Volume 14 - 2009 Editores: Giovanni Torello e Walmor J. Piccinini |
Junho de 2009 - Vol.14 - Nº 6 Psiquiatria Forense RODOLFO AUGUSTO MATTEO AMBIEL FAZ UMA RESENHA DO LIVRO: Rodolfo Augusto Matteo Ambiel: Um aspecto importante a se considerar em sua resenha é que o PCL-R não é um instrumento construído para se avaliar características psicológicas de sujeitos que apresentam comportamento desviante. O PCL-R, é um check-list que, para ser utilizado depende da habilidade semiológica do examinador, o qual deve ter o suficiente tirocínio para correlacionar as condições psicopatológicas das variáveis dimensionais da personalidade do sujeito. Condições essas que, segundo estudos de estatística multivariada, entre esses os métodos da análise fatorial e de análise de cluster, observou-se propiciarem tendência à comportamentos que se desviam de condutas integradas socialmente.
A avaliação da psicopatia no Brasil: contribuições da PCL-R Psychopathy Checklist Revised (PCL-R), de autoria de Robert D. Hare, teve sua versão brasileira validada por Morana (2004). Nesse trabalho, a autora buscou identificar o ponto de corte a partir do qual as pessoas com traços psicopáticos se distinguem de outras pessoas. Além disso, estudos estrangeiros vêm indicando que a probabilidade de reincidência criminal não está relacionada ao tipo de crime cometido, mas sim à personalidade de quem comete, sendo que, dessa forma, a identificação de pessoas com traços psicopáticos seria um procedimento importante para intervenções de prevenção à reincidência (Adshead, 2001; Berry, Duggan & Emmet, 1999). Embora ainda haja muitas discussões acerca da natureza e definição da psicopatia, os trabalhos da área da psiquiatria forense têm a identificado como um grupo de traços ou alterações de conduta, tais como avidez por estímulos, delinqüência juvenil, descontroles comportamentais, entre outros. Devido às repercussões sociais, a psicopatia tem sido considerada como o mais grave transtorno de personalidade, sendo que alguns dos crimes mais violentos são cometidos por pessoas com traços psicopáticos, que cometem vários tipos de crime com maior freqüência do que os não-psicopatas e com índices superiores de reincidência. Uma vez que a versão brasileira da PCL-R pretende estabelecer critérios válidos e precisos para diferenciar psicopatas dos não-psicopatas a partir de dados coletados em amostras nacionais, em seguida serão relatados os estudos que adaptaram essa escala para o Brasil, baseando-se em Morana (2004) e Ambiel (2006). Amparado por uma material de excelente qualidade gráfica, o profissional que fizer uso do PCL-R contará com um manual que contém todas as informações necessárias para o bom uso do instrumento. Na primeira parte, são relatados os estudos de adaptação realizados, detalhando a amostra, que contou apenas com adultos do sexo masculino, mas que não restringe o uso a populações de mulheres presas, uma vez, que segundo o próprio Hare, fez estudos demonstrando não haver diferenças significativas entre populações de gênero e os estudos estatísticos que determinaram o ponto de corte. Para confirmar essa pontuação, que na padronização brasileira ficou em 23 pontos dentre os 40 possíveis na Escala, a autora lançou mão das pranchas de Rorschach como critério externo na identificação de sujeitos que apresentem traços psicopáticos. As análises estatísticas mostraram que o PCL – R é capaz de distinguir os indivíduos que apresentam traços prototípicos de psicopatias daqueles que apresentam outros transtornos menos graves, e ainda, estes do grupo de controle, que não apresentam qualquer tipo de desvio de conduta. Esses resultados foram corroborados pela prova de Rorschach, segundo a avaliação de vários especialistas, demonstrando a concordância por meio do índice Kappa de 0,83. Na segunda parte do manual, é feita uma revisão histórica, tanto do instrumento, que teve sua primeira versão em 1980, tanto do constructo de psicopatia. Em seguida, faz-se uma descrição dos materiais que compõem o instrumento, a saber, manual técnico, caderno de pontuação, roteiro para entrevista semi-estruturada e protocolo de pontuação, além de trazer todas as especificações para se fazer o melhor uso possível do instrumento, uma vez que a obtenção errônea de escores como resultado de má utilização desse ou de qualquer outro instrumento de avaliação psicológica, pode levar a prejuízos imediatos e futuros para o indivíduo avaliado, o que ressalta a necessidade de formação específica, especialmente para procedimentos mais complexos. Ainda no segundo capítulo da segunda parte do manual, os itens do protocolo e suas interpretações são descritas e discutidas, visando um melhor proveito das informações obtidas nas entrevistas. É importante dizer que o Caderno de Pontuação que completa o material é, na verdade, uma reprodução desse segundo capítulo, porém de uma forma que facilita o acesso às descrições dos itens, visando mais segurança e confiabilidade na avaliação. Nos demais capítulos, são apresentados vários estudos psicométricos do instrumento, conduzidos por Hare e colaboradores nos Estados Unidos e Canadá, numa população total de 1632 sujeitos. São relatados estudos de precisão entre avaliadores, inter-item, teste-reteste e consistência interna, que na maioria dos casos, mostraram bons índices, indicando que o instrumento conta com boa fidedignidade. Além desses, estudos de validade de conteúdo, critério e constructo também são apresentados, demonstrando índices altos. No futuro, estudos como esses devem ser realizados também no Brasil, visando um aprimoramento das qualidades psicométricas da versão brasileira do instrumento. Por essa breve apresentação, pode-se perceber que a PCL-R constitui-se como uma ferramenta de uso para um fim e população específicos, e seus estudos indicam a possibilidade de usá-la de forma confiável para o planejamento de ações dentro da área de atuação e pesquisa da psiquiatria e psicologia forenses. É preciso se investir na constante atualização científica e no desenvolvimento de novos instrumentos que auxiliem os profissionais na tarefa de investigar características pessoais em contextos diversos, cuidando-se sempre da formação dos profissionais para esse uso. Além disso, a discussão sobre o uso dos instrumentos de avaliação psicológica deve ser fortalecida e ampliada, visando que a sociedade seja beneficiada de forma plena por atuações pautadas em parâmetros científicos. Nesse sentido, a interlocução entre diferentes especialidades profissionais interessadas no assunto deve ser enriquecida com argumentos que objetivem favorecer atuações técnicas especializadas e com formação suficiente para que os dados possam se tornar ações concretas em prol da sociedade de forma geral.
Referências Adshead G. Murmurs of discontent: treatment and treatability of personality disorder. Advan Psychiatr Treat. 2001;7:407-16.
Ambiel, R. A. M. (2006). Diagnóstico de psicopatia: a avaliação psicológica no âmbito judicial. PsicoUSF, 9(2), 265-266.
Berry A, Duggan C, Emmet L. The treatability of psychopathic disorder: how clinicians decide. J Forensic Psychiatry. 1999;10(3):710-9.
Morana H. Escala Hare PCL-R: critérios para pontuação de psicopatia revisados. Versão brasileira. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2004.
Rodolfo Augusto Matteo Ambiel é psicólogo, mestrando em Avaliação Psicológica pelo Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco, Itatiba, SP. Bolsista FAPESP. E-mail: [email protected].
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