da presença de um número significativo de células trissômicas, restritas ao cérebro – ou a qualquer tecido de origem ectodérmica, como a pele – e não suficientes para caracterizar a síndrome de Down – detectável no sangue –, mas capazes de levar ao desenvolvimento do Alzheimer.

Por que todo portador da síndrome de Down, a partir de uma certa idade, desenvolve o mal de Alzheimer?

O gene que codifica a proteína precursora de amilóide (APP) está localizado no cromossomo 21. Essa proteína, quando possui determinadas mutações, ou é clivada de forma anormal ou é produzida em excesso. Desse modo, ela contribui para a formação das placas amilóides, característica do mal de Alzheimer. Daí um indivíduo com Down – e excesso de produção da APP causada pela trissomia do 21 – desenvolver inevitavelmente o Alzheimer quando alcança uma determinada idade. Que outras doenças podem estar relacionadas à aneuploidia cerebral? Existe a possibilidade de ela estar associada a doenças como esquizofrenia, lisencefalia [padrão anormal de desenvolvimento do cérebro] ou autismo. Existem 337 genes localizados no cromossomo 21, que é um cromossomo pequeno. Imagine centenas de genes sendo alterados de uma única vez em neurônios diferentes num mesmo cérebro pela perda e ganho de cromossomos.

(Agência Fapesp, 24/3)

Considera-se que o meio sociocultural serviria como maior ou menos repressor da expressão da vulnerabilidade nos Transtornos da Personalidade, de forma geral.

Assim, verifica-se que em sociedades bem estruturadas socialmente, no caso dos transtornos mais graves da personalidade, as psicopatias, os danos sociais advindos da conduta delitiva são menores. O Meio social adequadamente estruturado funcionaria como contentor das disposições antissociais.

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