2.RESPOSTA DO ECONOMISTA BARNARD MARIS: ONFRAY MOI PEUR
(ONFRAY EU MEDO)
Bernard Maris
Tradução:Eliezer de Hollanda Cordeiro
‘’A priori um rapaz que publicou um « Traité d’athéologie
»(Tratado contra a Teologia), criou uma universidade popular de filosofia,
preconizou o retorno dos jardins familiaux
(jardins para trabalhadores), escreveu no Siné-hebdo e
divulgou filosofia em vez de prospectos publicitários, é uma pessoa simpática.Sosseguemos,
não tenho a intenção de defender a misoginia de Freud ou a avidez dez Lacan, mas sempre me
senti profundamente perturbado por uma coisa: a necessidade de viver o que se
diz . Então faça o que diz,ONFRAY.Você se diz revolucionário ? Enverede
pelas estradas, encontre a Mère Teresa ou
os surrealistas, defenda os clandestinos e empunhe armas contra Total.
Você que ama os bons restaurantes e os bons vinhos, as belas casas e as
belas pinturas, você que defende a populaça e detesta os burgueses, porque não
toma o metrô nas horas de afluência ? .
De uma certa maneira, a questão que Michel Onfray
coloca no jornal Libération é a
da covardia e da ‘’colaboração’’ de Freud –de
maneira acessória a da nulidade da psicanálise.Ora, se alguém prefere pagar 450
euros por uma sessão de psicanálise (a tarifa praticada por Freud, segundo
Onfray) em vez de comprar um carro esporte, que mal há nisso? Mesmo se a
psicanálise é um placebo, ela produz menos CO2.
Antes de tudo, notemos que, segundo Onfray, Freud contou a sua própria
história através do complexo de Édipo.E daí? E que através do assassinato do
pai e da culpabilidade dos filhos contou seus próprios fantasmas. E então?
Será que isto diminui a força do complexo de Édipo ou do assassinato como
fundador da cultura e da sociedade, ponto de vista que outrora fascinou Keynes e hoje fascina René Girard ?
Mas o pior é quando Onfray aborda a questão do anti-semitismo disfarçado de
Freud e de sua covardia confessa.
Em ‘’Mal estar na civilisação’’ , Freud faz duas
observaçãoes que causaram mal-estar. Primeiro ele fala da “benéfica
seleção natural”, o que nos tempos do eugenismo e do racismo deixa um
pequeno gosto de fel. Mas sobretudo é uma notável estupidez científica porque a
espécie humana é precisamente a que deixou de sofrer a seleção natural. A
maneira como Freud leu a obra de Darwin foi demasiadamente rápida. Freud não
esconde sua admiração pelo ninho de cupim,
produto e término de uma longa seleção natural, o que do ponto de vista
científico é outra besteira. Mas ele incomoda filosoficamente: a metáfora do
ninho de cupim é aquela do Estado nazista e de seu chefe todo poderoso.Mesmo
assim, o seu “Mal-estar na civilisação”continua sendo um dos
textos mais lindos que a humanidade já produziu.Podemos dizer a mesma coisa
de “Totem et Tabu”, de “Moisés e o monoteismo”. Freud
racista ?
Podemos facilmente construir um Karl Marx
cristão. Temos razão de fazer isto e eu o farei de bom grado. Karl Marx
cristão-ateu ( que é um oximoro igual ao de
Freud anti-semita) não impede a teoria da mais-valia de ser a grande teoria
econômica que enterrou todas as falsas leis econômicas feitas pelos
economistas. Que Marx tenha explorado suas filhas e engravidado sua empregada
(algo um tanto nojento para um defensor do povo, não?) não tira uma grama do
peso revolucionário de seus escritos.
Contudo, pior do que racista e eugenista, Freud anti-semita ? A propósito
de “Moisés e o monoteismo “, Onfray escreveu : “Foi neste
contexto de anti-semitismo desvairado que Freud atacou Moisés! Sua
obra seria considerada como anti-semita se tivesse sido assinada por qualquer
outra pessoa.” Ora, Freud demonstra que Moisés era egipciano, que o
culto do deus único vinha de Akhenaton, que os Egipcianos praticavam a
circuncisão, que os judeus, enquanto povo eleito, tinham uma boa opinião deles
mesmos. Isto quer dizer que Freud era anti-semita? Devemos chorar ou rir ?
Na época em que vivia, Jean-Edern Hallier
cuspia no chão quando encontrava um chileno expulso por Pinochet.
Subentendido, você fugiu, camarada, em vez de combater ao lado da resistência
chilena. Hallier era a última pessoa autorizada a dar lições a qualquer um,e
muito menos aos chilenos. E, sendo um intelectual covarde, deveria apanhar as
pontas de cigarros jogadas no chão por todos os refugiados políticos do
mundo.
