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Novembro de 2011 - Vol.16 - Nº 11 Psiquiatria na Prática Médica CORRELAÇÕES ENTRE O CLIMATÉRIO E SINTOMAS PSIQUIÁTRICOS Prof. Dra. Márcia Gonçalves
Um
dos períodos mais delicados na vida da mulher é o climatério e a entrada na
menopausa. Assim
como na menarca, diversas modificações hormonais ocorrem e um ajustamento à
nova fase de vida se faz necessária. Reflexões e um processo adaptativo são
observados em ambas as esferas: física e psíquica. Algumas
mulheres passam por este período de transição sem muitos sintomas. Outras,
entretanto desenvolvem sintomas mais exuberantes e necessitam de uma atenção
mais especializada. A
ocorrência de transtornos psiquiátricos prévios pode ser um fator de risco para
o desenvolvimento de sintomas psiquiátricos após a menopausa. Também chamada
como síndrome do climatério este período de transição é constituído por um
conjunto de manifestações clínicas experimentadas pelas mulheres no período da
menopausa.1 O
fogacho, presente em cerca de 90% das mulheres e relacionado diretamente com a
redução dos hormônios gonadais e sintomas depressivos,
ansiosos e cognitivos também são experimentados por cerca de 30 a 50% das
mulheres que procuram tratamento.2 Waal et al.
(2005), em estudo transversal com 1.458 pacientes, observaram uma razão de
chance maior que seis para a presença de sintomas como falta de energia, fadiga
e esquecimento entre pacientes com mais sintomas depressivo-ansiosos. Algumas
pesquisas têm demonstrado que históricos de depressão anterior ou de tensão
pré-menstrual são fortes indícios de um quadro depressivo na menopausa. Para haver
depressão na menopausa parece ser necessária uma interação entre fatores
genéticos e hormonais. De fato, fatores genéticos predispõem a pessoa a ter
depressão diante de determinadas condições ambientais, e os genes mais
comprometidos são aqueles que afetam o transporte dos neurotransmissores
envolvidos na depressão, tais como a serotonina e a
noradrenalina.3 Callegari et al. (2007) observaram que, além de queixarem-se de forma
mais intensa dos sintomas da menopausa, pacientes com transtornos depressivos
ou ansiosos queixam-se de um maior número de sintomas físicos e psíquicos.
Entre as pacientes deprimidas, níveis significativamente superiores de sintomas
somáticos e psíquicos são vistos. Todavia,
como as influências nos dois sentidos são intimamente intrincadas, existe a
necessidade de uma avaliação muito criteriosa, pois sem isso, pacientes com
transtornos depressivos ou ansiosos moderados a graves serão submetidas a
tratamentos de reposição hormonal, para os quais se mostrarão pouco eficazes,
retardando o uso de antidepressivos ou ansiolíticos.5 A
avaliação da personalidade é um assunto muito presente nas pesquisas da
sintomatologia do climatério. Existem controvérsias se certos traços de
personalidade e características pessoais poderiam influenciar no aparecimento
desta sintomatologia. O
conceito mais utilizado pelos autores que pesquisam os sintomas do climatério é
de que a personalidade pode ser definida como um padrão complexo de
comportamento composto por traços ou perfis .6 Assim,
a mulher que na menopausa apresenta sintomas da síndrome do climatério e
procura atendimento médico poderia evidenciar algum traço de personalidade
característico, principalmente traços hipocondríacos ou histriônicos. Certos
traços hipocondríacos de personalidade poderiam funcionar como fatores de risco
para o desenvolvimento de sintomas no período do climatério, principalmente
sintomas depressivos.7 Os
pacientes hipocondríacos são mais predispostos do que outros pacientes a
experimentar sintomas somáticos que eles ouviram ou leram. Também são mais
atentos do que outros a perceber alterações fisiológicas.8 O
quadro depressivo da menopausa se manifesta, principalmente, por
irritabilidade, nervosismo, sensação de abandono, falta de energia, labilidade
emocional, ansiedade, angústia, tristeza, e alterações alimentares. Quanto ao
sono, pessoas em depressão podem apresentar períodos de insônia ou, ao
contrário, de hipersonia. As alterações alimentares
podem ocorrer através de períodos de anorexia ou, ao contrário, de hiperfagia. Sabe-se que as vias serotoninérgicas centrais
modulam o comportamento alimentar e podem ainda participar dos mecanismos que
regulam a impulsividade, o humor e o padrão e qualidade do sono. Na menopausa