Incomoda-me ler setenta e cinco anos mais tarde no
livro de Onfray, a lição que ele dá a Freud sobre a coragem política. Freud
disse em maio de 1933, quando os seus livros foram queimados ao mesmo tempo do
que os escritos por Einstein: « Pelo menos queimo bem
acompanhado’’. Um ano antes, escrevera com o mesmo Einstein o
“Porque a guerra ?” Freud deveria ter ido quebrar a cara dos
incendiários ? Ele colaborou com o Institut Göring ?
Sustentou Dolfuss, como pretende
Onfray ? Das cinco irmãs de Freud, quatro morreram em campos de concentração (
talvez que isto satisfizesse sua « misoginia»...).
Freud escreveu em 1934: “O mundo se torna uma
prisão, sua pior célula é a Alemanha”. Quem pode negar que Hitler
perseguiu os psicanalistas ? Doente, sofrendo de um câncer, Freud peremaneceu
na Áustria até 1938. Antes de partir para Londres, a Gestapo pediu-lhe para
assinar uma carta reconhecendo que havia sido bem tratado.Freud assinou-a e
acrescentou: “Recomendo de bom grado a Gestapo para
todos.” Riamos um pouco com os anti-semitas.’’
3.RESPOSTA DE ROLAND GORI: TRECHOS DE UMA ENTREVISTA
Numa entrevista dada Ao jornalista Gibert CHARLES
da Revista L’Express, Roland GORI
lembrou que ‘’as críticas sobre a vida pessoal de FREUD e suas
teorias começaram há mais de um século. E sempre foram as mesmas, que podem
ser assim resumidas: o que é novidade na sua obra é mentira, o que é verdadeiro
não é novidade. ONFRAY quer apagar o nome de um dos fundadores da cultura
européia. Seus ataques surgem numa sociedade que não quer mais falar do homem
trágico, do indivíduo lutando contra sua angústia, sua culpabilidade,seus
desejos, seus conflitos’’.
‘’A medicina, a psiquiatria, a
psicologia não são apenas saberes, são também práticas sociais.(...) A
psicanálise, como a psiquiatria humanista, estima que devemos levar em conta o
afeto,o relacional da personalidade’’.
‘’Hoje em dia, o sistema da economia
liberal parte do princípio que o comportamento humano é racional e que é
possivel prever as ações dos indivíduos em função dos interesses que podem
obter. O humano tornou-se um simples segmento técnico da
produção’’.
A psicanálise seria obsoleta?
‘’Freud era médico , adepto de um
positivismo puro e duro, voltado para a neurologia e as ciências naturais, mas
ele descobriu que a razão é solapada por forças obscuras que se
encontram dentro dela, pelo inconsciente e os afetos. E que a pretensão a
governar o humano pela racionalidade leva a um beco sem saída. Freud inventou
um método onde o saber não vem do especialista: é o próprio doente que possui
um saber que o terapeuta vai ajudar a decifrar.A psicanálise faz parte desta
herança que defende a idéia de que a humanidade do homem não se situa somente
na razão’’.
E sobre a relação da psicanálise com a nova
concepção da saúde mental?
‘’A psiquiatria do comportamento e da biologia deixou de se interessar pelo
sofrimento do sujeito, ela descobre as anomalias
do comportamento. A questão não é de saber o que levou alguem a mergulhar na
obsessão, na depressão, na loucura, mas como suprimir o sintoma o mais rápido
possivel.As patologias não mais se definem em função do sofrimento do
paciente, mas como disfuncionamentos neuro-cognitivos conduzindo a uma
alteração comportamental .O discurso psicanalítico incomoda porque opõe-se à
formatação comportamental e aos valores dominantes duma sociedade onde tudo
deve ser previsivel, programado, dirigido.Os ataques que visam a psicanálise
mostram mais uma vez que ele está viva , mais atual e que é necessária para
se resistir a esta sociedade do espetáculo e da mercadoria.’’
4.
LIVROS RECENTES
Quelle
Psychiatrie pour demain ?, Revue Psychiatrie Française: Vol.
2/09, Décembre 2009.
Artigos
publicados neste volume :
*Éditorial :
Jean-Louis CHAUVET
*Curiosité
de cabinet : Serge TISSERON
*Le
déclin de l’empire psychiatrique : Jacques HOCHMANN
*Déclin
et espérances dans le champ de la pédopsychiatrie : Roger MISÈS
*Refonder
la psychiatrie: Didier HOUZEL
*Déclin
de l’empire psychiatrique : Jean-Pierre OLIÉ
*L’empire
pédopsychiatrique… quel empire ? : Bernard GOLSE
*Nadha:
Simon-Daniel KIPMAN
*Une
psychiatrie médico-sociale est-elle nécessaire. Pourra-t-elle renaître ? :
Roger SALBREUX
*Cinquante
ans de clinique psychiatrique : Alain KSENSEE
*La
neuropsychiatrie de l’enfance et de l’adolescence en Italie :
Lenio RIZZO
*Mouvements
d’humeur :Jean-Louis CHAUVET
*Vous
avez aimez la novlangue ? Vous adorerez le DSM IV ! :
Francis DROSSART
*
L’avènement de la non-psychiatrie : Marc HAYAT
*Vigueur
et impasse de l’héritage freudien : Francis MARTENS