ou perimenopausa, a insônia costuma estar associada à
chamada síndrome do comer noturno, caracterizados por perda de controle e
consumo exagerado de alimentos ao final da tarde e à noite, favorecendo mais
ainda o ganho de peso.9 Outro
fator de extrema relevância é a síndrome metabólica, que é um fator muito
observado para fins de correlações com a sintomatologia do climatério. A
maioria das mulheres obesas ou com sobrepeso já apresentava aumento da gordura
corporal depois da puberdade. Esse ganho de peso pode ser precipitado por
vários eventos durante a vida, incluindo gravidez, uso de anticoncepcionais e
principalmente menopausa.9 Na
menopausa freqüentemente ocorre aumento de peso e alterações na distribuição da
gordura corporal, possivelmente como conseqüência da redução na produção de
estrógeno e progesterona. Ocorre uma distribuição de gordura mais central.9 A diminuição da produção de hormônio de
crescimento e aumento da testosterona que também ocorre depois da menopausa
contribuem mais ainda para o depósito de gordura tipo masculino (andróide), chamada
de gordura visceral que favorece o
desenvolvimento da síndrome metabólica.9 Coutinho
& Appolinário (1995), com o objetivo de
esclarecer o possível efeito negativo da progesterona nos sintomas psíquicos da
síndrome do climatério, conduziram um
estudo duplo-cego randomizado de progesterona natural x placebo. Vinte
pacientes na pós-menopausa (segundo critérios da OMS) apresentando fogachos e
sintomas depressivos e/ou ansiosos sem preencher critérios para episódio
depressivo maior (DSM-III-R) foram tratados durante 1 mês com estrogênio transdérmico (50 µg/dia). No
fim do primeiro mês foram divididas de forma randomizada em dois grupos. No
primeiro grupo, a progesterona natural (supositórios de 100 mg)
foi adicionada ao esquema de reposição hormonal. No outro foi adicionado
placebo. Os resultados mostraram uma melhora dos sintomas depressivos e
ansiosos com o estrogênio transdérmico, na primeira
fase do estudo, e não evidenciaram diferenças significativas entre os dois
grupos, (progesterona x placebo) na segunda fase. Os
autores concluíram que a progesterona natural adicionada ao esquema de
reposição hormonal para o climatério não provoca nenhum efeito de piora dos
sintomas psiquiátricos da menopausa como citado na literatura anteriormente em
relação aos progestágenos sintéticos. Pilowsky
(1994) investigou 118 pacientes no climatério e possíveis relações entre traços
de personalidade hipocondríacos no aparecimento de determinados sintomas
depressivos. Não foi relatado aumento significativo dos traços de personalidade
considerados característicos de um comportamento hipocondríaco no grupo I,
comparado a um grupo II. Concluiu-se que o
surgimento de sintomatologia depressiva na síndrome do climatério na população
estudada não parece estar relacionado com a presença de traços hipocondríacos
prévios. Por
outro lado, a própria deficiência de estrogênio que resulta na menopausa,
também está associada ao afeto depressivo. É por isso que a terapia estrogênica
parece causar sensação de bem-estar e redução drástica dos sintomas
depressivos.9 Se
acima vimos condições da menopausa ou perimenopausa
suficientes para o ganho de peso, quanto à distribuição visceral dessa gordura
adquirida ocorre uma hiperatividade do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal,
presente entre as alterações hormonais da depressão. Isso porque os estados
depressivos se associam com aumento na produção de ACTH (hormônio adreno-cótico-trófico, produzido na hipófise) e menor
sensibilidade do hipotálamo aos efeitos inibidores do cortisol. Isso faz
aumentar a concentração de cortisol e, conseqüentemente, promove a
centralização de gordura visceral.8
Desta
forma o que se pode afirmar através das várias linhas de pesquisa para
compreensão da sintomatologia e a diversidade de fatores implicados neste
período, que existe uma profunda mudança que
envolve todas as esferas de vivências na vida da mulher. Longe
de síntese, mas o contrário, as diversas linhas de estudo podem contribuir na
determinação de novas terapias e associações de terapias no sentido de
favorecer uma adaptação mais branda à nova condição de vida da mulher na
menopausa. 1.
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da disciplina de psiquiatria da UNITAU – [email protected]. ![]()
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